Sexta maior doadora de campanha, Maribel é investigada pela Polícia Federal por lavagem de dinheiro do PCC; governador visitou as duas últimas edições da Feicorte, encontro de pecuaristas promovido pelo cunhado de Judiliane Golin, filha de Maribel
Por Tonsk Fialho
O governador paulista Tarcísio de Freitas (Republicanos) afirmou não conhecer a pecuarista Maribel Schmittz Golin, sexta maior doadora de sua campanha ao Palácio dos Bandeirantes e acusada pela Polícia Federal de lavar dinheiro para Willian Barile Agati, o “Concierge do PCC“. Em nota enviada à Folha, o ex-ministro de Infraestrutura de Jair Bolsonaro informou que sua campanha contou com mais de 600 financiadores e que não possui vínculo com a empresária. Maribel realizou duas doações em 2022, totalizando R$ 500 mil.
De Olho nos Ruralistas identificou a participação de Tarcísio em duas edições consecutivas da Feira Internacional da Cadeia Produtiva da Carne (Feicorte), organizada pelo cunhado de Judiliane Golin Loureiro, uma das filhas da pecuarista.
Em Boituva, a Stall Energy, uma empresa de tratamento de resíduos na qual Maribel é sócia, recebeu a visita oficial do secretário de Desenvolvimento Econômico, Jorge Lima. Ele foi recebido por Joselito Golin, marido de Maribel Golin. Oficialmente, Golin não é sócio da empresa.
Os dados sobre o clã Golin estão sendo apresentados em nosso canal do YouTube e em uma série de reportagens em nosso site. A primeira delas, publicada nesta quarta-feira (20), detalha o histórico fundiário e ambiental da família: “Quem é Maribel Golin, a financiadora de Tarcísio investigada por lavagem de dinheiro do PCC?”
Confira aqui o vídeo:
Além de Maribel Golin, o vídeo resgata a trajetória de outros financiadores de campanha de Tarcísio de Freitas. São dezenas de casos de desmatamento, trabalho escravo, desvios de dinheiro público e fraudes milionárias, que serão detalhados em reportagens ao longo dos próximos dias.
De chapéu na cabeça, o governador Tarcísio de Freitas distribuiu abraços e apertos de mão enquanto circulava pelos estandes da Feira Internacional da Cadeia Produtiva da Carne (Feicorte), em Presidente Prudente, a 567 quilômetros da capital paulista. O evento é considerado a maior feira indoor de gado de corte da América Latina e reúne pecuaristas, empresários e políticos em leilões, exposições e debates sobre o setor.
Um vídeo divulgando a visita foi postado nas redes do governador no ano passado, em 19 de novembro, acompanhado de uma trilha sonora peculiar: a música de abertura da novela O Rei do Gado.
Em 17 de junho, o governador retornou ao evento. Dessa vez, acompanhado do ex-presidente Jair Bolsonaro, em uma de suas últimas aparições públicas antes da prisão preventiva, em 04 de agosto. No palco principal, Bolsonaro abraçou uma criança vestida de verde e amarelo e ofereceu “aulas particulares” sobre política para o governador. Tarcísio retribuiu, transformando o evento em um ato de desagravo. “Eleição sem Jair Bolsonaro é negação da democracia”, afirmou o presidenciável.
A Feicorte tem a curadoria do pecuarista Diede Loureiro Neto, que também foi um dos palestrantes do evento. Ele é irmão de Alessandro Fonseca Loureiro, marido de Judiliane Golin, filha mais velha de Maribel — a doadora de Tarcísio ligada, pela Polícia Federal, ao PCC.
Os laços de Diede com o clã Golin vão além. O pecuarista é sócio na Inbra Nutrição Animal, uma fabricante de ração bovina sediada em Itapetininga (SP), no mesmo endereço da Fazenda Realeza, no km 173 da Rodovia Raposo Tavares. O imóvel abriga a sede do grupo Golin e, nos anos 1990, serviu de vitrine para a expansão da Fazendas Reunidas Boi Gordo, responsável por um dos maiores escândalos de pirâmide financeira do país. A massa falida da empresa foi adquirida em 2003 por Joselito Golin — pai de Judiliane, marido de Maribel. Na época, a Boi Gordo acumulava R$ 2,5 bilhões em dívidas.
O outro sócio de Diede Loureiro na Inbra é Renato Ruegger Pereira de Freitas, marido de Ana Paula Schmittz Golin. Ao lado da irmã Judiliane, Ana Paula participa ativamente dos negócios da família e é sócia em diversas empresas do grupo. As duas foram apontadas em um relatório encomendado pelo síndico da massa falida da Boi Gordo, sob supervisão do Ministério Público de São Paulo, como beneficiárias de um esquema de transferência de bens da empresa.
Segundo o estudo, Joselito Golin — que se apresenta também como Paulo Golin — desviou R$ 612 milhões que deveriam ser utilizados no abatimento das dívidas. O dinheiro teria sido usado na compra de fazendas no Matopiba, em áreas onde o preço da terra era mais baixo.
