“Carne Fraca”: políticos ruralistas indicam quem fiscaliza sua comida

In Bancada Ruralista, De Olho na Política, Em destaque, Governo Temer, Principal, Últimas
Superintendente na Bahia é afilhado de Geddel (Foto: Arquivo/Agência Brasil)

Superintendente de AL é afilhado político de Renan Calheiros; o da BA, de Geddel Vieira Lima; indicação no MT, em 2015, revoltou servidores

Por Alceu Luís Castilho

Políticos como o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), Romero Jucá (PMDB-RR) e Geddel Vieira Lima (PMDB-BA) indicaram os superintendentes de Agricultura em seus estados. Tanto o superintendente em Alagoas como o da Bahia são afilhados políticos desses parlamentares, que pertencem à bancada ruralista no Congresso e dominam os partidos em seus estados.

De Olho nos Ruralistas complementa informações divulgadas pelo Estadão nesta quarta-feira (22/03): “Indicação política é maioria em cargos de superintendência na Agricultura“. Os repórteres Leonêncio Nossa e Lu Aiko Otta mostram que o PMDB, com dez indicações, o PP (cinco), o PSDB (duas), PTB e PR controlam as Superintendências de Agricultura, Pecuária e Abastecimento pelo país.

Isso significa que a carne que chega à sua mesa ganha um tempero político na fiscalização. A Operação Carne Fraca – deflagrada na sexta-feira pela Polícia Federal – não flagrou somente carne vencida e outras irregularidades em frigoríficos, mas também um esquema de corrupção que envolvia, segundo a PF, assessores de políticos.

O observatório constata também que alguns superintendentes são, eles mesmos, pecuaristas.

CARDÁPIO RURALISTA

O superintendente na Bahia, Osanah Setúval, é afilhado político dos irmãos Geddel Vieira Lima (PMDB), ex-ministro do governo Temer demitido após denúncia do ex-ministro da Cultura, e Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), deputado federal. Ambos são pecuaristas e latifundiários: cada um possui mais de 8 mil hectares em terras. Setúval preside o diretório do PMDB em Juazeiro.

PMDB de Calheiros indicou superintendente em AL (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Em Alagoas, o superintendente Alay Correia não somente foi indicado pelo PMDB. Ele é afilhado político do senador alagoano Renan Calheiros, que presidiu o Senado duas vezes nos últimos anos, lidera o PMDB no Senado e é um dos principais caciques da sigla. O clã dos Calheiros domina o PMDB em Alagoas. Correia foi prefeito de Taquarana.

Outro político de peso do PMDB que domina o partido em seu estado é o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). Pois foi exatamente o PMDB que indicou o superintendente em Roraima, Plácido Alves. Ele é sobrinho do ex-deputado federal Luis Barbosa Alves (PTB, PPB, PFL). Em 2015, Plácido comemorou a liberação de R$ 850 mil, pelo Ministério da Agricultura, para combater a praga da mosca da carambola, “atendendo pleito de Jucá“.

PMDB de Jucá indica chefe de fiscais em RR (Foto: Agência Brasil)

 

O superintendente na Paraíba, Lucio Aurelio Braga Matos, chegou a ser exonerado do cargo em março do ano passado, pela presidente Dilma Rousseff, após rompimento com o PMDB. Mas voltou ao cargo no governo Temer. Pecuarista, candidato a prefeito de Sousa pelo PPS em 2008, ele foi indicado pelo deputado federal Hugo Motta (PMDB-PB).

PECUARISTAS E FISCAIS

O pecuarista Rodrigo Rochael Guerra é o chefe dos fiscais da carne no Tocantins. O superintendente foi presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Araguaína. Assumiu o cargo em julho de 2016, quando o presidente Michel Temer ainda era interino. Substituiu um indicado pela ex-ministra Kátia Abreu (PMDB-TO). Ele é filho de Rubens Vieira Guerra, que foi secretário de Infraestrutura no governo de Siqueira Campos (PMDB). Outra indicação do PMDB.

Em Sergipe, o superintendente José Everaldo de Oliveira, mais um indicado pelo PMDB (com provável bênção do PSC), foi deputado federal entre 1991 e 1995. Em 1998 ele declarou possuir 231 cabeças de gado e quatro terras rurais em Poço Verde, onde foi prefeito por duas vezes. O prefeito atual, o pecuarista Iggor Oliveira (PSC), é seu filho. Oliveira tomou posse no cargo em outubro, com a presença do senador Eduardo Amorim (PSC).

O produtor rural Márcio Kangussu, indicado pelo PSDB para a superintendência de Minas Gerais, foi deputado estadual pelo partido entre 1999 e 2007. Em 1998 ele declarou quatro fazendas à Justiça Eleitoral. O senador Aécio Neves (PSDB-MG) governou o estado entre 2003 e 2010.

