Agentes de saúde indígena contaminados colocam em xeque política do Ministério da Saúde

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Plano de contingência promovido pela Secretaria Especial da Saúde Indígena contra avanço da Covid-19 entre as etnias balança na medida em que profissionais já estão contaminados em duas regiões da Amazônia; somente entre os Yanomami são dezesseis casos

Por Maria Fernanda Ribeiro

A contaminação de profissionais de saúde indígena em duas regiões da Amazônia acendeu o alerta para a disseminação do coronavírus dentro dos territórios pelos próprios agentes que atuam na linha de frente no combate à pandemia. Com isso, coloca em xeque o Plano de Contingência Nacional para Infecção Humana pelo novo Coronavírus (Covid-19) em Povos Indígenas, lançado no dia 17 de março pela Secretaria Especial da Saúde Indígena (Sesai), órgão do Ministério da Saúde.

No sábado, dia 2 de maio, houve a confirmação de testes positivos de dezesseis profissionais do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Yanomami. Outros quatro casos foram confirmados. Até então havia somente um teste positivo entre os membros da etnia: o de Alvanei Xirikana Pereira, um adolescente de 15 anos que morreu no dia 9 de abril.

Em outra região da floresta, no oeste do Amazonas, distrito do Alto Rio Solimões, os testes positivos quintuplicaram em menos de duas semanas. No dia 20 de abril eram 10 casos confirmados; no dia 3 de maio o número saltou para 59. Cerca de 40 entre esses casos estão relacionados aos contatos do médico que testou positivo após retorno ao trabalho e foi o responsável pelo primeiro caso entre os indígenas no Brasil.

DARIO KOPENAWA ACUSA GOVERNO DE OMISSÃO

Dario Kopenawa: “Governo é responsável pelas mortes”. (Foto: Divulgação)

Entre os profissionais contaminados entre os Yanomami, uma delas atua em área indígena, no polo base Alto Catrimani; três na sede administrativa do Dsei Yanomami e doze na Casa de Apoio à Saúde Indígena (Casai) Yanomami, no município de Boa Vista. As informações são da Sesai.

A região do distrito Yanomami abrange os estados de Roraima e Amazonas, em uma área de 96,6 mil quilômetros quadrados. São 366 aldeias com uma população indígena estimada em 26,7 mil pessoas.

“Tantos casos confirmados entre profissionais da Casai e mais cinco entre os próprios Yanomami mostram que está tendo muitas falhas no cuidado de saúde com nossos parentes”, afirma Dario Kopenawa, por meio de nota emitida pela Hutukara Associação Yanomami.

De acordo com o documento, as medidas de contingência precisam ser reforçadas: isolamento adequado, uso de equipamentos de proteção pessoal, testes em pessoas que tiveram contato com casos confirmados, testes nas comunidades e testes em todos os pacientes da Casai. “Ao se omitir, o governo é responsável pelas mortes que podem acontecer pela falta de medidas adequadas”, afirma.

EXPLODEM OS CASOS NA REGIÃO DO ALTO SOLIMÕES

A transmissão de coronavírus em indígenas no Amazonas começou no dia 19 de março, quando o médico no Alto Solimões fez atendimento, contaminado pela doença, e trabalhou com profissionais de saúde: enfermeiros, técnicos em enfermagem e agentes indígenas de saúde.

Nova fronteira do contágio no oeste do Amazonas. (Foto: Divulgação)

Em 25 de março, após ter contato com o médico, uma agente de saúde indígena do povo Kokama testou positivo. A jovem de 20 anos teve contato com sete pessoas; três delas foram contaminadas, uma delas um bebê. Esse foi o primeiro caso de coronavírus em indígenas brasileiros.

Esse Dsei abrange 27 etnias, distribuídas em 236 aldeias, numa área de 79,4 mil quilômetros quadrados, com uma população de 70,8 mil pessoas.

O Brasil tem 34 Distritos Especiais de Saúde Indígena, responsáveis pelo atendimento a quase 800 mil indivíduos aldeados. Até o momento foram confirmados 120 casos por todo o Brasil. Mas os números divulgados diariamente pelo governo não refletem a realidade dos povos indígenas, pois não leva em consideração os que moram na cidade.

Enquanto o órgão contabiliza seis óbitos, organizações indígenas como a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia (Coiab) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) informam que já houve 18 óbitos entre os povos originários.

GOVERNO DIZ QUE PLANEJAMENTO COMEÇOU EM JANEIRO

O Plano de Contingência Nacional elaborado pela equipe técnica da Sesai, em conjunto com o Comitê de Operações de Emergências, traz orientações de como deve ser o atendimento aos indígenas com sintomas relacionados à Covid-19.

Segundo a secretaria, desde janeiro de 2020 foi elaborada uma série de documentos técnicos a serem adotados pelos povos indígenas, gestores e colaboradores para ajudar a prevenir, combater e tratar a infecção pelo novo coronavírus.

Isso ocorreu antes que a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretasse a Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional, no dia 30 de janeiro. A pandemia foi decretada no dia 11 de março.

O plano de contingência traz orientações às Equipes Multidisciplinares de Saúde Indígena e pede que os Agentes Indígenas de Saúde e Agentes Indígenas de Saneamento também recebam as informações, para que possam ajudar na conscientização da comunidade sobre as medidas de prevenção e controle da doença.

“O Ministério da Saúde continua empenhado em manter a proteção dos povos indígenas brasileiros por meio do trabalho das Equipes da Secretaria Especial de Saúde Indígena”, sustenta a Sesai, “seguindo o preconizado no Plano Nacional de Contingência”.

Foto principal: Carlos Eduardo Ramirez/Agência Brasil

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