Por Igor Carvalho
Quarta maior bancada da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), atrás de Minas, Paraná e São Paulo, o Rio Grande do Sul tem entre seus representantes do agronegócio alguns com mais forte influência política no Congresso. Dois deles, Luis Carlos Heinze (PP) e Alceu Moreira (MDB), alinham-se também entre aqueles com discurso mais violento.
Dos 16 deputados federais gaúchos que integram a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), 14 tentarão a reeleição. Nelson Marchezan Júnior (PSDB) não disputa porque ocupa atualmente a Prefeitura de Porto Alegre. Heinze busca o Senado.
A influência dos gaúchos no cenário nacional pode ser percebida pela indicação da senadora Ana Amélia (PP) como vice-presidente na chapa do tucano Geraldo Alckmin, depois de ter sido feroz defensora do impeachment de Dilma Rousseff (PT).
Entre os mais atuantes está Alceu Moreira, vice-presidente da FPA na Câmara e ligado ao presidente Michel Temer (MDB). Em 2014, Temer chegou a doar R$ 100 mil para o gaúcho, mas foi multado porque o valor ultrapassava os 10% de sua declaração de renda bruta. Moreira teve de se contentar com a metade: R$ 50 mil. Em maio de 2017, o deputado foi acusado de receber R$ 200 mil “em dinheiro vivo”, segundo delação de Ricardo Saud, executivo da JBS, no bolo de acusações que assombram o presidente da República.
Entre as nove comissões existentes na FPA, os gaúchos comandam duas. Sem falar de Moreira em uma das duas vice-presidências. A Comissão de Infraestrutura e Logística é liderada por Jerônimo Goergen (PP), autor de 29 projetos de decreto legislativo retirando terras das populações tradicionais. Covatti Filho, autor do projeto que quer facilitar a entrada de mais agrotóxico no Brasil, o PL do Veneno, comanda a Comissão de Política Agrícola.
Soma-se a esses influenciadores o deputado Luis Carlos Heinze, autor da célebre frase: “Ali estão aninhados quilombolas, índios, gays, lésbicas, tudo o que não presta”. A declaração garantiu ao deputado o prêmio racista do ano em 2014, oferecido pela organização internacional Survival, ofuscando discurso violento proferido no mesmo dia por Alceu Moreira, que chamou os trabalhadores rurais de “vigaristas” e incitou fazendeiros à violência contra indígenas:
– Usem todo tipo de rede, todo mundo tem telefone, liguem um pro outro imediatamente, reúnam as verdadeiras multidões e expulsem do jeito que for necessário.
Como Heinze, Alceu não tem papas na língua. Em relação às acusações de desvio de dinheiro público, ele também se pronuncia.
Em junho, em entrevista a uma rádio do interior do Estado, Alceu Moreira (MDB) deixou passar como ele articula dinheiro público para os seus aliados, ao explicar a forma como tirou dinheiro do orçamento da saúde para ajudar uma associação de caminhoneiros:
– Não tinha como passar dinheiro, porque não tem no Orçamento da União dinheiro para passar para associação ‘x’. É complicado. Aí acertamos com os vereadores e com o Daiçon, o pessoal, para fazer o seguinte: passar um recurso livre para saúde, na faixa de R$ 200 mil, acho que é R$ 190 [mil] que veio, (uma pessoa informa que o valor correto é) R$ 240 mil de recurso livre para saúde, para custeio. E aí a prefeitura não gasta esse recurso da saúde, e passa parte desse recurso lá para o Jair Belloli, para a associação dos caminhoneiros.
O deputado negou posteriormente o esquema, dizendo que houve um mal entendido.
O episódio está sendo investigado. Além dos R$ 200 mil recebidos da JBS, cujo intermediador da propina teria sido o presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), Antônio Jorge Camardelli, Alceu Moreira responde na Justiça pela influência que teve para beneficiar a empresa MAC Engenharia na pavimentação da RS-494, no norte do estado.
