Adriana Ramos vê a frente como principal força do governo Temer; ela considera bizarro que se preocupem com terras indígenas “e não com o que vão fazer no resto do país”
Por Izabela Sanchez
A bancada ruralista foi a principal frente responsável por dar sobrevida ao governo de Michel Temer (PMDB). Dos 263 votos pelo arquivamento da denúncia contra o presidente no dia 2 de agosto, 129 foram dados por deputados da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA). Coordenadora do Programa de Política e Direito Socioambiental do Instituto Socioambiental (ISA), Adriana Ramos acredita que essa bancada, hoje, configura a simbiose completa do governo: mantém Temer no Poder em troca das demandas do agronegócio.
Ela diz que essas demandas ameaçam por completo os direitos territoriais e de proteção ao meio ambiente. Que a bancada é retrógrada e tem como prioridade a desconstrução desses direitos. Isso tudo fora o perdão das dívidas ruralistas, como no caso do Funrural:
– Além de atentar contra os direitos territoriais, a bancada também busca criminalizar as instituições representativas ou de apoio aos povos indígenas, comunidades tradicionais e assentados da reforma agrária. Ou seja, buscam fragilizar a luta e a vida dessas populações em diferentes dimensões. É um ataque estruturado.
AMEAÇAS AOS DIREITOS DOS POVOS TRADICIONAIS
Adriana Ramos comenta que a principal moeda de troca do governo com a bancada ruralista são os direitos dos povos tradicionais. Ganhou força no governo Temer a tese do Marco Temporal, interpretação jurídica desenhada pelo Supremo Tribunal Federal em 2009 na decisão sobre a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.
A tese seria apenas uma das diversas ameaças a esses povos:
– A força da tese vem da defesa que o setor rural faz dela. O porquê disso eu não sei dizer, acho bizarro que os proprietários de terra estejam preocupados com um percentual baixo de terras de uso coletivo em vez de discutir o que fazer e como ocupar o restante do país.
Segundo a coordenadora, a tese do Marco Temporal foi a forma que eles encontraram para restringir os direitos territoriais e ampliar seu potencial de receber recursos de indenização pelas terras tradicionalmente ocupadas:
– Quando as autoridades demonstram seu desrespeito com os direitos da população com decisões como o parecer da AGU que afeta os direitos indígenas, ou a decisão da Casa Civil de paralisar a titulação de territórios quilombolas, elas sinalizam para a sociedade que esses grupos são descartáveis, o que acaba por estimular a violência.
MAIS VENENO, MAIS PODER
Outra barganha de Temer junto aos ruralistas é uma Medida Provisória, prestes a sair da Casa Civil, que altera as regras do uso de agrotóxicos no país. A proposta possibilita a autorização de substâncias cancerígenas. Enquanto isso, o Senado também articula o enfraquecimento na fiscalização dos pesticidas, com o PL 209/2013, de autoria do ex-senador Ruben Figueiró (PSDB-MS).
Essa proposta quer excluir os Ministérios do Meio Ambiente e da Saúde do processo de análise toxicológica. Para a coordenadora do ISA, os venenos são uma das faces retrógradas do agronegócio brasileiro:
– Ele está estruturado em um modelo que é dependente dos agrotóxicos tanto técnica quanto economicamente. O pacote tecnológico disponibilizado para os agricultores impõe o uso e consumo de agrotóxicos, de modo que naturalizou o uso de pesticidas como se não fosse possível produzir sem eles.