Membro da “bancada do Refis”, Kaefer era o deputado mais rico na eleição de 2014 e deve R$ 52,8 milhões ao Fisco; ele é considerado um dos aliados mais fiéis do Planalto no Congresso
O Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu na semana passada duas denúncias da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o deputado federal Alfredo Kaefer (PSL-PR). De acordo com a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, o deputado praticou diversos crimes visando obter vantagens ilícitas para suas empresas falidas, causando danos aos credores públicos e privados. A PGR pede o bloqueio de R$ 341 milhões e a indisponibilidade dos bens das 14 empresas ligadas a Kaefer.
Ele é dono do Grupo Diplomata, localizado em Cascavel (PR), um dos maiores frigoríficos de aves e suínos do país. A empresa entrou em recuperação judicial em 2014, mas o deputado retomou seu controle em 2017, após uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo as acusações, o deputado sonegou e omitiu informações durante o processo de recuperação judicial do frigorífico e de outras quatro empresas ligadas a ele. A omissão de informações teria induzido a Justiça a erro.
Membro da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Kaefer é ainda acusado de falsidade ideológica e de fraude contra os credores. “Ao longo dos anos, valendo-se de ampla estrutura empresarial, Alfredo Kaefer fez diversos atos de confusão patrimonial, de blindagem de seu patrimônio pessoal e de concentração de dívidas em empresas, com a capitalização de outras não englobadas no Processo de Recuperação Judicial”, detalha a procuradora-geral.
Uma das denúncias atinge também a mulher do deputado, Clarice Roman. Segundo o Ministério Público Federal, eles emitiram duplicatas falsas ao venderem milho e farelo de soja para a Cooperativa Agropecuária Sul (Coopersul). “Uma manobra que incluiu a recompra dos títulos pelos acusados impediu que a cooperativa recebesse o valor das mercadorias”, ressalta Raquel Dodge.
A notícia-crime formulada pela Coopersul mostra que a Diplomata Industrial e Comercial, durante a recuperação judicial, emitiu duplicatas falsas de transações inexistentes, envolvendo as empresas Segalas Alimentos Ltda e Kit Trading Comercial. O danos causados pela fraude totalizam R$ 249,5 mil.
O objetivo do casal era, segundo a PGR, driblar a dificuldade que o Diplomata enfrentava para conseguir crédito na praça:
– Os acusados, como gestores e responsáveis pela empresa Diplomata S/A, emitiram os referidos títulos à revelia das empresas sacadas e sem relação jurídica-base previamente estabelecida (o que caracteriza a duplicata simulada), contraíram dívidas, usando os supostos créditos e, depois, os cancelou, gerando prejuízo à Coopersul.
Em agosto de 2017, De Olho nos Ruralistas divulgou as dívidas do deputado com o Fisco. Na época, Kaefer era uma das lideranças na “bancada do Refis”: “Ruralistas da ‘bancada do Refis’ devem R$ 135 milhões à União; seus líderes respondem por crimes tributários no STF“. Ela é formada por um conjunto de deputados e senadores que tentam anistiar as dívidas das próprias empresas, que chegam à cifra de R$ 3 bilhões, por meio da Medida Provisória nº 783.
Considerado o parlamentar mais rico entre os eleitos em 2014, com um patrimônio de R$ 108 milhões, Kaefer foi o autor da emenda na Câmara. Ele possuía uma dívida de R$ 52,8 milhões com a União, de acordo com relatório da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
O deputado se projetou durante o governo Temer, tornando-se um dos principais interlocutores do presidente no Congresso. As articulações que Kaefer fez junto à bancada ruralista para barrar as duas denuncias de corrupção contra o governo lhe concederam a alcunha de “rei do baixo clero“. Mais da metade dos votos para manter Temer no poder – nas duas votações, em agosto e outubro de 2017 – saiu da Frente Parlamentar da Agropecuária, conforme levantamento do observatório.
No STF, o deputado é réu na Ação Penal 892/2014, sob a acusação de praticar crimes contra o sistema financeiro nacional e por formação de quadrilha. Além disso, o deputado é alvo do Inquérito 3678/2013, onde é investigado por estelionato e fraude contra credores. Há mais dois inquéritos no Supremo, ambos abertos em 2016: o 4304/2016 apura crime contra a ordem tributária; o 4298/2016 investiga falsa decretação de falência a partir da ocultação de patrimônio.
A PGR pede ao STF a abertura de mais um inquérito contra o deputado, por lavagem de dinheiro e pelo uso de empresas falidas e de testas de ferro para financiar suas campanhas em 2010 e 2014.
Em entrevista ao Paraná Portal, Alfredo Kaefer minimizou as duas denúncias apresentadas pela PGR: “Quando o STJ extinguiu a decisão do TJ foram terminadas todas essas questões. São assuntos superados, requentados”. À Gazeta do Povo, ele disse que nunca fui ouvido pela PGR: “Primeiro, eles atiram, depois eles vão ouvir minhas explicações? Se o STF acatar as denúncias, eu vou provar letra por letra que sou inocente. É tudo uma ilação de quem acusa. Faz tempo que o Ministério Público está no meu pé”
Segundo o deputado, a família não tem mais bens disponíveis. “Todos os bens das empresas – estendidas ou do grupo – foram colocados à disposição dos credores, inclusive para serem leiloados para pagar ações trabalhistas”, afirmou. “Na minha declaração de imposto de renda consta um único bem que é a casa de moradia, a casa em que vivo com minha família. Que bens ela quer bloquear? Não tenho mais nada. Tudo foi comido por esse processo de falência ao qual nós fomos equivocadamente submetidos pela Justiça”.