Financiadores da bancada ruralista publicam anúncio em “total apoio” a Ricardo Salles

CNA, Aprosoja, Sociedade Rural Brasileira e usineiros estão entre os que pagaram publicidade de página inteira, nos jornais de hoje, em desagravo ao ministro do Meio Ambiente; ele disse em abril, com Bolsonaro, que aproveitaria a pandemia para “passar a boiada” nas leis ambientais

Por Alceu Luís Castilho

Ricardo Salles não representa apenas Ricardo Salles. Mais de oitenta organizações patronais publicaram um anúncio de página inteira, nos jornais de hoje, em “total apoio” às políticas do Ministério do Meio Ambiente. Ainda que a nota não mencione o nome do ministro, trata-se de um aval à fala dele na reunião com Jair Bolsonaro no dia 22 de abril, quando ele disse que se deveria aproveitar a “tranquilidade” da cobertura da imprensa — que, segundo ele, só fala da Covid-19 — para aprovar as desregulamentações ambientais. Em suas palavras, “ir passando a boiada”.

Setores importantes do agronegócio estão entre os signatários do manifesto. Entre eles estão alguns dos principais financiadores do Instituto Pensar Agro (IPA), a organização que sustenta a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a principal face institucional da bancada ruralista.

Em outras palavras, quem declara esse apoio a Ricardo Salles são as organizações — por sua vez financiadas por grandes empresas e bancos, nacionais e multinacionais — que mantêm a bancada ruralista, fiadora do governo Bolsonaro. De Olho nos Ruralistas detalhou essa teia de financiadores há exatamente um ano: “Multinacionais são financiadoras ocultas da Frente Parlamentar da Agropecuária“.

Em contrapartida, organizações ambientalistas de todo o país pedem a saída do ministro. Entre elas o Greenpeace e o Observatório do Clima.

RURAL E ABRAFRIGO: PECUÁRIA ESTÁ COM O MINISTRO

A lista de 88 apoiadores do ministro é encabeçada pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA). Entre diversos representantes de empreiteiros e do mercado imobiliário, ela traz outros nomes importantes do agronegócio, como a Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), uma das principais influenciadoras do Instituto Pensar Agro, a Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas) e a Associação das Empresas Cerealistas do Brasil (Acebra).

Salles na reunião do dia 22 de abril: “passar a boiada”. (Imagem: Reprodução)

O setor do feijão também aparece no desagravo a Salles com o Conselho Brasileiro do Feijão e Pulses (CBDFP), o Instituto Brasileiro De Feijão e Pulses e Colheitas Especiais (Ibrafe) e a Associação dos Produtores de Feijão, Trigo e Irrigantes de Mato Grosso (Aprofir). De Olho nos Ruralistas identificou trinta organizações diretamente ligadas ao agronegócio entre os que aprovam a política ambiental de “passar a boiada”.

Vale mencionar entre os signatários a Associação Brasileira de Reciclagem Animal (Abra) — muito embora a pecuária tenha duas organizações mais poderosas na lista, a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo) e a Sociedade Rural Brasileira. A Rural reúne, nos últimos anos, expoentes da extrema-direita em São Paulo, o que a levou a apoiar, em dezembro, a indicação de Ricardo Salles para o governo Bolsonaro.

A organização indicou no ano passado seu tesoureiro, Joaquim Pereira Leite, para o cargo de diretor do Departamento de Florestas do Ministério do Meio Ambiente. Leia mais aqui sobre ela: “FHC, o Fazendeiro – Fundação FHC fica no mesmo prédio – e não por acaso – que a Sociedade Rural Brasileira“.

A pecuária é uma das principais responsáveis pela devastação da Amazônia.

USINEIROS ASSINAM EM PESO O DESAGRAVO

O setor canavieiro, interessado no avanço da produção na Amazônia, tem uma agenda própria no Congresso, com uma frente parlamentar específica. Está representado no manifesto pelas Associações dos Fornecedores de Cana do Extremo Sul da Bahia (AFCESBA), de Alagoas (Asplan), do Rio Grande do Norte (Asplana-RN), de Sergipe (Asplana-SE) e de Pernambuco (AFCP), entre outras organizações em São Paulo e no Nordeste. Além de quatro sindicatos ligados aos usineiros paranaenses e da poderosa União da Indústria de Cana de Açúcar (Única).

A Única é uma das organizações que financiam o Instituto Pensar Agro. Entre as empresas que a financiam, por sua vez, estão gigantes do setor canavieiro como a Bunge e a Raízen. Entendam aqui como ocorre esse apoio à bancada ruralista:

 

Outras organizações não aparentam conexão direta com o agronegócio, mas ela existe. Uma das primeiras na lista, a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos assina por meio de seu presidente, João Carlos Basílio. Mas o CEO da Abihpec é o presidente do grupo Boticário, Artur Grynbaum. A fundação ligada ao grupo é financiadora de projetos ambientais pelo país.

EMPRESÁRIOS DIZEM QUE BUROCRACIA TAMBÉM DEVASTA

A nota dessas organizações traz o seguinte título: “No meio ambiente, a burocracia também devasta”. Após falarem em desenvolvimento sustentável e condenarem “os infratores”, aqueles que praticam concorrência desleal com as empresas “regulares e responsáveis”, os signatários vão ao ponto principal:

—  As ações do Ministério do Meio Meio Ambiente, na defesa da legislação e dos interesses ambientais com sensibilidade ao desenvolvimento do país de forma sustentável e legítima, contam com nosso total apoio.

São estas as instituições que assinaram o anúncio de página inteira (ao lado, uma reprodução bem menor) nos jornais.

Confira a nota assinada por essas organizações:

“As entidades abaixo reafirmam seu compromisso com a preservação do meio ambiente e o desenvolvimento sustentável, condenando os infratores que, além de causarem prejuízos ambientais e à imagem do país, praticam concorrência desleal às empresas regulares e responsáveis. Condenamos, também, a agenda burocrática que utiliza a bandeira ambiental como instrumento para o travamento ideológico e irrazoável de atividades econômicas cumpridoras das leis e essenciais ao desenvolvimento econômico do país. Tal agenda afasta investimento e subtrai empregos, gerando grande pobreza em vez de respeito ao meio ambiente. As ações do Ministério do Meio Meio Ambiente, na defesa da legislação e dos interesses ambientais com sensibilidade ao desenvolvimento do país de forma sustentável e legítima, contam com nosso total apoio”.

Foto principal: Salles e Tereza Cristina pedindo bênção para a Rural. (Foto: Gilberto Marques/A2img/Governo de SP)

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