Órgão comemora doação de caminhão por usineiros; avanço dos canaviais é um dos motivos do confinamento de indígenas no estado
A Fundação Nacional do Índio (Funai) decidiu: a necessidade que o governo tem de estar bem com o mundo empresarial vale um caminhão. Notícia de hoje no site da instituição: “No ano em que comemora 50 anos, Funai recebe apoio em área de conflito“. O presidente da instituição, Antônio Costa, recebeu de representantes da Raízen a doação de um caminhão para a coordenação em Dourados – município central no caso dos conflitos envolvendo povos indígenas no Mato Grosso do Sul.
A Funai diz que o caminhão climatizado “propiciará condições estruturais para que os indígenas tenham acesso a todos os direitos sociais”, e facilitará parcerias com outras instituições.
O avanço da cana de açúcar no Mato Grosso do Sul é um dos grandes responsáveis, nas últimas décadas, pelo confinamento dos povos Guarani Kaiowá, Guarani Ñandeva e Terena em áreas minúsculas. A violência contra os povos indígenas – que são vítimas diárias de discriminação – matou centenas de pessoas nos últimos anos.
“Que bom seria se todas as empresas tivessem essa sensibilidade e essa iniciativa”, afirmou o presidente da Funai sobre a doação. A notícia traz ainda um item chamado “açúcar ético”, sobre a cadeia produtiva do açúcar. E lembra que, em 2012, a Raízen assinou um termo de cooperação com a Funai, comprometendo-se a não adquirir açúcar de terras indígenas.
Em entrevista ao Valor, na segunda-feira, Costa – um representante do PSC no governo – criticou o que chamou de Funai assistencialista: “Temos que produzir sustentabilidade, ensinar a pescar”. Uma das atividades seria o ecoturismo. “Muitos europeus e outros poderiam visitar aldeias e ajudar a preservar a cultura”, afirmou.
One commentOn Funai tem “solução” para conflito no MS: acordo com Raízen
Por que a demarcação das terras indígenas é importante ? A resposta a essa pergunta pode ser encontrada nos semáforos da maioria das capitais dos Estados brasileiros, onde pedintes esmolam trocados para garantir a refeição do dia. Se prestarmos atenção notaremos, no meio dos marginalizados, um representante dos povos indígenas. Na maioria das vezes usa cocar, vende colares; está acompanhado por esposa e por crianças pequenas que circulam arriscadamente entre carros a pedir moedas. É isso que acontece quando o agronegócio invade terras indígenas: a floresta é derrubada e substituída pela monocultura de soja ou de milho; o gado é trazido para pastar e os índios – seculares donos das terras – são expulsos, primeiramente para cidades próximas, depois para metrópoles. Num ambiente desconhecido para eles, o urbano, os indígenas sofrerão inevitáveis processos de perda de identidade cultural e desestruturação familiar. O pai procurará serviços que requerem menor qualificação profissional como bóia-fria, desossador de frigorífico, ajudante de serviços gerais ou será um desempregado permanente; a mãe trabalhará como faxineira, empregada doméstica ou, na melhor das hipóteses, manicure, enquanto a filha provavelmente será mãe solteira nos primeiros anos da adolescência, interrompendo a formação escolar que poderia tira-la da situação de marginalidade a que são submetidos os índios depois de serem expulsos de suas terras pelo agronegócio e migrarem para as cidades. É por isso que a demarcação das terras indígenas é importante, e urgente.