Eleita com mais de 8 mil votos por Roraima, a primeira advogada indígena do país tem trajetória marcada pela luta por direitos e reconhecimento dos povos que representa
Por Igor Carvalho
Joenia Batista de Carvalho ou Joenia Wapichana, 43 anos, foi eleita a primeira mulher indígena deputada federal do Brasil. A vitória veio em Roraima, seu estado de origem, pela Rede Sustentabilidade, com 8,3 mil votos. Entre suas principais bandeiras, está criar condições para projetos de sustentáveis voltados aos indígenas. Em um de seus vídeos de campanha, ela defende o projeto, dizendo: “Vamos parar de dizer que nós somos empecilho para o progresso de Roraima, nós somos a solução”. Outra bandeira sua é o combate à corrupção.
Na Câmara, ela terá o desafio de lutar contra uma das principais bandeiras da bancada ruralistas que é uma legislação criando a figura do marco temporal, impedindo demarcações de terras para populações indígenas que não ocupavam a terra antes de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. Na prática, isso quer dizer que diversas áreas com processo em andamento não poderiam ser homologadas. Além disso, vários povos que foram expulsos de suas terras durante o governo militar não poderiam reivindicar suas terras. Para ela, o marco temporal é uma “flagrante violação dos direitos indígenas”.
TRAJETÓRIA INÉDITA
A vida de Joenia é marcada por protagonismo e ineditismo. Nascida na Comunidade Indígena Truarú, em Roraima, no meio do Povo Indígena Wapichana, ela se tornou a primeira indígena brasileira formada em Direito, pela Universidade Federal de Roraima (UFRR), em 1997. Em 2011, se tornou mestre pela University Arizona.
Em agosto de 2008, Joenia também foi a primeira indígena a fazer uma sustentação oral em uma audiência no Supremo Tribunal Federal (STF). À época, a advogada elaborou a defesa de 19 mil indígenas que lutavam para ocupar a área integral da Raposa Serra do Sol, a demarcação do território viria somente em 2005. Atualmente, Joenia coordena o Departamento Jurídico do Conselho Indígena de Roraima (CIR), onde atua desde 2012 na defesa dos povos indígenas. Na ocasião, ela se apresentou vestindo uma bata e trazendo no rosto uma pintura que simboliza “força e lealdade”. Com juízes orgulhosos de sua fluência em inglês, francês ou alemão, a deputada os saudou em wapixana.
Nos 190 anos de existência da Câmara dos Deputados, apenas um indígena ocupou cadeiras no plenário. O pioneiro foi Mário Juruna, da aldeia xavante Namakura, próxima a Barra do Garças, no estado de Mato Grosso, em 1982. Juruna (1943-2002) costumava gravar as reunião nos gabinetes da Fundação Nacional do Índio (Funai) e depois na Câmara, para comprovar se o branco cumpriria com sua palavra. Ele também combatia a corrução. Denunciou o empresário Calim Eid, por tentar comprar seu voto em favor do então candidato a presidente da República, Paulo Maluf.