Multinacional concedeu Prêmio Raízes 2024 à Agrosyn; dois anos antes, distribuidora enviou caminhões a bloqueios e teve contas bloqueadas pelo STF; dossiê consolida 142 nomes do agronegócio que atuaram contra democracia
Por Bruno Stankevicius Bassi e Tonsk Fialho
O De Olho nos Ruralistas publicou na última quarta-feira (25) o relatório “Agrogolpistas“. Ao longo de 88 páginas, o estudo analisa a atuação econômica de 142 empresários do agronegócio que atuaram no suporte logístico ou financeiro a atos golpistas entre o segundo semestre de 2022 e o fatídico 8 de janeiro de 2023.
O objetivo? Mostrar que esses fazendeiros e donos de empresas não são “peixes pequenos”. Eles estão integrados em cadeias globais: são exportadores de soja e possuem parcerias com multinacionais do setor. Dois desses casos envolvem diretamente a Syngenta, a gigante dos agrotóxicos com sede em Basileia, na Suíça — e comprada em 2017 pela estatal ChemChina.
O primeiro envolve uma empresa de Sorriso (MT), a Agrosyn Comércio e Representação de Insumos Agrícolas. O município mato-grossense lidera o levantamento do observatório, com 34 nomes sob investigação ou indiciados em processos relativos aos atos antidemocráticos instigados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
Parceira regional da multinacional sino-suíça — com direito ao uso do “syn” como sufixo —, a Agrosyn figura entre as empresas que tiveram as contas bancárias bloqueadas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), por participar de bloqueios rodoviários logo após a vitória eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva.
O caso da Agrosyn é mais direto: trata-se de uma distribuidora de agrotóxicos. A participação nos bloqueios não impediu que a empresa fosse reconhecida com o Prêmio Raízes em 2024, concedido pela Syngenta para os distribuidores que se destacam por sua excelência. Os premiados receberam uma viagem para o emirado de Dubai e as ilhas Maldivas.
Procurada pela reportagem, a Syngenta afirma não compactuar com quaisquer atos antidemocráticos nos países em que atua. “A Syngenta está comprometida em conduzir negócios de acordo com os mais altos padrões de integridade e responsabilidade”, diz a nota de imprensa. A íntegra pode ser lida aqui.
— No que se refere à premiação, a Syngenta reforça que a avaliação de seus parceiros comerciais é contínua e leva em consideração múltiplos critérios estabelecidos internamente. Reitera, ainda, que busca garantir que suas relações comerciais estejam sempre alinhadas a princípios de responsabilidade social, ética e governança corporativa.
A Syngenta não é um ator qualquer no agronegócio brasileiro. Em 2022, De Olho nos Ruralistas mostrou no relatório “Os Financiadores da Boiada” que a fabricante de pesticidas despontava como campeã em número de reuniões com integrantes do alto escalão do governo Bolsonaro: 81. A empresa está plenamente integrada ao ecossistema de financiamento do Instituto Pensar Agro, o braço logístico da Frente Parlamentar da Agropecuária. Na época da publicação do relatório, ela participava diretamente de três associações mantenedoras da bancada ruralista.
A multinacional aparece no relatório “Agrogolpistas” em um segundo caso. Ela é parceira da AvantiAgro, uma empresa de sementes e insumos com sede em Luís Eduardo Magalhães (BA) e fundada pelos irmãos Vilson e Marcelino Walker. Os dois atuam há três décadas na produção de soja e algodão no oeste baiano.
Vilson é um dos proprietários de caminhões fichados pela Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF) dentro do acampamento golpista montado em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília. Junto com os irmãos Luiz e Elton Walker — este último através da empresa Agrowalker Serviços e Transportes —, o clã enviou cinco veículos para a capital federal. Nenhum deles foi responsabilizado legalmente.
Além de destinar caminhões para os bloqueios rodoviários que tentavam estrangular a economia em protesto contra a vitória de Lula, a Agrosyn se relaciona com outros personagens descritos no relatório “Agrogolpistas“. O dono da empresa, Sérgio Adão Esteves, foi sócio da sojeira RD Rossato. Essa, por sua vez, tem como sócio Dilceu Rossato (Republicanos), prefeito de Sorriso por dois mandatos não consecutivos: de 2005 a 2008 e de 2013 a 2016.
Rossato não enviou caminhões e não consta entre os investigados por atos antidemocráticos, mas é um importante ponto de interseção entre alguns envolvidos. Ele é sócio da concessionária Apasi, que controla trechos das rodovias estaduais MT-242 e da MT-491. Dois de seus sócios enviaram caminhões aos atos antidemocráticos: Ilo Pozzobon, dois veículos, e Elio Schiefelbein, um.
Bolsonarista declarado, Dilceu foi atuante durante a campanha presidencial de 2022, sempre trajado de verde e amarelo. Afirmava que aquelas eleições significavam a “luta do bem contra o mal”.
Ele também já foi sócio de Argino Bedin, o “pai da soja” de Sorriso e uma das figuras centrais do estudo. Bedin será tema de reportagens específicas em nosso site e de vídeo em nosso canal no YouTube. Clique aqui para se inscrever.
| Bruno Stankevicius Bassi é coordenador de pesquisa do De Olho nos Ruralistas. |
|| Tonsky Fialho é pesquisador e repórter. ||
Foto em destaque (Divulgação/Agrosyn): parceira da Syngenta em Mato Grosso enviou caminhões para QG golpista em Brasília
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