Gigantes dos agrotóxicos são principais financiadores de Congresso Brasileiro do Agronegócio

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Bayer e FMC patrocinam evento que terá a presença dos ministros da Agricultura, da Infraestrutura e do presidente do BC; pesquisa da ONG suíça Public Eye e do Greenpeace mostra Brasil como principal consumidor de produtos altamente tóxicos no campo

Por Leonardo Fuhrmann

Grandes empresas produtoras de agrotóxicos e uma organização ligada a elas estão entre os principais financiadores da 19ª edição do Congresso Brasileiro do Agronegócio, encontro organizado pela Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) e pela B3, que será transmitido online, em razão da pandemia de Covid-19, na manhã desta segunda-feira (03). Estão previstas as participações dos ministros da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina, da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, e do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

Tereza Cristina no congresso de 2019; em 2020, de volta. (Foto: Twitter)

As produtoras de agrotóxicos Bayer, que adquiriu a Monsanto, e FMC Agrícola estão entre os patrocinadores master. Fazem parte dessa lista a fabricante de sementes transgênicas Agroceres, a Mosaic Fertilizantes, a empresa de crédito Sicredi, o BB Seguros, a Empresa Maranhense de Administração Portuária (Porto do Itaqui) e a organização Croplife Brasil — que, por sua vez, representa empresas ligadas a agrotóxicos e transgênicos.

Entre os demais patrocinadores estão outras empresas do agronegócio, como as gigantes Cargill, New Holland e Case IH, a Yara, a Cooxupé, o Grupo Jacto e o Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (Inpev). O Inpev reúne dezenas de empresas do agronegócio e algumas de agrotóxicos, como Adama, Basf, Dow, Bayer e Croplife. A lista de patrocinadores é completada por empresas do setor financeiro: Bradesco, Itaú BBA, Rabobank e CME Group, a Bolsa de Chicago.

Os ministros Tereza Cristina e Tarcísio Freitas participam da mesa de abertura, logo às 9 horas, ao lado do presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Alceu Moreira (MDB-RS), e de representantes da Abag, da B3 e do secretário da Agricultura e do Abastecimento do Estado de São Paulo, Gustavo Junqueira. O primeiro painel de debates, às 9h45 terá, entre outros, o presidente da Cargill no Brasil, Paulo Sousa. O segundo, às 11 horas, terá um depoimento do presidente do Banco Central, com comentários do diretor de Agronegócios do Itaú BBA.

Alceu Moreira esteve entre os parlamentares que pressionaram, nos últimos meses, pela liberação do paraquat, um agrotóxico proibido na União Europeia: “Veja como estes líderes ruralistas pressionaram por liberação de agrotóxico banido“.

CROPLIFE FAZ LOBBY MUNDIAL PARA EMPRESAS DO SETOR

A Croplife Brasil foi criada em outubro do ano passado e é presidida por Christian Lohbauer, ex-vice-presidente de Assuntos Corporativos da Bayer Brasil. Fundador do Partido Novo, Lohbauer foi vice na chapa de João Amoedo na eleição presidencial de 2018 e é um nome especulado pelo partido para a disputa da eleição municipal da capital paulista neste ano.

Lohbauer também foi, segundo seu currículo oficial, gerente de Relações Internacionais da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), diretor executivo da Associação Brasileira dos Exportadores de Frangos (Abef) e presidente executivo da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR). Atualmente, é diretor do Conselho de Agricultura da Fiesp (Cosag/Fiesp) e sócio da Lohbauer Consultoria Internacional.

A Bayer e a FMC participam da Croplife Brasil, assim como a Syngenta, a Basf, e outras trinta empresas ligadas à produção e comercialização de produtos químicos e transgênicos para a agropecuária. A filial brasileira é associada da Croplife International, uma organização conhecida mundialmente por fazer lobby para as grandes empresas do setor.

Basf, Bayer, Corteva (do grupo DowDuPont), FMC, Sumitomo Chemical e Syngenta são as empresas que fazem parte da Croplife, a matriz, que reúne também organizações empresariais regionais e é coordenada por um executivo da Bayer. A Croplife Brasil e a Associação das Empresas de Biotecnologia na Agricultura e Agroindústria (AgroBio) fazem parte da organização estrangeira.

