Segundo Paulo Câmara (PSB), o decreto de desapropriação será publicado no Diário Oficial ainda esta semana; protesto realizado nesta quarta-feira por camponeses na sede do governo representou uma vitória para os trabalhadores rurais da Mata Sul pernambucana
Por Katarina Moraes
A ida de centenas de trabalhadores rurais até Recife nesta quarta-feira (17) não foi em vão. Em reunião com líderes do Engenho Roncadorzinho, o governador Paulo Câmara (PSB) garantiu que desapropriará o imóvel onde o menino Jonatas, de 9 anos, foi brutalmente assassinado em 10 de fevereiro, no município de Barreiros, na Mata Sul pernambucana.
Ele disse que o anúncio deve sair no Diário Oficial até esta sexta-feira. O assentamento se chamará Jonatas Oliveira, em homenagem ao menino, baleado embaixo da cama, onde estava escondido com a mãe quando sua casa foi invadida por pistoleiros.
Antes da reunião, o pai da criança comentou que a única providência tomada pelo Executivo pernambucano desde a morte do filho foi a instalação de câmeras e um refletor de luz no acampamento. Líder de trabalhadores rurais, Geovanne da Silva Santos disse que o medo permanece na comunidade, embora não tenham sido registrados novos conflitos: “Só teremos descanso quando tivermos direito à terra, que é de onde tiramos o sustento de nossa família”.
O Engenho Roncadorzinho fica nas terras da antiga Usina Santo André, que faliu há mais de vinte anos. A empresa integrava o Grupo Othon Bezerra de Melo e estava arrendada, há mais de uma década, pela Agropecuária Javari, cujo principal acionista era Ricardo Pessoa de Queiroz Filho, herdeiro do Grupo Una, em recuperação judicial.
Ao todo, moram cerca de 400 pessoas no local. Entre elas, ex-trabalhadores da usina que continuam à espera de pagamentos trabalhistas da empresa. Dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) mostram que ela deve mais de R$ 43 milhões aos antigos empregados.
Após o assassinato de Jonatas, o governo de Pernambuco anunciou a criação da Comissão Estadual de Acompanhamento dos Conflitos Agrários de Pernambuco (Ceaca-PE), com o objetivo de contribuir com soluções efetivas e urgentes para cessão do título da terra às famílias de trabalhadores e trabalhadoras rurais e para a mitigação da violência no campo. Até hoje não foram apresentadas medidas concretas.
“O governador anunciou que a equipe da Comissão está estudando soluções semelhantes para outras terras”, afirmou o advogado e representante da Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado de Pernambuco (Fetape) Bruno Ribeiro de Paiva. “Mais para frente, devem haver novas desapropriações”, torce.
FAMÍLIAS TEMIAM DESPEJOS EM MASSA APÓS OUTUBRO
Para Plácido Júnior, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), a promessa de desapropriação do Engenho Roncadorzinho e outras negociações feitas durante a reunião foram vitórias da mobilização feita pelos trabalhadores, que tentavam agendar uma conversa com o governador há pelo menos dois anos.
“Ele falou que vai garantir que não tenha despejo nas áreas que estão em conflitos e tentará ter uma conversa para reavaliar como estão sendo feitos os leilões de terra com o Judiciário”, contou Plácido. Isso acalma as famílias, que temiam despejos em massa após 31 de outubro, quando acaba o prazo da proibição de despejos e desocupações coletivas estipulado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), válido para áreas urbanas e rurais, em razão da pandemia de Covid-19.
Apesar do compromisso assumido por Paulo Câmara, a luta não acabou para as mais de 1.500 famílias representadas no protesto que percorreu a capital pernambucana. “Isso foi um ponto de partida”, pontua Plácido. “Na nossa avaliação, Roncadorzinho foi desapropriado pela morte da criança, porque há áreas mais fáceis que também poderiam ter sido, como Barro Branco e Batateiras”.
| Katarina Moraes é jornalista. |