Autor de PL que ameaça Código Florestal roda país em “carreta do agro” por Bolsonaro

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Locutor da rede “A Voz do Campo”, Marcelo Brum (PSL-RS) é sócio de fazendeiro condenado por tentativa de homicídio e teve campanha bancada por sojeiros; suplente de Onyx Lorenzoni vota em 99% das vezes a favor do governo e se reuniu até com mãe de Justin Bieber

Por Mariana Franco Ramos

Brum em ato pró-governo. (Foto: Divulgação/Facebook)

A posse de Marcelo Brum (PSL-RS) como deputado federal, em fevereiro de 2019, foi celebrada por ruralistas de todo o país como “uma grande vitória” do setor. Suplente de Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que se licenciou do cargo para ingressar no primeiro escalão do governo Bolsonaro, o fundador e âncora do programa “A Voz do Campo” vem se mostrando fiel a quem o elegeu.

Dentre suas propostas mais controversas está o Projeto de Lei (PL) nº 2429/2020, considerado por organizações ambientalistas um passe livre para o desmatamento em imóveis rurais. O texto muda o dispositivo do Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) que estabelece 22 de julho de 2008 como prazo-limite para a regularização de imóveis com áreas suprimidas irregularmente.

Com isso, proprietários rurais que tenham realizado desmatamento ilegal após esta data poderão ser beneficiados com regras mais brandas, como um prazo de até vinte anos para recuperar área desmatada e a possibilidade de que esta seja feita com até 50% de espécies exóticas, conforme alerta a nota técnica emitida pela WWF sobre o projeto.

O PL de Brum também impede novas autuações por supressão de vegetação em Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal ou de uso restrito até que as unidades federativas tenham implementado integralmente o Programa de Regularização Ambiental (PRA). Além disso, ficam suspensas as autuações aplicadas a proprietários que já tenham assinado termo de adesão ao PRA.

Listado pela ONG Climate Policy Initiative entre os sete projetos de lei que mais ameaçam o Código Florestal e reduzem a proteção às florestas, o PL 2429/2020 aguarda parecer da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, onde foi designado como relator outro bolsonarista: o médico Luiz Ovando (PSL-MS), membro da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), defensor da cloroquina e crítico da Organização Mundial da Saúde (OMS).

VEÍCULO DE BRUM TEM BANDEIRA E FOTO COM BOLSONARO

Natural de Santiago (RS), a 446 quilômetros de Porto Alegre, Marcelo Brum decidiu entrar na política em 2018, graças ao incentivo pessoal de Bolsonaro e ao patrocínio de sojeiros e outros empresários do ramo. Desde então, o radialista de 48 anos percorre diversos estados a bordo de uma carreta verde e amarela. Ele diz que comprou o veículo por R$ 200 mil da Banda Opus Dei, de Santo Augusto, no Rio Grande do Sul, em duas parcelas.

Gaúcho entrou na política a convite de Bolsonaro, a quem se mantém fiel. (Foto: Arquivo/Facebook)

Primeiro, o objetivo era promover candidatos de seu partido. Hoje, é defender pautas de interesse do agronegócio. Além da bandeira nacional, há na carreta uma pintura gigante do deputado ao lado do presidente, com hashtags de apoio e dizeres bíblicos. Os trajetos costumam ser divulgados em lives com convidados.

O alinhamento com o Palácio do Planalto não é apenas publicitário: até abril de 2021, o deputado gaúcho seguiu a orientação de líderes do governo em 99% das votações, conforme monitoramento do Congresso em Foco.

Sem bens rurais declarados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Brum tornou-se uma celebridade no meio agrário como locutor do programa A Voz do Campo, autointitulado “a maior rede de rádios do Agro”. Fruto de uma parceria com o sojicultor Alcides Meneghini, o programa é veiculado em 33 emissoras, em oito estados: Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo, Goiás, Mato Grosso, Roraima, Bahia e Piauí. Entre os patrocinadores estão multinacionais como a estadunidense John Deere, líder mundial em máquinas e equipamentos agrícolas, e a produtora de agrotóxicos japonesa Ihara.

Outro apoiador importante de “A Voz do Campo” é o grupo agrícola comandado pelos irmãos João Marcelo Dumoncel e Luiz Osório Dumoncel. Os dois fundaram, em 1995, ao lado do pai, João Osório, a Três Tentos Agroindustrial (ou 3Tentos) e aparecem como principais doadores de campanha de Brum, com R$ 10 mil cada. Em setembro de 2016, antes do radialista se aventurar na política, a empresa bancou uma estada de dez dias em Las Vegas, nos Estados Unidos, de onde Brum transmitiu o Agritour 3Tentos.

O grupo gaúcho — que, além da produção e comercialização de grãos, distribui sementes e agrotóxicos — anunciou em fevereiro a abertura de IPO na Bolsa, colocando em prática um ambicioso plano de expansão para o Mato Grosso.

SÓCIO FOI ACUSADO DE TENTAR MATAR FUNCIONÁRIO DA PREFEITURA

O sucesso de Brum na Câmara coincide com a derrocada política de seu sócio em “A Voz do Campo”. Ex-prefeito de Capão do Cipó (RS), Alcides Meneghini foi condenado no ano passado a quatro anos e seis meses de reclusão em regime semiaberto. Segundo a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), aceita pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), Meneghini teria sido o mandante de um atentado a tiros, ocorrido dois anos antes, contra Giovani Luiz Diedrich, então presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais.

Meneghini declarou 24 terrenos ao TSE. (Foto: Arquivo)

O ataque foi realizado por três jovens, que entraram na loja da vítima e a agrediram com coronhadas na cabeça e disparos de arma de fogo no pé direito. Na sequência, disseram a Diedrich e a sua companheira, a secretária de Educação de Capão do Cipó Angela Cristina Zucolotto, que traziam “um recado da prefeitura”.

A suspeita é de que Meneghini contratou o trio por R$ 5 mil, com o auxílio de outros dois homens. O motivo seriam investigações sobre supostas ilicitudes na execução do convênio firmado entre o município e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), durante a gestão dele, de 2012 a 2016.

O réu negou a autoria dos delitos, imputando-os aos demais envolvidos. Ele argumentou que não teria motivos para ser o mandante da coação, uma vez que não houve irregularidades no acordo citado. A juíza federal Cristiane Freier Ceron, contudo, considerou-o culpado. Ainda cabe recurso. A última movimentação do processo é de 8 de abril de 2021.

As acusações de corrupção e o suposto envolvimento no atentado interromperam a carreira política do sojicultor. Ele foi derrotado na tentativa de reeleição, em 2016, e novamente nas eleições de 2020, quando declarou R$ 1.591.901,84 em bens ao TSE. Ao todo, Meneghini é dono de 263 hectares em Capão do Cipó.

CONEXÕES DE BRUM VÃO DE AUGUSTO ARAS À MÃE DE JUSTIN BIEBER

Deputado em visita ao procurador-geral da República, Augusto Aras: “reunião muito produtiva”. (Foto: Arquivo/Facebook)

Enquanto isso, em Brasília, a carreira de Marcelo Brum vai de vento em popa. O gaúcho é figurinha carimbada nas manifestações pró-governo promovidas por grupos religiosos e por associações ruralistas. No dia 15 de maio, ele esteve na Marcha da Família Cristã Pela Liberdade, que se fundiu com o movimento de agropecuaristas e caminhoneiros. Do alto do mesmo palanque em que, momentos depois, Bolsonaro falaria ao público, ele postou um vídeo no qual aparece sem máscara gritando “Lula, ladrão”.

Já no dia 02 de junho, visitou o Procurador-Geral da República, Augusto Aras, na sede da PGR, em Brasília. Na pauta do encontro, um tema genérico: “o combate à corrupção no Brasil”. “Muito produtiva nossa reunião”, escreveu, em sua conta no Facebook. Brum finalizou a postagem com um provérbio bíblico: “Quando os justos governam, o povo se alegra, quando os perversos estão no poder, o povo geme”.

Brum e Pattie Malette, mãe de Justin Bieber. (Foto: Reprodução)

Em julho de 2019, Marcelo Brum e sua esposa, Litieri Brum, participaram da Conferência Global da Paz, evento organizado pela Igreja Comunidade das Nações, e posaram ao lado de algumas personalidades. Além de Bolsonaro, Brum foi fotografado com a pastora canadense Pattie Mallette, mãe do cantor Justin Bieber e uma das principais figuras globais no lobby antiaborto.

As pautas conservadoras defendidas por Brum se alinham à defesa consistente dos interesses do agronegócio. Apesar de não integrar formalmente a FPA, braço mais organizado da bancada ruralista, o radialista teve um de seus projetos incluídos na lista de apoiados pela frente. Trata-se do PL 716/2021, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) para incluir o ensino de “técnicas agrícolas” no currículo escolar da educação básica.

Ainda no campo educacional, o parlamentar publicou um vídeo no qual se mostra contrário ao PL 9263/17, que institui a Política Nacional de Juventude e Sucessão Rural. O motivo? Há um artigo do texto que trata da valorização das identidades e das diversidades individual e coletiva da juventude rural. “Agricultor brasileiro não quer saber de ideologia de gênero na lavoura”, reclama Brum. “Temos que nos posicionar a respeito dos temas e não misturar os valores”.

Mariana Franco Ramos é repórter do De Olho nos Ruralistas. |

Foto principal (Facebook): radialista gaúcho diz que comprou caminhão de uma banda gospel

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