A ligação entre os Golin e a Feicorte é ainda mais antiga. Em 2012, a revista Dinheiro Rural divulgou que a feira inaugurava seu primeiro leilão virtual. Entre as empresas que negociavam raças como nelore, angus, simental e guzerá, estava o grupo Golin. Ao todo, foram vendidos cerca de 10 mil animais para cria, recria e engorda.
Fundada em 2021, a Stall Energy atua na recuperação energética de resíduos urbanos, fabricando reatores capazes de transformar lixo em hidrogênio. Em janeiro de 2023, quando Tarcísio assumiu o Palácio dos Bandeirantes, sua doadora Maribel Schmittz Golin, acusada pela PF de lavar dinheiro para o “Concierge do PCC”, se tornou sócia da Stall Energy através da holding Green Investimentos e Participações.
A Green havia sido criada dois meses antes, em novembro de 2022, logo após o segundo turno da eleição que levou o governador ao Palácio dos Bandeirantes. Com ela, Maribel abriu caminho para novos negócios na área de energia, expandindo sua atuação para além da pecuária e dos transportes.
Em agosto de 2024, a Stall virou vitrine oficial do governo paulista. O secretário de Desenvolvimento Econômico, Jorge Lima, visitou a fábrica da empresa em Boituva, região metropolitana de Sorocaba, e registrou o encontro em suas redes sociais. O fato foi veiculado pelo jornal Metrópoles na semana seguinte à divulgação da denúncia da PF sobre o envolvimento de empresas de Maribel na lavagem de dinheiro para Willian Barile Agati.
Mas houve um detalhe que passou desperccebido na reportagem. Quem recebeu o secretário durante a visita na Stall não foi Maribel, mas sim o seu marido, Joselito Golin, que não aparece no contrato social da empresa. Nas imagens, ele sorri e faz sinal de “joinha”. Sua esposa, doadora de Tarcísio, não aparece nas imagens.
Na ocasião, o secretário não economizou elogios. Chamou o projeto de “fantástico” e destacou o “investimento pesado no estado de São Paulo”, alinhando a Stall à política energética do governo — que no mesmo período aprovava incentivos fiscais e isenção de IPVA para ônibus e caminhões movidos a hidrogênio e gás natural.
Em fevereiro do ano passado, Tarcísio viajou pela Europa junto de Jorge Lima para apresentar o estado como “o maior mercado de economia verde do Brasil”. Em reuniões com investidores em Madri, Milão e Paris, o governador destacou projetos sustentáveis, com ênfase no hidrogênio como matriz de transporte e mobilidade.
É justamente o mesmo eixo em que atua a Stall Energy, que fabrica reatores para geração de hidrogênio a partir de resíduos. Recentemente, em 10 de junho de 2025, a empresa registrou uma patente relacionada a esse processo junto ao Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (Inpi).
Procurado pela reportagem, o grupo Golin afirma que a atuação da Stall Energy tem “motivos estratégicos de mercado, em nada relacionados a governos ou política”. Confira a íntegra da nota abaixo.
O Grupo Golin tem 35 anos de atuação e relevância nacional, com fazendas em 8 estados, gerando milhares de empregos e fornecendo soja, milho, algodão e gado para as maiores empresas do país. Suas coligadas patrimoniais administram participações societárias e negociam áreas rurais, imóveis próprios e bens móveis. As movimentações financeiras do grupo, portanto, são proporcionais ao seu volume de negócios.
As empresas do Grupo e seus representantes não têm qualquer relação com as pessoas que agora enfrentam acusações criminais no Inquérito Policial. O processo em questão está sob sigilo, mas a Justiça Federal já reconheceu que a negociação foi feita de boa-fé, de forma lícita e regular e que a empresa da qual Maribel Golin é sócia tinha capacidade econômica para a transação. Os autos dos Embargos de Terceiro Criminal n.º 5058194-36.2022.4.04.7000 tramitaram na Justiça Federal de Curitiba com segredo de Justiça e tiveram trânsito em julgado.
O aumento de capital social da empresa JBT Empreendimentos e Participações — devidamente registrado nos órgãos oficiais —; a atuação da Stall Energy, voltada para o meio ambiente; e as parcerias rurais em empreendimentos na Bahia e em Mato Grosso têm todos motivos estratégicos de mercado, em nada relacionados a governos ou política.
O Grupo Golin repudia a prática de grilagem de terras, à qual inclusive teve de resistir com o uso de segurança privada depois que propriedades no Piauí foram alvo de invasões por um grupo de grileiros.
Do mesmo modo, as empresas do Grupo vêm cumprindo as exigências da legislação de preservação ambiental e dos órgãos reguladores. A autuação recebida pela Eldorado Agroindustrial, no Tocantins, foi suspensa pela Justiça e o auto de infração ambiental lavrado no Piauí foi julgado improcedente ainda na esfera administrativa.
Assessoria de Imprensa do Grupo Golin
Imagem em destaque (Divulgação): Tarcísio discursa em encontro de pecuaristas organizado por Diede Loureiro, parceiro dos Golin.
| Tonsk Fialho é pesquisador e repórter do De Olho nos Ruralistas. |