Empresário Acir Gurgacz (PDT-RO) cumpre pena em regime semiaberto por crimes contra o sistema financeiro e compõe nova diretoria da FPA; Bolsonaro prestigiou posse de Alceu Moreira (MDB-RS) e contou que já plantou arroz no Mato Grosso do Sul
Por Alceu Luís Castilho
Com a presença do presidente Jair Bolsonaro, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) promoveu na terça-feira a posse de sua nova diretoria, em um clube nas margens do Lago Paranoá, em Brasília. O novo presidente – que já vinha exercendo o cargo, já que a ex-presidente Tereza Cristina (DEM-MS) tornou-se ministra da Agricultura – é o deputado Alceu Moreira (MDB), conhecido pelo discurso virulento contra povos indígenas. “Reúnam verdadeiras multidões”, disse ele a fazendeiros gaúchos em 2014, ” e expulsem do jeito que for necessário”.
A vice-presidência no Senado ficou com Luis Carlos Heinze (PP-RS), presente nesse evento de cinco anos atrás com uma fala que se tornou famosa. Ele se referiu aos povos indígenas, gays, lésbicas e quilombolas como “tudo o que não presta”. Nos últimos anos a FPA – a face institucional mais conhecida da bancada ruralista – tem sido dominada por deputados. Com um de seus caciques eleitos para o Senado, ela tende a ganhar força na Casa.
O Clube Naval foi criado em 1974 pelo ditador Emílio Garrastazu Médici, para atender os oficiais da Marinha e seus parentes. Duplamente em seu ambiente, Bolsonaro revelou em seu discurso que já foi fazendeiro: “Eu já plantei 30 hectares de arroz em Mato Grosso do Sul e senti na pele o que é produzir”. Ele definiu o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, como “amigo do homem do campo”. “Contem agora com alguém que não vai mais atrapalhar e estará ao lado de vocês, para que possam ter segurança jurídica para poder plantar e produzir”.
A lista completa da nova diretoria da FPA traz nomes mais do que controversos. O vice-presidente na Câmara, Sérgio Souza (MDB-PR), foi citado durante as investigações da Operação Carne Fraca, em dezembro de 2017. Segundo o veterinário Flávio Cassou, ex-funcionário do frigorífico Seara, o parlamentar teria recebido uma mesada de R$ 20 mil para colaborar com o esquema de afrouxamento das fiscalizações apurado pela Polícia Federal.
O vice-presidente para a Região Sul é o paranaense Luiz Nishimori (PR), relator do PL do Veneno. O observatório publicou no ano passado duas reportagens sobre os conflitos de interesses relacionados ao deputado. Uma delas diz respeito a suas atividades empresariais: “Relator do PL do Veneno, Luiz Nishimori vendeu agrotóxicos no Paraná“. Outra, a sua atuação política: “Deputado pró-agrotóxicos promoveu Mitsui, empresa flagrada com venenos ilegais na BA“.
O novo secretário da Frente Parlamentar da Agropecuária, o pastor Paulo Bengtson (PTB), é novato na Câmara. Ele é filho do pecuarista e pastor Josué Bengtson (PTB), condenado à perda do mandato por atuar na máfia das ambulâncias. A família Bengtson tem mais de 4 mil hectares de terras em Santa Luzia do Pará, município do norte do estado com 91% do território desmatado. O ex-deputado atuou para isentar multas por desmatamento em propriedades rurais. Um dos irmãos de Paulo, Marcos Bengtson, foi preso em 2010, acusado de mandar torturar e matar o camponês José Valmeristo Soares, o Caribé, que ocupava parte da Fazenda Cambará. Três anos antes, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) denunciara que os Bengston havia grilado parte da Gleba Pau de Remo.
A nova coordenadora da Comissão de Política de Abastecimento, a jornalista Joice Hasselman (PSL-SP), representa a nova leva de parlamentares eleita na esteira do sucesso eleitoral do presidente Bolsonaro. A falta de conexão dela com o universo agropecuário indica que a FPA não terá problema para renovar seus quadros, diante da perda ocorrida na eleição de outubro: “Aliada a Bolsonaro, Frente Parlamentar da Agropecuária reelege 52% de seus membros na Câmara“.
A lista traz outros nomes com histórico peculiar. O observatório publicará nos próximos dias mais informações sobre a nova bancada ruralista no Congresso: quantidade de terras, as empresas agropecuárias, as acusações e investigações envolvendo alguns desses políticos.
Mas cabe adiantar um dos casos mais espetaculares, o do senador Acir Gurgacz (PDT-RO), preso em regime semiaberto no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, por crimes contra o sistema financeiro. Ele foi indicado por seu partido para ser um dos fiscais da eleição da Presidência do Senado, no dia 1º, que levou ao cargo o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP). Na FPA, comandará por um ano a Comissão Trabalhista.
Candidato derrotado ao governo de Rondônia, Gurgacz declarou um patrimônio de R$ 11,3 milhões em 2018. Entre os bens, duas aeronaves, sociedade da mulher no Diário da Amazônia, um dos principais veículos jornalísticos de seu estado, um relógio Rolex de R$ 22 mil, uma empresa de transporte no Paraguai, um trio elétrico, sociedade em várias empresas – ele é filho de Assis Gurgacz (PDT-RO), seu primeiro suplente, dono de um patrimônio de R$ 86 milhões.
A declaração de bens entregue ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano passado confirma a posse de três grandes propriedades rurais – em meio a outras propriedades menores em Rondônia – que já constavam da declaração de 2014. Elas somam 30.500 hectares de terras em Envira, no sul do Amazonas, na divisa com o Acre. É uma área do tamanho de Granada, no Caribe.
Gurgacz declarou as terras em três etapas: uma propriedade de 15 mil hectares, por R$ 400 mil; uma de 10 mil hectares, por R$ 336 mil; e outra de 5.500 hectares, por R$ 640 mil. Total gasto pelo senador nos três latifúndios: R$ 1,37 milhão. Pouco mais de 10% de seu patrimônio declarado.
As três propriedades foram definidas como “terra nua”, portanto sem exploração comercial – na região do Rio Juruá, na fronteira com o Acre, no coração da Amazônia.