Despejo anunciado: no Tocantins, Justiça troca camponeses por sojeiros

Juiz de Goiatins determinou reintegração de posse em área ocupada por pequenos agricultores; ex-governador distribuiu terras habitadas para políticos, entre eles a ex-ministra Kátia Abreu

A Associação de Plantadores do Alto do Tocantins ganhou do juiz Luatom Bezerra, da comarca de Goiatins (TO), uma decisão favorável ao despejo de 40 famílias camponesas da região da Serra do Centro, em Campos Lindos, no nordeste do estado. Por essa decisão, sairão do lugar pequenos agricultores – e criadores de porcos, galinhas – para o benefício de produtores de soja. O despejo está previsto para esta terça-feira (18/10).

A Comissão Pastoral da Terra (CPT-Araguaia/Tocantins) – em nota assinada na sexta-feira também por Dom Philip Dickmans, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) – fala em um “iminente desastre social que essa reintegração irá causar na vida de centenas de pessoas”.

“O despejo não prevê, por exemplo, para onde serão realojados adultos, idosos, jovens e crianças – bem como seus pertences e animais”, diz a CPT. Oficiais de justiça e Polícia Militar não sabem para onde vão as famílias, “fato que contraria a diretriz da Ouvidoria Agrária Nacional”.

A CPT lembra que o Projeto Agrícola Campos Lindos foi criado em 1997 pelo governador Siqueira Campos (o sobrenome não é coincidência). Segundo a organização, o ato consumou uma grilagem pública de terras, ao desapropriar uma fazenda titulada de forma controversa e distribuir mais de 90 mil hectares para fazendeiros, empresários e políticos.

Um deles foi a senadora Kátia Abreu. Ela e Dejandir Dalpasquale, ministro da Agricultura no governo Itamar Franco, teriam pago apenas R$ 10 por hectare.

No local viviam 160 famílias camponesas, que viviam ali havia mais de seis décadas, utilizando terras comuns. Somente 70 delas conseguiram títulos.  “Diariamente, convivem com a contaminação provocada pelo uso intensivo de agrotóxicos nas lavouras de soja”, informa a nota da Pastoral da Terra.

Ainda segundo a CPT, o projeto começou a funcionar sem Estudo de Impacto Ambiental (EIA/Rima) e sem licença ambiental do Naturatins. O Ibama constatou em 2000 o desmatamento em áreas de preservação permanente. Mas o projeto nunca teve suas atividades embargadas.

Oito casos de trabalho escravo foram flagrados em Campos Lindos, entre 2003 e 2013. Seis deles em atividades ligadas à soja.

A CPT e a regional Norte 3 da CNBB “denunciam e responsabilizam o Estado do Tocantins por sua direta participação enquanto promotor e incentivador” do projeto.

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