Justiça suspende processo de demarcação no Paraná um dia após atentado contra indígena

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Decisão de desembargador paralisa por 90 dias a demarcação de terras Avá-Guarani, em Terra Roxa e Guaíra, palco de atentado contra indígena de 21 anos; em Santa Catarina, aldeia sofre tentativa de invasão

Por Leonardo Fuhrmann

O desembargador federal Candido Alfredo Leal Junior, do Tribunal Regional Federal da 4a Região (TRF-4), concedeu uma liminar na quarta-feira (07/11) à Federação Agrícola do Estado do Paraná (Faep) para suspender, pelo prazo de 90 dias, o processo de demarcação de terras dos indígenas Avá-Guarani nos municípios de Terra Roxa e Guaíra, no Oeste do estado. A alegação da entidade ruralista é que a Fundação Nacional do Índio (Funai) ainda não havia notificado os ocupantes das áreas a serem demarcadas e que há índios na região com cidadania brasileira e paraguaia, o que afetaria a soberania nacional.

A decisão do desembargador se baseia no suposto descumprimento de uma medida cautelar de 2016, que obrigava a Funai a informar à Faep sobre a relação de propriedade que seriam afetadas. Foram apresentados à Faep mapas da região do estudo nesta fase. No entanto, a Funai publicou no dia 15 de outubro o relatório que anunciava a demarcação das terras indígenas na região dos dois municípios, listando 165 áreas dentro de território tradicional, com o nome de seus ocupantes. Eles teriam, a partir da divulgação, um prazo de 90 dias para apresentar suas defesas administrativas.

O estudo coordenado pela antropóloga Marina Vanzolini Figueiredo identificou uma área de aproximadamente 24 mil hectares, dividida em duas glebas e áreas de ilhas que poderiam abrigar uma população indígena estimada em 1.360 pessoas. Segundo a Faep, nesta área estão 172 propriedades rurais legalizadas e produtivas.

TIROS EM GUAÍRA

Donecildo Agueiro após o atentado. (Foto: Acervo Pessoal)

O desembargador anunciou sua decisão um dia após o atentado contra o indígena Avá-Guarani Donecildo Agueiro, de 21 anos, do Tekoha Tatury. Ele foi baleado depois de sair de reunião da Coordenação Técnica Regional da Funai, que tratava dos processos de licenciamento de duas linhas de transmissão que passam em Guaíra, com estudos ambientais iniciados.

Logo após o atentado, o cacique do Tekoha Y’Hovy afirmou ao Conselho Indigenista Missionário (Cimi) que o cenário de violência enfrentado pelos indígenas em Guaíra é crítico e se acentuou desde 2012. Segundo ele, um grupo de fazendeiros estimula, ainda mais, a violência contra os povos indígenas na região:

– Esse grupo tem função única e exclusiva de intimidar e acuar, ainda mais, as comunidades indígenas da região. O que implica, também, no aumento dos casos de violência praticados contra esses povos. Não sabemos mais para quem pedir socorro. A Funai até ajuda, mas não tem pode avançar em situação de violência. A atuação do MPF contribuiu para amenizar os casos de violência, mas não extinguiu de fato.

GENTE CIVILIZADA

Os prefeitos Heraldo Trento (Guaíra) e Altair de Pádua (Terra Roxa). (Foto: Reprodução)

No dia 15 de outubro, quando a Funai anunciou a atual fase do processo de demarcação, os prefeitos de Guaíra, Heraldo Trento (DEM), e de Terra Roxa, Altair de Pádua (PSC), divulgaram um vídeo sobre as demarcações. Nele, Trento pedia para a população das duas cidades não promover atos de preconceito, constrangimento ou violência contra os indígenas, pois são “gente civilizada”. Ele explicava que os municípios e os fazendeiros seriam chamados a se manifestar sobre as demarcações. “A decisão não é uma demarcação definitiva ainda”, disse.

Pádua, que é dono de 32 hectares na região, além de sócio de outros 14 hectares, segundo sua declaração de bens à Justiça Eleitoral na eleição de 2016, pediu calma aos ocupantes de terra. “Nada está perdido. Tudo isto é um estudo que pode ser revertido”, afirmou.

Estudo da Funai mostra que a região era ocupada por indígenas desde o século XVI. Após o fim da Guerra do Paraguai, a região foi concedida para cultivo de erva-mate por uma empresa multinacional, que explorava a mão-de-obra indígena. O avanço dos brancos sobre o território indígena começou nos anos 1930 e se intensificou nos anos 1970, época da construção da hidrelétrica de Itaipu. “Comunidades indígenas inteiras são assassinadas e atiradas no Rio Paraná, famílias removidas à força para o Paraguai ou para outras terras indígenas no Paraná, e sua existência é negada por mecanismos diversos, como a acusação de serem estrangeiros. Até o presente, momento não houve nenhum tipo de medida efetiva para compensar e mitigar os impactos da construção da hidroelétrica para os Avá-Guarani da região de Guaíra e Terra Roxa. Apesar do incontável número de pessoas mortas ou expulsas da região, seja por remoção direta, fuga, ou busca de direitos de cidadania, parte significativa da população Avá-Guarani do oeste do Paraná segue buscando estratégias para permanecer em seu território”, afirma o relatório.

AMEAÇA NO LITORAL CATARINENSE

A cacique Eliara, da aldeia Yaka Porã, na terra indígena Morro dos Cavalos, em Palhoça (SC), afirmou que um grupo de homens brancos chegou à tribo pela mata, na madrugada da quinta-feira (08/11), e tentou invadir sua casa. Segundo a indígena, eles deixaram o local sem fazer nada, por causa do barulho feito pelos cachorros. Os guaranis da região vivem momentos de tensão. Em novembro do ano passado, houve um ataque simultâneo a tiros em três diferentes partes do território. Reconhecida desde 2008 pela Funai, a terra ainda não foi homologada.

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