Festival canadense premia documentário brasileiro sobre conflito agrário no MS

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“Vento na Fronteira” ganhou o prêmio do júri do Hot Docs na categoria filme estrangeiro; filme que retrata violência contra povo Guarani Kaiowá é dirigido por Marina Weis e Laura Faerman, editora de vídeos do De Olho nos Ruralistas

Por Leonardo Fuhrmann

Festival canadense premiou documentário de Laura Faerman e Marina Weis. (Imagem: Divulgação)

O documentário “Vento na Fronteira”, das diretoras Laura Faerman e Marina Weis, foi premiado na semana passada no festival Hot Docs, realizado em Toronto, no Canadá. O evento é uma das principais premiações dedicadas ao cinema de não-ficção no mundo. O filme brasileiro venceu o prêmio especial do júri dedicado a filmes estrangeiros.

Foi a primeira exibição oficial do documentário brasileiro para o público internacional. Antes, ele havia sido apresentado no É Tudo Verdade, festival brasileiro dedicado a documentários. A expectativa das diretoras é que o trabalho seja apresentado também em outros festivais de cinema no Brasil e no exterior.

“Vento na Fronteira” trata do conflito entre fazendeiros do Mato Grosso do Sul e o povo Guarani Kayowá, de existência milenar na região. A disputa se arrasta há sete décadas e resultou no assassinato de diversos líderes indígenas, entre eles, Marçal Tupã-i, um dos expoentes da resistência dos povos originários no início dos anos 80. Morto em 1983, ele havia denunciado as violências sofridas pelos indígenas durante a visita do Papa João Paulo II.

Documentário capturou repressão a protesto indígena em Brasília. (Foto: Divulgação)

ASCENSÃO DE BOLSONARO ACIRROU CONFLITOS

O filme se passa em Antônio João (MS), na fronteira com o Paraguai, para mostrar a tensão entre o modo de vida dos ocupantes tradicionais do território Guarani e a expansão do agronegócio. A narrativa acompanha o acirramento provocado pela ascensão do presidente Jair Bolsonaro, inclusive com a participação dele e dos filhos na escalada do clima de violência na região.

Antagonista do filme, advogada Luana Ruiz ocupou secretaria responsável por demarcações. (Foto: Reprodução)

A escolha do município, segundo Laura Faerman, se deu por diversas razões. “Foi onde o Marçal foi assassinado, a Terra Indígena Ñande Ru Marangatu é sagrada para os povos da região e a sua demarcação ainda é alvo de disputa”, afirma. Segundo ela, a razão do foco no Mato Grosso do Sul foi provocada pela sua percepção de que os Guarani não estão no foco da agenda internacional como outros povos. “Eles não são um povo isolado, com pouca integração com o modo de vida branco”, aponta.

A pesquisa começou em 2014, quando as diretoras foram contempladas com recursos da Prefeitura de São Paulo, para acompanhar o trabalho da Comissão Nacional da Verdade. “O que ouvimos sobre a violência contra os povos indígenas foi muito impactante”, afirma Laura. A partir daí, elas passaram a acompanhar com mais atenção a situação dos Guarani Kayowá. “Conversamos com muitos líderes e anciãos, fizemos várias viagens para a região”, conta.

A dupla também viu uma importante participação das mulheres na resistência do povo, representada no filme pela escolha da protagonista, a líder indígena Alenir Guarani Kaiowá. A constatação também motivou a escolha de outra mulher como antagonista do filme: uma advogada, filha de latifundiários da região, que ganharia um papel importante durante o governo Bolsonaro como assessora do Secretário de Assuntos Fundiários Luiz Antônio Nabhan Garcia.

Documentário acompanha a jornada da líder indígena Alenir Guarani Kaiowá. (Foto: Divulgação)

SÉRIE TRATA DA VIOLÊNCIA DA DITADURA CONTRA INDÍGENAS

Além do filme, a pesquisa gerou uma série televisiva, “A Memória Perigosa”, em seis capítulos de 26 minutos cada, específica sobre a violência contra indígenas durante a ditadura militar. Este outro trabalho traz gravações em dezenas de aldeias, material de arquivo inédito e testemunhos de antropólogos, indigenistas, jornalistas, líderes indígenas e anciões que sobreviveram aos anos chumbo.

Tanto o filme como a série contaram com o apoio do De Olho nos Ruralistas. Atualmente, Laura trabalha como pesquisadora, editora audiovisual e diretora de projetos documentais do observatório, sobre questões agrária e indígena.

Leonardo Fuhrman é repórter do De Olho nos Ruralistas. |

Foto principal (Divulgação): Marina Dias recebe prêmio no Canadá por documentário sobre violência ruralista contra povo Guarani Kaiowá

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