Sócio de uma empresa agropecuária, Alceu Moreira viu seu patrimônio crescer 859% em 16 anos, saltando de R$ 271 mil, em 2002, para R$ 2,6 milhões, em 2018, segundo as declarações entregues ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Na sua atuação parlamentar, destaca-se a presidência da CPI da Fundação Nacional do Índio (Funai) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), onde, junto com outros integrantes da bancada ruralista, criou uma série de argumentos para desqualificar o trabalho de antropólogos, sociólogos, religiosos e procuradores de Estado que trabalham pela causa de camponeses e povos tradicionais.
Proprietário de 1.564 hectares de terras em São Borja, na fronteira com a Argentina, Luis Carlos Heinze (PP) é sócio da produtora de arroz Imembuy. Ele fundou a Associação dos Arrozeiros de São Borja – município onde estreou na política, em 1993, como prefeito – e foi seu primeiro presidente. Segundo as declarações ao TSE, o candidato à reeleição possuía, em 1998, R$ 1,9 milhão em bens. Vinte anos depois, sua fortuna quadruplicou: passou para R$ 8,3 milhões.
Em 2004, Heinze inseriu um dispositivo na Lei 10.925, que isentava produtos da cesta básica do pagamento de Programação de Integração Social (PIS) e de Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Entre os itens que foram alcançados pela benesse estava o arroz. Em 2015, o gaúcho enviou à Câmara o Projeto de Lei 2110/15, que prevê a cobrança de PIS (2,1%) e Cofins (9,65%) nas importações de arroz.
Ainda em 2015, o parlamentar apresentou o Projeto de Lei 34/15, conhecido como PL Heinze, que determinava a alteração da Lei de Biossegurança ao desobrigar a presença do símbolo dos transgênicos , o T preto dentro do triângulo amarelo, usado no rótulo de alimentos que tenham essas matérias-primas. A informação só seria pública no caso de a quantidade de transgênico superar 1% da composição final do produto. Ainda assim, sem o símbolo, apenas a frase “contém (nome do ingrediente) transgênico”.
As contribuições dos ruralistas gaúchos não param por aí. O deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS) é um dos vários integrantes da bancada ruralista no Congresso que não declaram patrimônio no campo, mas contam com apoio financeiro do setor. Um dos principais doadores para a sua campanha, em 2018, foi Rubens Ometto Silveira, presidente do Conselho da Cosan, empresa que compõe, em parceria com a Shell, a multinacional Raízen. Silveira destinou R$ 150 mil para a campanha de Goergen.
Como Alceu Moreira, Goergen foi citado pelo diretor da JBS, Ricardo Saud, em sua delação. O parlamentar gaúcho teria recebido R$ 100 mil em propina em setembro de 2014. O dinheiro paralelo também teria sido intermediado por Antônio Jorge Carmadelli, da Abiec.
Goergen é reconhecido por ser um voraz perseguidor das populações tradicionais e seus direitos. Em junho de 2016, ele somava 29 projetos de decreto legislativo suspendendo 826,6 mil hectares de áreas rurais para a reforma agrária e regularização de territórios indígenas e quilombolas.
Em março, Goergen fez campanha no Congresso para tentar emplacar um Projeto de Lei (9.604/2018) que tenta classificar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) como grupos terroristas.
O PL do membro da FPA visa alterar o segundo artigo da Lei Antiterrorismo, sancionada pela ex-presidente Dilma Rousseff, que prevê uma salvaguarda na aplicação da classificação de terrorista para “manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios”.
Oriundo de uma família de políticos e proprietários de terras, Covatti Filho (PP) ganhou projeção nacional por ser autor do Projeto de Lei 3200/15, que deu uma forte recauchutada no PL 6299/2002, do atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi, e tornou-se conhecido como PL do Veneno, relatado pelo paranaense Luiz Nishimori.
O projeto propõe a substituição do termo agrotóxico por “defensivo fitossanitário” e “produto de controle ambiental”. Covatti justifica dizendo que é preciso tirar a carga negativa que acompanha o termo “agrotóxico”.
Esses e outros políticos gaúchos que apoiam o agronegócio querem continuar no Congresso. Veja a relação abaixo: