Série “Endereços” contou que Ricardo Nunes possui treze lotes em Engenheiro Marsilac, na APA Capivari-Monos, mas apenas quatro estão em nome dele; nota encaminhada pela Prefeitura de São Paulo não cita ausência de declaração do Imposto Territorial Rural, o ITR
Por Alceu Luís Castilho e Bruno Stankevicius Bassi
Os terrenos ficam dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) do Capivari-Monos. Dos treze lotes que formam o Sítio Vista Verde, apenas quatro estão registrados em cartório em nome de Nunes. Outros nove continuam em nome de antigos proprietários. A situação de cada um dos lotes foi detalhada de forma minuciosa em reportagem publicada no site: “Sítio de Ricardo Nunes no extremo sul de SP fica em loteamento irregular“.
Logo após a publicação do vídeo, a assessoria de imprensa da Prefeitura de São Paulo enviou uma nota negando qualquer inconsistência e afirma que os lotes estão “em processo de regularização”:
— Os lotes em questão foram adquiridos entre 1997 e 1998 já integralmente construídos e constituídos em sua forma final, portanto, antes da criação da APA Capivari-Monos. Todos os lotes possuem matrícula individualizada no 11º Cartório de Registro de Imóveis. Os imóveis constam da declaração de Imposto de Renda do prefeito Ricardo Nunes, o que reitera o seu compromisso com a legalidade de todo o processo. Em relação às documentações dos lotes 6, 7, 8, 11, 13, 14, 15 e 16, os lotes encontram-se em processo de regularização nos referidos cartórios de imóveis para apresentação e documentação dos proprietários anteriores.
A data de aquisição não consta nas matrículas acessadas pelo observatório. Dos nove lotes que ainda aparecem vinculados aos antigos donos, seis estão em nome do industrial alemão Hans Grill, que comprou a área em 1959. Outro membro da colônia alemã, Pedro Hessel Reimberg, surge como proprietário do lote nº 11. O terreno onde fica a sede do Sítio Vista Verde — um sobrado alugado por Nunes para grupos de até 75 pessoas — está desde 1973 em nome de Jacinto e Mario Lopes Medeiros.
O lote com transações mais recentes é o de nº 6, comprado em 1988 por Benjamin Ribeiro da Silva e Alfonso Boglio Serrano. Os dois são aliados de longa data de Nunes na zona sul e também serão temas de reportagem específica desta série. A nota enviada pela Prefeitura não cita Benjamin e Alfonso.
A data citada na nota como período de aquisição dos primeiros lotes, entre 1997 e 1998, confere com a apuração realizada em campo, no distrito de Marsilac.
Moradores do Parque Internacional entrevistados pela reportagem contam que Nunes adquiriu os terrenos de forma espaçada. A primeira compra teria ocorrido no fim dos anos 1990. As matrículas dos lotes números 4, 5, 17 e 18 — aqueles que possuem registro de aquisição por Nunes em cartório — informam que a transação ocorreu em 07 de julho de 2006.
Na época, Nunes morava na região, conforme declarou em audiência na Câmara, em 2013: “Vou dar meu endereço: Rua Seis, nº 51, Parque Internacional, no Marsilac. Moro lá há vinte anos. Eu amo esse lugar. Eu vivo aqui.”
Os quatro lotes foram vendidos por Paulo Minoru Ikeda, que continua registrado como titular do imóvel nas bases do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e da Receita Federal. Sobre a falta de atualização, Nunes afirma, em nota, que desconhecia a necessidade de transferência:
— As matrículas dos lotes 4, 5, 17 e 18 foram transferidas via escritura pública e registradas em cartório em nome do prefeito, sendo, até o presente momento, de desconhecimento deste a necessidade de comunicação a demais órgãos, o que será brevemente realizada, assim como qualquer outra regularização de pendência.
Conforme revelado pela reportagem, a implicação da falta de atualização cadastral dos imóveis é que Ricardo Nunes não paga o Imposto Territorial Rural (ITR). Todos os treze lotes possuem pendência na Receita Federal por “omissão de DIAC”. A sigla se refere ao Documento de Informação e Atualização Cadastral do ITR.
A nota enviada pela Prefeitura de São Paulo não menciona a falta de apuração do imposto.
A data de aquisição dos lotes mencionada pela nota de Ricardo Nunes bate com o início do enriquecimento de Ricardo Nunes como empresário — catorze anos antes de se aventurar na política pela primeira vez, ao se eleger vereador pelo MDB em 2012.
Em 14 de março de 1997, ele se tornava o sócio majoritário da Nikkey Controle de Pragas, então uma pequena empresa de dedetização que cobria a zona sul de São Paulo. Uma foto publicada por Nunes em seu Facebook mostra ele com a filha Mayara, em frente de um furgão com o logo da empresa. O registro foi feito justamente no período em que o empresário se tornara dono do Sítio Vista Verde.
A Nikkey é um dos muitos pontos de conexão entre a vida econômica e política de Nunes. A empresa chegou a realizar encontros no sítio de Marsilac e é controlada desde 2017 por Ricardo Luis Nunes Reis Filho, o Ricardinho, primogênito do prefeito, que só deixou oficialmente a empresa em janeiro de 2012. É ele quem anunciava o Vista Verde para aluguel — o anúncio foi removido do ar poucas horas após a reportagem visitar o sítio — e quem usufruía do tanque para piscicultura.
Os dois temas serão tratados nas próximas reportagens da série. A Nikkey é um capítulo à parte: a empresa de agrotóxicos será o destaque do próximo vídeo da série Endereços, publicada semanalmente no canal do De Olho nos Ruralistas no YouTube.
Os lotes em questão foram adquiridos entre 1997 e 1998 já integralmente construídos e constituídos em sua forma final, portanto, antes da criação da APA Capivari-Monos. Todos os lotes possuem matrícula individualizada no 11º Cartório de Registro de Imóveis. Os imóveis constam da declaração de Imposto de Renda do prefeito Ricardo Nunes, o que reitera o seu compromisso com a legalidade de todo o processo.
Em relação às documentações dos lotes 6,7,8,11,13,14,15 e 16, os lotes encontram-se em processo de regularização nos referidos cartórios de imóveis para apresentação e documentação dos proprietários anteriores.
Já as matrículas dos lotes 4,5,17 e 18 foram transferidas via escritura pública e registradas em cartório em nome do prefeito, sendo, até o presente momento, de desconhecimento deste a necessidade de comunicação a demais órgãos, o que será brevemente realizada, assim como qualquer outra regularização de pendência.
A nascente apontada pela reportagem está dentro de uma área de preservação, com todos os limites respeitados, e o prefeito nega que ela tenha sido canalizada.
O reservatório não ultrapassa o limite previsto na legislação, e não há nenhuma atividade de “pesqueiro’’ ou algo de gênero na propriedade, que possui uma criação de peixes particular. Na data de aquisição dos lotes mencionados ainda não tinha sido constituída a área de preservação, o que somente aconteceu em 2001.
O imóvel é usado para o lazer de familiares e amigos.
| Alceu Luís Castilho é diretor de redação do De Olho nos Ruralistas. ||
|| Bruno Stankevicius Bassi é coordenador de projetos do observatório. ||
||| Colaboraram Eduardo Carlini, geógrafo, e Tonsk Fialho, pesquisador e repórter. |||
Imagem principal (De Olho nos Ruralistas): prefeito de São Paulo possui sítio em área de proteção ambiental
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