A Croplife Latin America representa a Bayer CropScience, a FMC, a Syngenta, a Basf e a Sumitomo Chemical. Ela é presidida por José Perdomo, que trabalhou durante 28 anos na Dupont. A primeira prioridade da organização é “promover e apoiar as leis que, com critérios científicos, regulem os marcos legais que forneçam respeito pela propriedade intelectual, os quais devem ter relação com os acordos internacionais para a proteção das culturas, a biotecnologia, produtos biológicos e novas tecnologias”.

SYNGENTA, BAYER, BASF, CORTEVA E FMC VENDEM 80% DOS VENENOS

Protesto da Public Eye em Berna, na Suíça. (Foto: Divulgação/Public Eye)

O interesse dos grandes produtores globais de agrotóxicos pelo encontro brasileiro não é por acaso. Uma investigação feita pela Unearthed, divisão de jornalismo investigativo do Greenpeace britânico, e pela ONG suíça Public Eye mostrou que o Brasil é o maior consumidor de pesticidas classificados como seriamente perigosos para a saúde ou o ambiente.

O estudo, divulgado em fevereiro, levou em conta as vendas no mercado global desses produtos em 2018, antes mesmo do governo Bolsonaro, que tem adotado uma política agressiva de liberação de agrotóxicos e de redução de barreiras a sua aplicação. Dois terços desse total foram adquiridos para a monocultura de soja, principal commodity brasileira no mercado internacional, em boa parte utilizada para a produção de ração animal.

As ONGs fizeram sua investigação a partir de dados da Phillips McDougall, uma das principais empresas globais de inteligência que atuam no setor de agropecuária. A empresa identificou que o mercado dos pesticidas altamente perigosos movimentou US$ 9,9 bilhões naquele ano. Deste total, US$ 2,2 bilhões foram adquiridos pelo mercado brasileiro. Destacam que o consumo do agronegócio brasileiro deve ser ainda maior, pois a empresa conseguiu monitorar apenas metade do mercado nacional de agrotóxicos.

Ainda segundo a pesquisa, apenas cinco empresas foram responsáveis por 80% das vendas de agrotóxicos no país e 75% das vendas dos altamente tóxicos. São elas as cinco gigantes do setor: Syngenta, Bayer, Basf, Corteva e FMC. Todas integrantes da Croplife international e de sua filial brasileira. Destaca ainda que muitos desses agrotóxicos altamente perigosos têm o uso proibido no país de origem dessas empresas, mesmo que seja produzido lá.

A geógrafa Larissa Mies Bombardi, autora da publicação Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia, afirma que, apesar de ter uma política rigorosa para o uso de agrotóxicos em seu território, a União Europeia não controla os produtos fabricados por empresas de seus países, como mostrou um estudo recente do Greenpeace da Alemanha.

Os agrotóxicos proibidos chegam a ser produzidos em território europeu e exportados para países com legislação mais permissiva, caso do Brasil. Nas regiões em que são utilizados, esses venenos causam danos à saúde das pessoas, contaminação da água e do solo e desequilíbrio ambiental, como a mortandade de abelhas no Rio Grande do Sul.

GIGANTES DA IMPRENSA BRASILEIRA APOIAM EVENTO

O Congresso Brasileiro do Agronegócio tem o apoio institucional de 32 publicações da imprensa especializada, entre elas dois veículos ligados aos maiores grupos empresarias do Brasil: o Valor Econômico, das Organizações Globo, e o terraviva, da Rede Bandeirantes.

O jornalista William Waack será o moderador dos três painéis do encontro. Ele já havia participado do congresso em anos anteriores. Atualmente na CNN Brasil, Waack foi demitido da Rede Globo em 2017, depois da divulgação de um vídeo em que ele faz um comentário racista a um entrevistado em uma conversa fora do ar.

| Leonardo Fuhrmann é repórter do De Olho nos Ruralistas |

Foto principal (Nacho Lemus/Telesur): protesto do MST na sede da Bayer, em São Paulo, em 2019

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