Votação no Mato Grosso pode dar maioria à bancada ruralista no Senado

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Dos onze candidatos à vaga deixada pela cassação da senadora Selma Arruda (PSL), seis possuem ligação com o setor agropecuário; intervenção de Jair Bolsonaro nas eleições promove disputa entre políticos ruralistas

Por Bruno Stankevicius Bassi

Para os mato-grossenses, as eleições deste domingo (15/11) não decidem apenas os prefeitos e vereadores que comandarão os 141 municípios do estado. Junto à votação municipal, eles irão escolher um substituto para a vaga deixada pela senadora Selma Arruda (PSL), cassada em dezembro do ano passado após condenação por caixa 2 e abuso de poder econômico na campanha de 2018.

Cassação de Selma Arruda abre espaço para maioria ruralista no Senado. (Foto: Roque de Sá/Agência Senado)

Ignorada por boa parte da imprensa nacional, a votação suplementar do Mato Grosso terá um papel decisivo na composição do Senado. Isso porque, dos onze candidatos que disputam as eleições, seis estão direta ou indiretamente ligados ao agronegócio e tendem a engrossar as fileiras da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), que conta hoje com 39 das 81 cadeiras na câmara alta do Congresso.

Além do senador interino Carlos Fávaro (PSD), ex-presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja) e vice-governador entre 2015 e 2018, possuem ligação com o setor o ex-governador Pedro Taques (Solidariedade), o ex-presidente da FPA Nilson Leitão (PSDB) e o deputado José Medeiros (Podemos), além do “Rei do Porco” Reinaldo Morais (PSC) e do advogado Euclides Ribeiro (Avante).

Caso o vitorioso saia desta lista, o Senado terá, pela primeira vez desde a redemocratização, uma maioria ruralista já que, além dos membros efetivos da FPA, Simone Tebet (MDB-MS) e o ex-presidente da casa Renan Calheiros (MDB-AL), que já pertenceram à frente, costumam acompanhar os votos ruralistas em temas ligados ao setor.

FAVORITO NA DISPUTA, FÁVARO TEVE GESTÃO POLÊMICA NA SEMA-MT

Com 16% das intenções de voto, segundo pesquisa divulgada pela CNN, Carlos Fávaro leva vantagem na disputa para confirmar, até o fim de 2026, o assento que ocupa interinamente no Senado.

Fávaro recebe Bolsonaro em Sinop; ao fundo, Nabhan Garcia. (Foto: Assessoria)

O sojicultor emergiu como força política através do braço mato-grossense da Aprosoja, da qual se tornou presidente em 2012, após ter ocupado a vice-presidência nacional da associação em 2010. Lá, Fávaro aproximou-se do ex-governador Pedro Taques, hoje seu rival, sendo escolhido para assumir como vice da então chapa tucana que venceu as eleições de 2014.

No governo, ele acumulou a chefia da Secretaria de Meio Ambiente (Sema-MT) onde realizou mudanças para agilizar os processos de outorga de licenças ambientais. Em 2018, ele foi denunciado pelo Ministério Público do Mato Grosso (MP-MT) por ter agido para impedir a fiscalização do Parque Estadual Serra Ricardo Franco. À época, Fávaro negou as acusações e disse que outros inquéritos sobre o mesmo tema já tinham sido arquivados após a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o estado de Mato Grosso e a Promotoria de Justiça de Vila Bela da Santíssima Trindade.

Localizado na fronteira com a Bolívia, em zona de transição entre Amazônia e Cerrado, o parque é um dos últimos corredores de biodiversidade intactos no estado, sendo cobiçado por fazendeiros que pressionam pela extinção da unidade de conservação. Apesar de ser publicamente favorável à manutenção do parque, Fávaro incentivou a instalação de um frigorífico no município. Na inauguração da planta, informou que faria uma “varredura fundiária”.

Essa varredura nunca se concretizou. Segundo levantamento do Greenpeace, até junho deste ano haviam 137 registros ativos no Cadastro Ambiental Rural (CAR) em sobreposição à Serra Ricardo Franco, incluindo duas fazendas ligadas ao ex-ministro Eliseu Padilha que forneceram gado à JBS, Marfrig e Minerva.

POLÍTICO ANTI-INDÍGENA E EX-GOVERNADOR DISPUTAM 2.º LUGAR

Em segundo lugar na corrida pela vaga mato-grossense no Senado, aparecem tecnicamente empatados o tucano Nilson Leitão e o ex-governador Pedro Taques, com 13% e 12% das intenções de voto, respectivamente.

Famoso pelo discurso inflamado e pela atuação anti-indígena na Câmara, Leitão foi o principal responsável, como relator da CPI do Incra e Funai, por aprovar o pedido de indiciamento contra 67 pessoas, incluindo servidores dos dois órgãos, procuradores federais, ambientalistas, antropólogos e líderes indígenas e camponeses.

Relator da CPI da Funai, Nilson Leitão (PSDB) tenta o Senado. (Foto: Reprodução)

Na época em que relatou a comissão, em 2017, Leitão ocupava a presidência da FPA e respondia a cinco inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF), indo de corrupção passiva a crimes de responsabilidade. O tucano também se notabilizou por presidir a Comissão Especial que analisou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que tentava transferir do governo federal para o Congresso a atribuição de aprovar a oficialização de terras indígenas.

