Bolsonaro promete acabar com o Ministério do Meio Ambiente; Haddad propõe transição ecológica

Candidato do PSL defende  facilidades para entrada de agrotóxicos e saída do Acordo de Paris; petista traz bagagem de retrocessos dos governos Dilma e Lula

Durante o seu sexto mandato como deputado federal, em janeiro de 2012, Jair Bolsonaro foi usufruir das férias no litoral sul do Rio e resolveu praticar pesca ilegal na ilha de Samambaia, dentro da Estação Ecológica de Tamoios, categoria de área protegida que não permite a presença humana. Ele foi pego em flagrante por fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e multado em R$ 10 mil.

A reação do candidato à Presidência da República pelo PSL foi, em primeiro lugar, a de se recusar a apresentar seus documentos e ligar para seus conhecidos do então governo Dilma Rousseff para liberá-lo da multa. Não deu certo. Mas o episódio não saiu da cabeça do deputado: um ano depois ele apresentou um projeto de lei para que os fiscais ambientais não pudessem mais portar armas, contrariando seu discurso pró-armamento.

Jair Bolsonaro (PSL) recebe integrantes da bancada ruralista em sua casa. (Foto: FPA)

É com esse tipo de posicionamento em relação ao meio ambiente que Bolsonaro pretende governar o país, se eleito. Por isso, já anunciou que irá acabar com o Ministério do Meio Ambiente, tirar o Brasil do Acordo de Paris (que prevê redução das emissões de dióxido de carbono) e apoia abertamente facilidades para a entrada de mais agrotóxicos no Brasil.

Fernando Haddad, do PT, fala em uma transição ecológica a ser colocada em prática com uma série de medidas que vão do desmatamento líquido zero ao imposto verde, de pesquisa em tecnologia e investimento a energias renováveis. Pesam contra o candidato as medidas dos governos Lula, como a liberação dos transgênicos, e Dilma Rousseff, que alterou o Código Florestal, anistiando o desmatamento.

GENERAL DIZ QUE IBAMA ‘ENCHE O SACO’

A ofensiva de Bolsonaro contra os órgãos ambientais está no seu programa de governo, mesmo que de forma genérica. Sem citar categoricamente o fim do Ministério do Meio Ambiente como tem feito em entrevistas, o candidato do PSL prevê uma “nova estrutura federal agropecuária teria as seguintes atribuições: política e economia agrícola, recursos naturais e meio ambiente rural, defesa agropecuária e segurança alimentar, pesca e piscicultura, desenvolvimento rural sustentável e inovação tecnológica”.

Essas medidas vão ao encontro do que pensam os principais apoiadores do capitão reformado, como o general Oswaldo Ferreira, responsável pelos planos nas áreas de infraestrutura e meio ambiente de Bolsonaro. Em entrevista ao Estadão em 11 de outubro, Ferreira foi claro sobre sua posição em relação aos órgãos ambientais e autoridades que fiscalizam as ações predatórias.

– Eu fui tenente feliz na vida. Quando eu construí estrada, não tinha nem Ministério Público nem o Ibama. A primeira árvore que nós derrubamos (na abertura da BR-163), eu estava ali… derrubei todas as árvores que tinha à frente, sem ninguém encher o saco. Hoje, o cara, para derrubar uma árvore, vem um punhado de gente para encher o saco.

Para manter essa lógica, o programa de governo de Bolsonaro prevê que os licenciamentos para projetos de energia demorem apenas três meses.

Quanto às energias alternativas, o programa de Bolsonaro não cita a questão. O economista Luciano Castro, que, junto com o empresário Paulo Guedes, assessora as questões econômicas para o candidato, deixou claro em entrevista à Gazeta do Povo que elas não está no escopo das principais medidas do candidato. “Está tudo em estudo, nós ainda vamos avaliar”, disse em entrevista publicada no dia 11 de setembro, garantindo que o que for decidido vai ficar nas mãos da iniciativa privada.

