Ex-bilionário, primos do vice-presidente da Fiesp e duas empresas ligadas à multinacional da mineração estão entre os maiores autuados nos últimos 25 anos nos dezesseis municípios que compõem o bioma; Corumbá foi um dos epicentros da destruição
Por Leonardo Fuhrmann
Nomes conhecidos do capitalismo brasileiro estão na lista dos maiores multados pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) por desmatamento no Pantanal: uma empresa do empresário Eike Batista, frequentador de colunas sociais e ex-bilionário; a agropecuária dos primos do primeiro vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Benjamin Steinbruch; e duas empresas da Vale, a responsável por duas barragens de rejeitos de mineração que romperam em Minas Gerais: Mariana, em 2015, e Brumadinho em 2019.
O observatório conta desde ontem, na série De Olho no Pantanal, quais os maiores multados pelo Ibama no bioma desde 1995. A série começou apostando o recordista de multas: “Empresa ligada a BTG Pactual e André Esteves foi quem mais devastou Pantanal, segundo Ibama“.
Em 2008, Eike Batista era um empresário de sucesso e em ascensão, que não escondia suas metas: se tornar o homem mais rico do planeta. Foi nesse mesmo ano que uma das empresas de Eike, a MMX Metálicos Corumbá, recebeu uma multa de R$ 15.225.390 por desmatamento em Corumbá (MS), na fronteira com Paraguai e Bolívia, uma das capitais da pecuária no Brasil.
É a segunda maior multa por desmatamento do Pantanal da série histórica de 25 anos. A primeira é a da BRPec, ligada ao BTG Pactual, banco comandado por André Esteves, também no município de Corumbá. Com o Pantanal em chamas, em 2020, De Olho nos Ruralistas mostra quem são os maiores destruidores do bioma ao longo da história. O levantamento tem como base as multas por devastação da flora aplicadas pelo Ibama.
EMPRESÁRIO ERA CANDIDATO A MAIS RICO DO MUNDO
A MMX Metálicos era parte de um império em ascensão. No ano seguinte à multa, em 2009, Eike Batista já era o homem mais rico do Brasil. Em 2012, estava entre os dez mais ricos do mundo, conforme o ranking elaborado pela agência Bloomberg. No ano anterior, segundo a Forbes, era o oitavo mais rico do mundo. Depois disso veio uma queda vertiginosa, que incluiu sua prisão durante a operação Lava Jato, acusações de sonegação fiscal e de extração ilegal de ouro no Amapá.
Com a derrocada de seus negócios a partir de 2013, ano das primeiras denúncias, muitas empresas foram vendidas e outras entraram em recuperação judicial, como a MMX e a OSX, que permanecem em nome de Eike.
Em junho deste ano, o empresário foi condenado também a oito anos de prisão por manipulação do mercado financeiro. Nos outros casos, ele fechou um acordo de delação premiada. Com dívidas e condenações judiciais, Eike tem investido na reestruturação de suas empresas.
Em 2017, o observatório mostrou a face ambiental do empresário:
EXECUTIVO DA VALE É RÉU POR ROMPIMENTO DE BARRAGEM
Também em Corumbá, a Urucum Mineração recebeu uma multa de R$ 3.428.624 em janeiro de 2006. Do mesmo grupo, a Mineração Corumbaense Reunida recebeu uma multa de R$ 1.000.000. A empresa faz parte do grupo Vale e tinha como presidente Silmar Magalhães Silva. Ele se tornou depois o diretor do Corredor Sudeste da Vale, cargo que ocupava na época do rompimento da barragem de Brumadinho (MG), em janeiro de 2019.
O maior crime ambiental da história do país contaminou o Rio São Francisco e causou a morte de 259 pessoas. Outras onze permanecem desaparecidas. É um número de mortos superior ao de tragédias como o incêndio da boate Kiss (245 mortos, em 2013), em Santa Maria (RS), a queda do voo 3054 da TAM (199 mortos, em 2007), em São Paulo, a queda do voo 1907 da Gol (153 mortos, em 2006), na Serra do Cachimbo (MT) e o incêndio do Edifício Joelma (187 mortos, em 1974), em São Paulo.
Silva foi um dos indiciados no caso. Segundo as investigações, ele participou de um painel com especialistas internacionais que discutiu a questão da segurança em barragens da Vale, entre elas a que se rompeu em Brumadinho. No Senado, divulgou-se que ele recebeu uma mensagem de outra funcionária da empresa que alertava para a necessidade de “mais investigação e monitoramento de campo” para reduzir risco atual na barragem.
A denúncia contra ele e outros quinze envolvidos no caso foi aceita pela Justiça em fevereiro. Eles respondem 270 vezes por homicídio qualificado e crimes contra fauna, flora e crime de poluição. Em razão da investigação, todos foram afastados dos cargos na empresa. A Urucum tem em Corumbá duas barragens de rejeitos de minério com alto risco de rompimento, segundo o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). Ao todo, a empresa mantém catorze dessas barragens no Pantanal.
Antes de Brumadinho, a Vale já tinha sido responsável pelo rompimento da barragem de Fundão, da Samarco, em Mariana (MG). A Samarco é uma sociedade da multinacional brasileira com a anglo-australiana BHP Billiton. O rompimento causou a morte de dezenove pessoas e os rejeitos contaminaram o Rio Doce, com consequências sociais e ambientais que chegaram ao litoral do Espírito Santo.
De Olho nos Ruralistas contou no ano passado quem são os principais sócios da multinacional: “Bradesco, Mitsui, BNDES, fundos de pensão: saiba quem são os donos da Vale“.
AGROPASTORIL MULTADA PERTENCE À FAMÍLIA STEINBRUCH
Multada em R$ 2.440.000, em agosto de 2005, em Itiquira (MT), a Itacumbi Agrícola e Pastoril está registrada em nome de Leo, Fabio e Clarice Steinbruch. Fabio morreu em 2012. Eles são filhos de um dos fundadores do Grupo Vicunha e primos de Benjamin Steinbruch, primeiro vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), atualmente licenciado do cargo.
A família Steinbruch é a principal acionista da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), privatizada em 1993. A CSN atua nos setores de siderurgia, mineração, logística, cimento e energia e é uma das principais multinacionais brasileiras. Eles são donos ainda do Banco Fibra. Leo e Clarice estão rompidos com Benjamin por conta de uma disputa pelo controle acionário do grupo.
Procurada, a Vale não se manifestou. A reportagem tentou contato com a MMX e os multados da família Steinbruch, sem sucesso.
| Leonardo Fuhrmann é repórter do De Olho nos Ruralistas |
Foto principal (Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil): uma face menos conhecida de Eike Batista
LEIA MAIS:
Empresa ligada a BTG Pactual e André Esteves foi quem mais devastou Pantanal, segundo Ibama