Indicado para comandar CPI da Covid, senador compartilha com filhos 01 e 03 do presidente a simpatia pelo projeto que legaliza os chamados resorts integrados no Brasil; político do Centrão é membro da FPA e evita criticar gestão da pandemia pelo governo
Por Mariana Franco Ramos
O futuro presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), de 62 anos, é membro da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) e o típico político do Centrão, com votações ora favoráveis e ora contrárias ao Palácio do Planalto. Apesar de se dizer independente e de criticar o negacionismo do presidente, o senador costuma relativizar os erros do governo na condução da pandemia. Em um tema, porém, ele tem alinhamento total com o clã Bolsonaro: a defesa da legalização dos cassinos.
Em setembro, Aziz esteve com os filhos 01 e 03 do presidente no evento que marcou a reabertura do turismo em Manaus, a convite do governador Wilson Lima (PSC). Na ocasião, os três falaram sobre o interesse de investidores internacionais nos chamados resorts integrados.
Segundo Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), o turismo de natureza é “cobiça mundial”. “O que nós ouvimos em Las Vegas é que há um grande interesse que estes grandes players do turismo invistam pesado nessa área em estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Amazonas”, afirmou. “O sonho de muitos deles é vir para um equipamento aqui em Manaus ou próximo daqui, porque o turismo de natureza é uma das coisas que mais incentivam o turismo internacional”.
O projeto de lei 4.495/2020, que trata do tema, foi apresentado pelo senador Irajá Abreu (PSD-TO), correligionário de Aziz. “A legalização dos jogos de cassino dentro dos Resorts Integrados, seguida de um processo de concessão para exploração, atrairá grandes investidores para o mercado de turismo brasileiro, dinamizando a atividade econômica em todas as regiões do Brasil”, escreveu o autor, na justificativa.
Aziz disse que a presença de Flávio e Eduardo em Manaus é “uma interlocução que nós precisamos com o presidente da República para preservar as conquistas que temos”. Ele enalteceu o fato de Bolsonaro, como deputado federal, ter apoiado a Zona Franca de Manaus (ZFM): “O presidente sempre esteve ao lado da Zona Franca de Manaus. Enquanto deputado, votou à favor da ZFM e não é agora, como presidente, que vai nos prejudicar”.
No mesmo evento, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) defendeu a recuperação da BR-319 pelo governo federal e falou que não faz sentido afastar o Amazonas do resto do país. “Preservar não é isolar”, comentou. Ele afirmou que o governo Bolsonaro quer integrar a nação. “Não faz sentido deixar os senhores longe do resto do país”.
As obras são apontadas por ambientalistas e cientistas como uma das mais graves ameaças para a preservação da maior floresta tropical do mundo, como mostrou reportagem de O Eco. Além disso, a estrada é considerada um risco para a sobrevivência de dezenas de comunidades indígenas que têm suas terras no entorno.
DOADORA DE CAMPANHA, FARMACÊUTICA FATUROU R$ 36 MI COM GOVERNO DO AM
Omar Aziz entrou na política em 1990, como vereador de Manaus. Depois, foi deputado estadual, vice-prefeito, vice-governador e governador do Amazonas, até chegar ao cargo de senador, em 2014. Quatro anos depois, ele tentou voltar ao governo, mas ficou em quarto lugar. O vencedor foi Wilson Lima (PSC-AM), que hoje é seu aliado.
Na campanha ao Senado, Aziz recebeu R$ 4,4 milhões em doações de pessoas físicas e jurídicas, conforme o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Dentre as doadoras está a Grande Moinho Cearense, atuante no mercado de moagem de trigo, com R$ 124,9 mil. A empresa, que produz a “Farinha Dona Maria”, faz parte da holding Jereissati Participações S.A, controlada por Carlos Francisco Ribeiro Jereissati. Ele também detém o Iguatemi Empresa de Shopping Centers e a Oi.
Outro doador foi o Grupo Tapajós, que engloba as Drogarias Santo Remédio, as Farmácias Flexfarma, Farmabem e a Distribuidora Tapajós, com R$ 250 mil. A companhia faturou mais de R$ 36 milhões em negócios com o governo do Amazonas entre 2010 e 2016, segundo números disponíveis no Portal da Transparência do Estado, principalmente com venda de medicamentos para as unidades hospitalares da capital e do interior.