Em relação aos agrotóxicos, Bolsonaro já apresentou sua posição: acha que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não deve ser meter no assunto. “Se depender de mim, apenas o Ministério da Agricultura decidiria a liberação do produto”, declarou o candidato, em maio.

Finalmente, o candidato do PSL quer retirar o Brasil do Acordo de Paris, tratado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, que rege medidas de redução de emissão dióxido de carbono. Junto com Bolsonaro, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, é contra o acordo. Um dos conselheiros do deputado, o líder ruralista Luiz Antonio Nabhan Garcia, classifica o documento que elabora medidas contra a poluição na Terra de “papel higiênico”.

HADDAD PROPÕE UMA TRANSIÇÃO ECOLÓGICA

O candidato Fernando Haddad (PT) apresenta no seu programa de governo a proposta que chama de “transição ecológica”. Em poucas palavras, o modelo seria uma forma de, gradualmente, “garantir práticas e inovações verdes como motores de crescimento inclusivo, desenvolvimento nacional e oportunidades de bem viver para o nosso povo”. Para tal, Haddad prevê adoção de tecnologias verdes modernas, investir em ciência, tecnologia e inovação para garantir, entre outros pontos, uma inflexão gradual em nossa matriz energética. O político promete ainda investir na gestão sustentável dos recursos hídricos, protegendo aquíferos e lençóis freáticos da contaminação e superexploração, recuperando nascentes, despoluindo rios e ampliando as obras de saneamento.

Haddad durante a IV Conferência da Amazônia, em maio. (Foto: Divulgação)

Dentro de sua política econômica, o petista quer fazer uma reforma fiscal verde para ajudar no financiamento público de baixo custo, com o objetivo de reduzir os custos e os riscos da transição.

Na área de energia, Haddad prevê zerar as emissões de gases do efeito estufa da matriz elétrica brasileira até 2050, tendo como meta instalar kits fotovoltaicos em 500 mil residências por ano.

A transição ecológica pressupõe uma consistente política pública de educação ambiental. “Os processos educadores ambientalistas devem estar no coração do governo e perpassar todas as políticas públicas e formas de atuação do Estado brasileiro junto à sociedade”, detalha o programa. “A transversalidade da temática exigirá uma política de educação ambiental permanente, continuada e articulada com a totalidade da sociedade brasileira. Sem participação social não há educação ambiental”.

Em relação aos animais ameaçados de extinção, Haddad e sua equipe acreditam que o aparato legal não tem sido insuficiente para reverter o quadro. Assim, o governo pretende criar um amplo debate para a construção de políticas públicas nacionais de proteção e defesa dos animais, em especial na área de educação.

Haddad ainda propõe zerar o desmatamento líquido da Amazônia até 2022, que significa acabar com a diferença entre o desmatamento de novas áreas com “aptidão agrícola” e o reflorestamento de áreas já ocupadas sem aptidão agrícola.

Por fim, para boa parte dessas medidas, o petista promete fiscalizar o cumprimento imediato do Código Florestal, incluindo o Cadastramento Ambiental Rural. Além disso, fortalecerá a proteção das unidades de conservação e dos demais bens da natureza.

Os governos petistas receberam fortes críticas de ambientalistas, principalmente em relação às mudanças do Código Florestal. Dilma fez uma aliança com a bancada ruralista que permitiu um novo Código Florestal, beneficiando os proprietários rurais com a anistia à obrigação de reflorestar e às multas por desmatamento ilegal antes de 22 de julho de 2008, além da redução das Áreas de Preservação Permanente (APP).

Em relação às unidades de conservação, levantamento do Instituto Socioambiental (ISA) mostra que, enquanto os governos Fernando Henrique Cardoso criaram 82 unidades, Lula fechou seus mandatos com 77 e Dilma, com apenas 13.|

Mesmo no governo Lula os ruralistas tiveram voz e vez. Eles aprovaram no fim de 2013, por exemplo, a lei dos transgênicos, que beneficiou as grandes empresas de biotecnologia e desfavoreceu a agricultura familiar.

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