Apesar do apoio da FPA, Bolsonaro diz pouco sobre o setor agropecuário e ataca a China, maior comprador de soja; o petista fala em estimular agricultura de baixo carbono e cortar crédito para práticas ofensivas ao ambiente
Duas páginas. Esse é o espaço dedicado à economia rural no plano de governo de Jair Bolsonaro (PSL). Sem apresentar nenhuma proposta específica, o capitão reformado resume seu programa para o setor agropecuário (que ele restrnige à agricultura) em um único ponto: reunir todas as instituições de fomento e extensão rural em uma única pasta.
A pouca atenção dada ao setor no plano de governo de Bolsonaro não foi empecilho para que recebesse apoio da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), ainda no primeiro turno. A carta entregue a Bolsonaro pela presidente da entidade, a deputada reeleita Tereza Cristina (DEM-MS), tampouco lista demandas do setor. Segundo o documento, a justificativa para a aliança seria “evitar que candidatos ligados à esquemas de corrupção e ao aprofundamento da crise econômica brasileira retornem ao comando do nosso País”.
Fernando Haddad (PT) dedica um espaço maior para a economia rural. O petista destaca a importância do setor agropecuário para a economia brasileira e defende uma revisão do crédito rural, impedindo excessos e cortando o financiamento para “práticas produtivas ofensivas ao meio ambiente e aos direitos trabalhistas”, valorizando a agricultura de baixo carbono.
Hadda também propõe fomentar as exportações de produtos agrícolas com maior valor agregado por meio de estímulos fiscais, de modo a diversificar a atividade produtiva e reduzir a dependência do Brasil em relação ao mercado de commodities.
BOLSONARO QUER CONSOLIDAR MERCADOS, MAS ATACA A CHINA
O “super-ministério” da Agricultura de Jair Bolsonaro deverá reunir seis atribuições: política e economia agrícola (incluindo comércio); recursos naturais e “meio ambiente rural”; defesa agropecuária e segurança alimentar; pesca e piscicultura; desenvolvimento rural sustentável; e inovação tecnológica.
Na página seguinte, o candidato cita seis demandas para o setor, sem dizer quais políticas pretende implementar em cada área. São elas a segurança no campo, a “solução para a questão agrária”, a logística de transporte e armazenamento, “uma só porta” para atender as demandas do setor rural (possível referência ao conceito “one-stop-shop”, referente à integração administrativa), além de consolidar e abrir novos mercados.
Esta última demanda pode ser afetada pelo discurso de Bolsonaro. De acordo com a Reuters, os ataques do candidato do PSL à China, o principal parceiro comercial do Brasil, têm causado apreensão em Pequim e podem impactar as relações com o principal mercado do agronegócio brasileiro. Segundo a reportagem, o deputado teria caracterizado o governo chinês como “um predador que quer dominar setores cruciais da economia”.
Desde os anos 2000, a China se consolidou como maior comprador de soja do Brasil e figura entre os principais importadores de celulose e proteína animal. Além disso, a “guerra comercial” travada com os Estados Unidos deve aumentar a demanda da China pela soja brasileira. Em março, Bolsonaro já havia irritado autoridades chinesas ao realizar uma visita oficial a Taiwan, cuja independência não é reconhecida por Pequim.
HADDAD QUER MANTER FAMÍLIAS NO CAMPO
Além do fomento a produtos de maior valor agregado, o plano de governo de Fernando Haddad pretende implementar o Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural, priorizando a educação do campo, indígena e quilombola e oferecendo formação profissional dos jovens do campo, com o objetivo de aumentar a retenção da juventude no meio rural.
Entre as políticas para o agronegócio, Haddad também menciona ampliar a regulamentação do setor, visando a contenção no avanço da fronteira agrícola, sem especificar em quais regiões.
– O apoio do governo federal deve ser acompanhado da regulação do grande agronegócio para mitigar os danos socioambientais, impedir o avanço do desmatamento, assegurar o ordenamento da expansão territorial da agricultura de escala, corrigir as permissividades normativas, impedir excessos das subvenções públicas e subordinar sua dinâmica aos interesses da soberania alimentar do país.
Caso eleito, Haddad terá o desafio de reverter a herança negativa deixada por Dilma Rousseff. Se entre 2003 e 2012 o desmatamento na Amazônia caiu 83%, entre 2013 e 2016 aumentou 60%. Além disso, a expansão da fronteira do agronegócio rumo ao Matopiba – acrônimo para as últimas áreas nativas de Cerrado entre os estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – tem anulado os ganhos decorrentes da preservação da Amazônia.