Suely Araújo, do Observatório do Clima, e Ana Chã, do MST, destacaram o papel dos cem maiores municípios para o planeta; líderes da Terra Indígena Jaraguá prestigiaram aniversário do De Olho nos Ruralistas, que lança campanha rumo aos 300 apoiadores
Por Luís Indriunas
Para celebrar seus 8 anos de existência, De Olho nos Ruralistas lançou nesta quinta-feira (05) o dossiê “Os Gigantes”, que reúne informações sobre as políticas ambientais dos cem maiores municípios em extensão territorial. Eles compõem 37% do território brasileiro, equivalente ao tamanho da Índia. O evento contou com um painel de especialistas e com o lançamento da nova campanha institucional do observatório, visando alcançar 300 novos apoiadores.
“Os dados do relatório são impressionantes”, destacou a coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo, uma das participantes do debate realizado no Armazém do Campo, em São Paulo. “O conteúdo aponta para poluição e degradação ambiental, que, reunidos, resultam na crise climática. Os dados reúnem municípios onde se evidenciam as relações oligárquicas e coloniais que dominas as políticas locais”. Doutora em ciência política, Suely presidiu o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) entre 2016 e 2018.
Ana Chã, do coletivo de cultura e da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), apontou que a hegemonia do agronegócio nessas regiões depende de alianças com o Estado. “O relatório consegue fazer esses apontamentos e denúncias de uma forma ampla, como um projeto de poder”.
“A gente já está sentindo na pele as mudanças climáticas, por isso precisamos olhar para esses municípios”, destacou a repórter Carolina Bataier, do Brasil de Fato. A jornalista, que participou da elaboração do dossiê, detalhou um dos casos analisados no Pantanal, que enfrenta a maior seca de sua história. “Existe uma comunidade em Corumbá onde o principal meio de locomoção das pessoas era, até 2018, barco, e agora elas estão usando trator”.
O debate contou ainda com a participação de cerca de vinte representantes da Terra Indígena (TI) Jaraguá, localizada no pico de mesmo nome, na zona oeste de São Paulo. “Vendo essas imagens e esses dados, é possível entender claramente porque nosso país está da forma que está”, falou a cacica Araju Apolinário, líder do território Guarani Mbyá.
Ela destacou a importância da parceria com a imprensa independente e celebrou a parceria com o De Olho nos Ruralistas, que cobre os conflitos envolvendo a TI Jaraguá desde sua fundação, em 2016.
Em abril de 2023, os Guarani participaram no lançamento de outro projeto de pesquisa do observatório, o relatório “Os Invasores”, realizado na sala Mário de Andrade do Cine Petra Belas Artes. Na época, o debate teve participação de Txai Suruí, da organização indígena Kanindé, de Rondônia: “Indígenas prestigiam lançamento de dossiê sobre face política das sobreposições“.
Outra líder do território, a professora Jandira Guarani, fez um depoimento pessoal: “Eu fico muito triste quanto eu levo meus alunos para fazer a análise do rio que passa no nosso território, porque a cada ano vejo que está mais poluído”.
Após as falas, Karai Djekupe, também conhecido como Thiago Guarani, puxou uma reza de proteção, celebrando os oito anos do De Olho nos Ruralistas.
O evento de lançamento do dossiê “Os Gigantes” teve início com a exibição do documentário “Elizabeth”, que estreou há exatamente um ano, no aniversário de sete anos do observatório. O curta-metragem foi reconhecido em julho no 31º Festival de Cinema de Vitória, vencendo o prêmio do júri popular como melhor filme da 7ª Mostra Nacional de Cinema Ambiental.
Após a exibição do filme, o diretor do De Olho nos Ruralistas, Alceu Luís Castilho, anunciou o lançamento da nova campanha de apoiadores do observatório. “Para que possamos continuar por mais oito anos, precisamos chegar a 300 apoiadores”, destacou. O vídeo institucional pontua oito razões para apoiar o De Olho e pede que cada parceiro envie o material para mais oito amigos, num esforço de divulgação.
Fundado em setembro de 2016, o observatório realiza sua quinta cobertura eleitoral. Além do dossiê “Os Gigantes”, foi lançada em junho a série “Endereços”, trazendo a relação entre os candidatos à prefeitura e Câmara Municipal de São Paulo com as políticas públicas e a destruição ambiental. O primeiro episódio da série mostrou o sítio do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, em área de nascentes na zona sul da capital paulista. O último, publicado em 14 de agosto, mostra como o empresário Pablo Marçal enriqueceu negociando dívidas de fazendeiros com agiotas.
O território brasileiro comporta quase todo o continente europeu. Um quinto das Américas. É a maior área continental do hemisfério sul. O Oiapoque, no Amapá, está mais próximo do Canadá do que em relação a Chuí, no extremo sul do país. Entre o litoral paraibano, onde se inicia a Rodovia Transamazônica, e Mâncio Lima, na divisa com o Peru, são 4.326 quilômetros — quase a mesma distância entre Lisboa e Moscou.
“É uma fatia decisiva e esquecida do Brasil”, aponta Castilho. “Esses municípios costumam ficar fora da cobertura eleitoral, diante da ênfase nos grandes centros urbanos, mas a importância ambiental deles é gigantesca. O impacto deles é planetário”.
Além do dossiê “Os Gigantes”, De Olho nos Ruralistas publicará uma série de vídeos e reportagens detalhando os principais achados do estudo, que mapeia as políticas ambientais dos cem municípios e conta casos emblemáticos de conflitos de interesses envolvendo prefeitos-fazendeiros e a influência de empresas e sindicatos rurais. O primeiro episódio está disponível em nosso canal no YouTube.
Confira abaixo:
| Luís Indriunas é editor e roteirista do De Olho nos Ruralistas. |
Imagem principal (Vanessa Nicolav/De Olho nos Ruralistas): debate apontou a relação da política local com agronegócio e devastação ambiental
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