De acordo com reportagem do jornal Impacto, a distribuidora foi acusada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pela Justiça Federal de indícios de irregularidades na aquisição e na distribuição de remédios pela Central de Medicamentos do Governo do Estado do Amazonas (Cema), nos períodos de 2003 e 2005, durante os quais houve repasse de recursos federais.
O TCU determinou a citação dos responsáveis para que restituíssem os valores. A empresa vende medicamentos para a Secretaria de Estado da Saúde, a Cema, o Hospital e Pronto-Socorro 28 de Agosto e o Hospital e Pronto-Socorro Dr. João Lúcio.
GESTÃO DE AZIZ FOI ALVO DE SUSPEITAS DE DESVIOS NA SAÚDE
Omar Aziz foi governador do Amazonas de 2011 a 2014. Durante sua gestão, ele respondeu a uma investigação sobre irregularidades e suspeitas de desvios na área de saúde, justamente o assunto a ser investigado na CPI da Covid. As suspeitas são de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
A esposa do senador, Nejmi Aziz, três irmãos dele e um ex-chefe de gabinete chegaram a ser presos, em 2019. O nome de Aziz e de pessoas ligadas a ele surgiram na quinta fase da Operação Maus Caminhos, deflagrada em 2016. O desdobramento foi batizado de Operação Vertex.
Conforme as apurações, um grupo que desviava recursos por meio de contratos firmados com o governo para a gestão de unidades de saúde. O Ministério Público Federal (MPF) estima que ao menos R$ 100 milhões tenham sido desviados.
Os autos chegaram a ser encaminhados ao Supremo Tribunal Federal (STF), uma vez que Aziz é senador, mas, diante do novo entendimento da corte sobre foro privilegiado, em junho de 2018 retornaram à Justiça Federal do Amazonas. Ainda não há uma decisão.
O político nega participação em qualquer tipo de irregularidade. “Sobre a referência ao nome do Senador Omar Aziz citado no relatório da Polícia Federal de 2019, nos autos da Operação Vertex, é importante esclarecer para a sociedade que não foi produzida prova alguma ou nem mesmo apresentado indício de ligação de Omar Aziz com qualquer atividade delituosa”, afirma, em nota.
‘SÃO PAULO, POR ACASO, ESTÁ VIVENDO UM MAR DE ROSAS?’
Antes de assumir o posto na CPI, Omar Aziz minimizou a atuação de Jair Bolsonaro no enfrentamento da pandemia. “Não tem governo, seja de direita, centro ou esquerda, que não tenha cometido equívocos nessa pandemia”, comentou, em entrevista ao Estadão/Broadcast Político.
O político disse que em todos os Estados acontecem mortes. “O João Doria é 100% contrário ao pensamento do Bolsonaro”, argumentou. “São Paulo, por acaso, está vivendo um mar de rosas?”. Ele falou ainda que não pretende transformar a comissão em uma “fritura” para o chefe do Planalto. Mais de 390 mil pessoas já morreram no país em decorrência da Covid e da forma como o governo federal conduz as ações.
Na última sexta-feira (23), em visita a Manaus, Bolsonaro recebeu do governador Wilson Lima (PSC) o título de cidadão amazonense. Proposta pelo deputado estadual Delegado Péricles (PSL),a honraria foi aprovada por 13 dos 24 membros da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam), em regime de urgência.
Conforme a lista divulgada pela Aleam, Nejmi Aziz, esposa de Omar Aziz, votou a favor do PL. No dia seguinte à divulgação da honraria, em 21 de abril, Nejmi divulgou uma nota à imprensa dizendo que estava ausente do plenário naquele momento e negou que tenha sido favorável ao título.
Em janeiro, mais de quarenta pessoas morreram no estado por falta de oxigênio nos hospitais públicos. “Não é competência nossa levar e nem atribuição nossa, levar o oxigênio para lá”, declarou Bolsonaro, à época. O ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que esteve com ele na visita, é acusado de ter sido omisso na crise.
| Mariana Franco Ramos é repórter do De Olho nos Ruralistas. |
Foto principal (Reprodução/Facebook): senador minimizou a atuação de Bolsonaro no enfrentamento da pandemia