Sindicato Rural de Santarém convoca atos golpistas a favor de Bolsonaro

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Em nota, presidente da organização incentiva que “sociedade em geral” paralise atividades e participe de manifesto “em prol da democracia”; produtores ligados ao Sirsan possuem fazendas sobrepostas a território indígena e vendem soja para a Cargill

Por Mariana Franco Ramos

O Sindicato Rural de Santarém (Sirsan), que representa proprietários de terra dos municípios de Santarém, Belterra e Mojuí dos Campos, na região conhecida como Baixo Amazonas, no Pará, está convocando seus associados a participarem dos atos golpistas desta terça-feira (07). Incitadas pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, as manifestações no feriado da Independência pedem o voto impresso, proposta já derrotada na Câmara, e o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF), entre outras pautas antidemocráticas.

O Sirsan emitiu uma nota, que circula nas redes sociais, apoiando e convidando “a sociedade em geral” a paralisar suas atividades e se juntar ao que chama de “manifesto em prol da democracia”. “Será uma manifestação pacífica, com início da concentração na entrada do Loteamento Planalto, ao longo do Km 16, na BR-163, a partir das 8h, e se estenderá ao longo do dia”, diz trecho do documento, assinado pelo presidente Sérgio Schwade.

O site da organização, contudo, já estava fora do ar nesta segunda-feira. A reportagem também tentou contato por telefone e não conseguiu. A manifestação do Sirsan foi registrada pelo Portal OEstadoNet, que destaca o fato de o envolvimento de entidades que recebem recursos públicos em atividades de cunho político-partidário ser vedada por lei.

“O Sindicato Rural recebeu verba oficial para a realização de eventos, como a feira agropecuária”, afirma o periódico. “O que, em tese, configuraria ato de improbidade administrativa de seus dirigentes”.

PRODUTORES PROTAGONIZAM DISPUTAS COM INDÍGENAS DESDE 2008

Ao menos dez produtores de soja, milho e gado ligados ao Sindicato de Santarém possuem fazendas nos limites ou dentro da TI Munduruku do Planalto Santareno. Os indígenas aguardam pela identificação e delimitação do território desde 2008. A área, contudo, nunca saiu do status de “reivindicada” porque a Fundação Nacional do Índio (Funai) afirma não ter condições financeiras de dar prosseguimento ao processo administrativo de demarcação.

Reportagem de Poliana Dallabrida para o De Olho nos Ruralistas mostrou, em outubro de 2020, que os produtores fornecem para a Cargill. A atuação da multinacional na região é apontada como um fator decisivo para a migração de fazendeiros de outros estados para o oeste do Pará e o crescimento da produção de soja, conforme apontado em relatório divulgado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e pela Amazon Watch, a partir de pesquisa feita pelo observatório.

Foi também em Santarém, mais precisamente no distrito de Alter do Chão, que quatro brigadistas foram detidos acusados de promover incêndios florestais. A família do juiz Alexandre Rizzi, que determinou a prisão dos homens, já recebeu pelo menos três multas do Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) por desmatamento. O De Olho pesquisou os arquivos do Ibama e localizou três autuações na categoria “flora” na segunda metade dos anos 90. Leia o texto de Alceu Luís Castilho e Leonardo Fuhrmann.

Desmatamento e soja avançam na TI Munduruku, em área disputada com fazendeiros. (Foto: Arthur Massuda/Cimi)

LÍDERES DO AGRONEGÓCIO SÃO ARTICULADORES DOS PROTESTOS

Apesar de, oficialmente, associações do agronegócio não confirmarem a participação na coordenação dos protestos, líderes do setor, capitaneados pelo “Movimento Brasil Verde Amarelo”, têm não só aderido em massa, como feito convocações e articulações. A própria página do movimento no Facebook tem como mote “Agro e o povo em Brasília”. O grupo é o mesmo que organizou a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em maio, de viés igualmente bolsonarista — e golpista.

Líderes e organizações do agronegócio são figurinhas carimbadas em atos bolsonaristas. (Foto: Facebook)

De Olho nos Ruralistas já contou que a controversa reunião do cantor sertanejo e ex-deputado federal Sérgio Reis (PRB-SP, hoje Republicanos) aconteceu na mansão da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja-BR). Ciceroneado por Antonio Galvan, presidente da entidade, Reis defendeu a concentração de pessoas nas principais cidades do Brasil e ainda a paralisação dos transportes.

O cantor Eduardo Araújo e outro homem, que se apresentava como líder dos caminhoneiros, e depois ficou conhecido como Zé Trovão, também estavam presentes. Relembre aqui.

Galvan é um dos investigados no inquérito que apura a convocação de atos antidemocráticos, aberto pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e autorizado pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF. Após a divulgação do vídeo na mansão, ele e Sérgio Reis foram alvos de mandados de buscas e apreensão.

A Aprosoja Brasil logo tratou de desvincular sua imagem, como instituição, dos atos. “A associação não possui qualquer ligação com atos que defendam ‘invadir’ ou ‘quebrar’ o STF, não responde institucionalmente pela organização de nenhum movimento e repudia qualquer publicação que vincule a associação a movimentos violentos ou ilegais”, divulgou a Aprosoja, em nota.

MEMBROS DA BANCADA RURALISTA CONFIRMAM PRESENÇA

Os deputados federais Aline Sleutjes (PSL-PR), presidente da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (Capadr), e Marcelo Brum (PSL-RS) são alguns dos que confirmaram presença nos atos democráticos do dia 07 de setembro. A parlamentar postou hoje uma foto no Facebook com a legenda: “Verás que um filho teu não foge à luta! Rumo à Brasília” (sic).

Aline Sleutjes (PSL-PR) postou foto em viagem à Brasília, onde participará de atos. (Foto: Facebook)

Filha de agricultores de origem neerlandesa, Sleutjes é natural de Castro (PR), onde foi vereadora por dois mandatos, e está diretamente ligada ao setor leiteiro paranaense. Em junho de 2019, ela articulou uma reunião entre o presidente do Centro de Treinamento para Pecuaristas (CTP) e da Cooperativa Castrolanda Frans Borg, Eduardo Medeiros, e o secretário de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Nabhan Garcia. Leia mais sobre ela, considerada uma inimiga do MST, aqui.

Brum, que assumiu em fevereiro de 2019, quando Onyx Lorenzoni (DEM-RS) se licenciou para ingressar no primeiro escalão do governo Bolsonaro, é fundador e âncora do programa “A Voz do Campo”. Ele percorre diversos estados do país a bordo de uma carreta verde e amarela, com o objetivo de defender pautas de interesse do agronegócio. Além da bandeira nacional, há na carreta uma pintura gigante do deputado ao lado do presidente, com hashtags de apoio e dizeres bíblicos.

O parlamentar é autor do Projeto de Lei (PL) nº 2429/2020, considerado por organizações ambientalistas um passe livre para o desmatamento em imóveis rurais. O texto muda o dispositivo do Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) que estabelece 22 de julho de 2008 como prazo-limite para a regularização de imóveis com áreas suprimidas irregularmente. Relembre aqui o perfil do político.

A adesão da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) não é unânime. Alceu Moreira (MDB-RS), ex-presidente da frente, criticou os ataques feitos ao Poder Judiciário e falou que as declarações atrapalham o setor. “Essa é uma questão de natureza política, não tem nada a ver com o setor”, afirmou, ao Estadão.

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