Esta é a segunda vez em que Leitão tenta se eleger senador. Considerado favorito em 2018, o então deputado acabou na quinta colocação, com 12% dos votos válidos. Desta vez, ele traz consigo outro expoente do agronegócio, o ex-governador Julio Campos (DEM), que ocupa a vaga de primeiro suplente.

Irmão do senador Jayme Campos (DEM), Julio declarou ao TSE possuir 8.443 hectares em Barão de Melgaço, além de 2.550 cabeças de gado e 31 outros imóveis rurais — estes, sem descrição de tamanho. Ele é dono do Grupo Futurista de Comunicação, que possui as concessões da TV Brasil Oeste, retransmissora da Rede Brasil na região de Várzea Grande (MT), e das rádios Band FM Rondonópolis, Nativa FM Lucas do Rio Verde, Nativa FM Cuiabá e Jovem Pan FM Cuiabá.

Sem bens rurais declarados, Pedro Taques (Solidariedade) se conecta com a agropecuária por outros meios. Em 2018, quando disputava a reeleição, o então governador foi o único candidato a receber doações expressivas do setor, um dos carros-chefe de sua gestão. O produtor de sementes de soja Carlos Ernesto Augustin, dono do grupo Petrovina, doou R$ 100 mil. Outros R$ 25 mil vieram de Valdir Roque Jacobwski, membro do conselho fiscal da Associação Mato-Grossense dos Produtores de Algodão (Ampa).

O apoio não impediu sua derrota, ainda no primeiro turno, para Mauro Mendes (DEM). Para a disputa ao Senado, o ex-governador recebeu R$ 500 mil do fundo eleitoral. Devido a um problema no sistema do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MT), não há, até o momento, informação sobre doações privadas de campanha.

Além de Fávaro, Leitão e Taques, aparecem em seguida na pesquisa de intenções de voto: Procurador Mauro (Psol), com 8%; José Medeiros (Podemos) e Coronel Fernanda (Patriota), com 7% cada; Sargento Eliseu (DC), com 5%; Valdir Barranco (PT), com 4%; Euclides Ribeiro (Avante), com 2%; e Reinaldo Morais (PSC), com 1%. Feliciano Azuaga, do Novo, não pontuou.

BOLSONARO MIGRA APOIO DE RURALISTA PARA MILITAR

A Frente Parlamentar da Agropecuária não é a única interessada direta no resultado da eleição suplementar no Mato Grosso. Visando fortalecer sua base no Senado, o presidente Jair Bolsonaro demonstrou ter papel decisivo nas campanhas.

Considerado um dos bolsonaristas mais ferrenhos da Câmara — a ponto de ser o único vice-líder mantido após o Centrão embarcar no governo —, o deputado José Medeiros (Podemos) parecia ser o candidato óbvio de Bolsonaro nas eleições. No começo de outubro, a Justiça Eleitoral chegou a determinar a remoção de uma de suas peças de propaganda, que exibia o presidente durante mais de 70% do tempo no ar, quando o máximo permitido é 25%. Antes, em setembro, ficou enciumado com uma visita do presidente a Carlos Fávaro, em Sinop, e atacou o senador interino: “cara de pau“.

Em live, Bolsonaro pediu que “pessoal de Campo Grande” votasse em coronel da PM. (Foto: Reprodução)

Mas Bolsonaro virou a casaca. Ainda no mês passado, o mandatário determinou o apoio oficial apenas para a candidatura da tenente-coronel da Polícia Militar Fernanda Siqueira (Patriota). Na fatídica live da última terça (10) em que, usando a estrutura do Palácio do Planalto, Bolsonaro pediu abertamente votos para candidatos aliados, um dos “santinhos” empunhados foi justamente o da Coronel Fernanda, a quem definiu como “policial militar, mulher e evangélica”.

O assunto tornou-se ainda mais comentado pois, ao puxar votos para a candidata, o presidente confundiu a capital do estado com a do Mato Grosso do Sul: “Sei que tem bons candidatos ao Senado em Mato Grosso, mas a minha candidata é a Coronel Fernanda. Tá ok, pessoal de Campo Grande e pessoal que mexe com o agronegócio?”

Apesar de não possuir bens rurais declarados ao TSE, a militar buscou o apoio do setor nomeando como seu primeiro suplente o ex-deputado Victorio Galli (Patriota). Durante seu único mandato na Câmara, entre 2015 e 2018, Galli foi um dos principais expoentes da FPA, sendo um dos titulares da CPI da Funai. Os serviços prestados lhe renderam uma homenagem como “o deputado que mais votou ao lado da agricultura brasileira”, segundo avaliação da coordenação da FPA.

Pastor evangélico, Galli é próximo de Bolsonaro e foi o principal responsável pela aliança com Fernanda. Ele chegou a integrar o governo em 2019, ocupando o cargo de assessor especial da Presidência, mas foi exonerado após ser condenado por homofobia.

| Bruno Stankevicius Bassi é repórter e coordenador de projetos do De Olho nos Ruralistas. |

Foto principal (Divulgação/Aprosoja): Carlos Fávaro (terceiro, da esq. para dir.) em evento de lançamento da colheita de soja

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