Em entrevista à editora Autonomia Literária, responsável pela publicação do livro “O Protegido”, sobre a face agrária de Fernando Henrique Cardoso, o linguista diz que blindagem do ex-presidente diz muito sobre o Brasil atual
Quase sempre discreto em suas aparições públicas, Noam Chomsky desembarcou esses dias no Brasil. Em uma visita à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o intelectual ativista, linguista, filósofo e analista político, autor de mais de 70 livros, referência do pensamento anticapitalista, conversou com a equipe da editora Autonomia Literária, responsável pela edição do livro “O Protegido – por que o país ignora as terras de FHC”, do jornalista Alceu Luís Castilho, coordenador do De Olho nos Ruralistas.
Professor emérito do Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, Chomsky conta que lhe chamaram a atenção as revelações – feitas pelo site The Intercept Brasil – de que o juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça, deixou de fora das investigações da Lava Jato o governo FHC:
– Isso é importante porque provavelmente o pior crime de Bolsonaro, que é a destruição da Amazônia, tem precedente no governo FHC, onde o desmatamento cresceu em uma velocidade incrível, talvez a maior de todas — e no governo FHC, lembremos, havia muita corrupção.
Durante a entrevista, publicada na revista Jacobin Brasil, Chomsky foi apresentado ao livro “O Protegido” e se interessou em saber mais sobre a face agrária de FHC, proprietário, com a família, de um canavial em Botucatu, no interior paulista. “Vou ler”, garantiu. Ele não fala fluentemente português, mas lê. De qualquer forma, já solicitou – especificamente para a leitura do livro – a ajuda da mulher, a tradutora brasileira Valeria Wasserman.
O observatório e a Autonomia Literária lançam o livro na tarde deste sábado em Botucatu, no bairro Demétria, a poucos quilômetros do canavial pertencente a Fernando Henrique, Paulo Henrique, Luciana e Beatriz Cardoso, em área de mananciais. Está prevista uma visita ao local, com a presença de ambientalistas da região. Já lançado em Paraty (RJ) e São Paulo, “O Protegido” traz detalhes sobre a desapropriação de R$ 5 feita pela prefeitura local, administrada pelo PSDB, que valorizará as terras remanescentes de FHC. O lançamento no Rio de Janeiro será no dia 20.
Em relação a Fernando Henrique Cardoso, as gravações – agora veiculadas também por parceiros do Intercept, como Folha, UOL, El País e Veja – mostram que Sergio Moro temia melindrar o ex-presidente, já que ele era considerado “um apoio importante”. As reportagens feitas pelo jornalista Glenn Greenwald mostram, segundo o linguista, que Moro “era tudo, menos um herói, ao contrário do que foi apresentado pela imprensa”:
Na entrevista, Chomsky afirma que o principal objetivo de Moro sempre foi tirar de Lula a possibilidade de concorrer à Presidência: “Tornou-se pública a informação de que o próprio Ministério Público não tinha provas suficientes para uma acusação e o Moro os incentivou a fazer, mesmo assim, uma denúncia para se livrar daquela figura perigosa, para que o golpe da direita pudesse se concretizar”. Em sua visão, Lula se tornou, segundo qualquer parâmetro, “o principal preso político do mundo”.