A superintendente no Amapá, Lilia Suely Collares de Souza, também foi indicada pelo PSDB. Ela trabalhou como assessora parlamentar do ex-senador Papaléo Paes (PSDB-AP), que ficou no cargo entre 2003 e 2011. Paes é hoje vice-governador do Amapá, pelo PP. Ela foi secretária de Desenvolvimento Econômico de Macapá, na gestão do atual prefeito Clécio Luís (Rede).

INDICADO PELO PP DE MAGGI

A reportagem do Estadão conta que o ministro da Agricultura, o produtor de soja Blairo Maggi, nomeou o superintendente afastado no Paraná, Gil Bueno de Magalhães, indicado pelo PP. E que o superintendente afastado em Goiás, Júlio Cesar Carneiro, foi indicado pelo PTB. Faltou enfatizar que o PP é o partido do ministro.

De Olho nos Ruralistas observa que o superintendente do Mato Grosso (e não MG, como está no jornal), José de Assis Guaresqui, também pertence ao partido do ministro. Ele foi vice-prefeito de Cáceres e secretário de Esportes no governo Silval Barbosa (PMDB). Sua nomeação, em 2015, revoltou servidores do órgão. Eles protestaram contra a demissão de um fiscal de carreira e sua falta de vínculo com o setor.

A Operação Carne Fraca também investiga políticos, como o chefe de gabinete do deputado Sérgio Souza (PMDB-PR). Um diretor do Ministério da Integração Nacional foi preso na sexta-feira, por causa de suas atividades como chefe da Assessoria Parlamentar do Gabinete do Ministério da Agricultura: “‘Carne Fraca’: número 1 na lista de prisões, diretor do Ministério da Integração Nacional é demitido“.

PODERES REGIONAIS

O Estadão informa ainda que o superintendente do Acre foi indicado pelo senador Gladson Camelli (PP-AC). E que o superintendente no Piauí foi indicado pelo PR. Aqui pode haver um ruído: Marco Aurélio Paes Landim, no cargo desde 2011, pertence a um tradicional clã político de São João do Piauí, no qual se destaca seu tio, o deputado federal José Francisco Paes Landim (PTB-PI).

O presidente do PTB no Rio Grande do Norte, Getúlio Batista da Silva Neto, é o superintendente do Ministério da Agricultura no estado. Mas também foi indicação do PMDB. Ele foi secretário da Habitação em Natal, indicado pelo deputado Walter Alves (PMDB-RN), mais um de uma tradicional oligarquia nordestina: é filho do senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), por sua vez primo do ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB).

You may also read!

Vídeo mostra como mercado, imprensa, Legislativo e Judiciário naturalizaram Bolsonaro

De Olho nos Ruralistas reúne informações e imagens sobre a ascensão do político patrocinada por empresários e jornalistas; omissão

Read More...

Proprietária que reivindica terras em Jericoacoara é sobrinha de governadores da ditadura

Tios de Iracema Correia São Tiago governaram o Ceará e o Piauí durante os anos de chumbo; os três

Read More...

Clã que se diz dono de Jericoacoara foi condenado por fraude milionária em banco cearense

Ex-marido de Iracema São Tiago dirigiu o Bancesa, liquidado por desviar R$ 134 milhões da União e do INSS

Read More...

2 commentsOn “Carne Fraca”: políticos ruralistas indicam quem fiscaliza sua comida

  • Pingback: “Carne Fraca”: políticos ruralistas indicam quem fiscaliza sua comida – De Olho nos Ruralistas – Campanha Permanente Contra os Contra os Agrotóxicos e Pela Vida ()

  • O fisiologismo político não pode mais existir. Os exemplos de fisiologismos, nocivos ao país, estão escancarados: Petrobras e agora a operação Carne Fraca expondo como agiam fiscais do Ministério da Agricultura, que pediam dinheiro e carne para não criar dificuldades ao funcionamento de frigoríficos e restaurantes.
    Parlamentar tem que exercer as suas atividades dentro do Parlamento votando as leis do país e fiscalizando o Executivo. Fora disso é desvio de finalidade, é advocacia parlamentar para defender interesses corruptos no toma lá, dá cá, porque inexiste favor político sem a contrapartida, que pode ser a propina em forma de dinheiro para si, em contribuição para campanha política e pode ser até em caixas de picanha e hambúrguer.
    O custo do Brasil sujo pode ser atestado, por exemplo, no diálogo captado pela Polícia Federal, em que André e Roney, diretores da BRF, uma das empresas investigadas na Operação Carne Fraca, discutem uma tentativa de extorsão promovida pelo fiscal Dinis, apadrinhado no cargo pelo deputado Jovair Arantes, do PTB de Goiás.

Leave a reply:

Your email address will not be published.

Mobile Sliding Menu