Tanque para peixes de Ricardo Nunes barra nascente em APP no sul de São Paulo

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Reservatório em sítio abriga carpas e tilápias criadas pelo filho do prefeito, que promove o espaço nas redes sociais; imóvel não possui Cadastro Ambiental Rural, uma exigência para a criação; série Endereços mostra relação entre poder e território na capital paulista

Por Alceu Luís Castilho, Eduardo Carlini e Bruno Stankevicius Bassi

O prefeito Ricardo Nunes e sua família usufruem de um tanque para peixes dentro de seu sítio em Marsilac, extremo sul de São Paulo. O reservatório barra as águas de uma nascente dentro da Área de Proteção Ambiental Capivari-Monos. O criadouro classificado por Ricardo Nunes Filho como “piscicultura” fica em Área de Preservação Permanente (APP). E sem Cadastro Ambiental Rural (CAR), uma condição para a criação de peixes.

De Olho nos Ruralistas publicou na quarta-feira (12) o primeiro de doze vídeos da série Endereços, sobre a relação dos políticos paulistanos com o território. Lançado no canal do observatório no YouTube, o episódio narra o histórico do Sítio Vista Verde, localizado em loteamento irregular, o Parque Internacional. Apenas 4 dos 13 lotes do imóvel estão em nome de Nunes no 11º Cartório de Imóveis de São Paulo.

Cada vídeo é acompanhado de reportagens em  nosso site que detalham o tema da semana. Confira aqui a primeira: “Sítio de Ricardo Nunes no extremo sul de SP fica em loteamento irregular“. Ricardo Nunes Filho foi também personagem da notícia publicada ontem: “Filhos de Ricardo Nunes alugaram sítio do pai para grupos de até 75 pessoas“.

Um dos atrativos principais do Vista Verde para esses aluguéis por temporada é justamente o tanque em área de nascente, onde o visitante pode pescar carpas e tilápias de até 3 kg. O local é frequentado por Nunes Filho, responsável pela administração do sítio e dos negócios da família desde que o pai entrou na política, em 2012. Ele comanda a principal empresa da família, a Nikkey Controle de Pragas, tema do próximo episódio da série Endereços.

Ricardinho criou um perfil no Instagram promovendo as pescarias no sítio. É ele quem ilustra a foto em destaque, exibindo uma tilápia de 3,3kg — segundo a legenda da publicação. A página Piscicultura Vista Verde permaneceu ativa apenas uma semana, entre 13 e 25 de fevereiro de 2019. Em resposta à reportagem, a assessoria de Nunes afirmou que a criação de peixes é particular e que “não há nenhuma atividade de ‘pesqueiro’ ou algo de gênero na propriedade”.

Confira abaixo um dos vídeos divulgados por Ricardinho, onde exibe o tanque de carpas:

O perfil no Instagram da Piscicultura Vista Verde — é assim que Ricardinho define o empreendimento na imagem principal da página — ainda não foi retirado do ar. Ao contrário do que aconteceu com o do Sítio Vista Verde, no dia 27 de abril, dia em que a reportagem esteve no local. E em 2021, quando os vídeos do prefeito em suas fazendas em Minas Gerais foram apagados um dia após este observatório contar quais eram elas e que o político do MDB tinha obtido duas fazendas por usucapião.

IMÓVEL NÃO CUMPRE CONDICIONANTES PARA PISCICULTURA EM APP

A partir dos dados cadastrados na plataforma Geosampa, o núcleo de pesquisas do De Olho nos Ruralistas identificou o ponto aproximado de origem da nascente que abastece o tanque para piscicultura. A localização é relevante porque o Código Florestal delimita como Área de Preservação Permanente (APP) o raio de 50 metros no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica.

O mesmo artigo limita a supressão vegetal nas margens, em uma faixa de 30 metros. O status restritivo é referendado pelo próprio plano de manejo da Área de Proteção Ambiental (APA) Capivari-Monos, que considera de preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação natural, em especial nas faixas de margens de rios ou de qualquer curso d’água, incluindo nascentes.

Tanque de peixes mantido por Nunes descumpre condicionantes do Código Florestal.

No caso do Sítio Vista Verde, por possuir menos de 15 módulos fiscais, o Código Florestal permite a criação de peixes — bem como a instalação de infraestrutura física diretamente relacionada a ela — mediante uma série de condicionantes, que inclui o licenciamento ambiental, a adoção de práticas sustentáveis de manejo de solo e água e a inscrição do imóvel no Cadastro Ambiental Rural (CAR).

Pelo menos uma das condicionantes não é cumprida pelo prefeito. O observatório pesquisou as bases de dados do CAR e verificou que não existe nenhum cadastro — ativo ou pendente — relativo ao Vista Verde ou a qualquer outro imóvel na mesma quadra.

A reportagem perguntou a Nunes se o sítio possui licença para piscicultura. Em nota, a assessoria do prefeito se limitou a informar que o reservatório não ultrapassa o limite previsto na legislação: “A nascente apontada pela reportagem está dentro de uma área de preservação, com todos os limites respeitados, e o prefeito nega que ela tenha sido canalizada”.

ÍNTEGRA DA RESPOSTA DE RICARDO NUNES À REPORTAGEM

Os lotes em questão foram adquiridos entre 1997 e 1998 já integralmente construídos e constituídos em sua forma final, portanto, antes da criação da APA Capivari-Monos. Todos os lotes possuem matrícula individualizada no 11º Cartório de Registro de Imóveis. Os imóveis constam da declaração de Imposto de Renda do prefeito Ricardo Nunes, o que reitera o seu compromisso com a legalidade de todo o processo.

Em relação às documentações dos lotes 6, 7, 8, 11, 13, 14, 15 e 16, os lotes encontram-se em processo de regularização nos referidos cartórios de imóveis para apresentação e documentação dos proprietários anteriores.

Já as matrículas dos lotes 4, 5, 17 e 18 foram transferidas via escritura pública e registradas em cartório em nome do prefeito, sendo, até o presente momento, de desconhecimento deste a necessidade de comunicação a demais órgãos, o que será brevemente realizada, assim como qualquer outra regularização de pendência.

A nascente apontada pela reportagem está dentro de uma área de preservação, com todos os limites respeitados, e o prefeito nega que ela tenha sido canalizada.

O reservatório não ultrapassa o limite previsto na legislação, e não há nenhuma atividade de “pesqueiro’’ ou algo de gênero na propriedade, que possui uma criação de peixes particular. Na data de aquisição dos lotes mencionados ainda não tinha sido constituída a área de preservação, o que somente aconteceu em 2001.

O imóvel é usado para o lazer de familiares e amigos.

| Alceu Luís Castilho é diretor de redação do De Olho nos Ruralistas. ||

|| Bruno Stankevicius Bassi é coordenador de projetos do observatório. ||

||| Eduardo Carlini é geógrafo e pesquisador. |||

|||| Colaborou Carolina Bataier, repórter. ||||

Imagem principal (De Olho nos Ruralistas): prefeito de São Paulo possui sítio em área de nascente

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