Quem é Maribel Golin, a financiadora de Tarcísio investigada por lavagem de dinheiro do PCC?

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Clã gaúcho administrou massa falida da Boi Gordo e possui 250 mil hectares em quatro regiões do país; fazendas têm histórico de desmatamento, crimes ambientais e incidência em parque; PF investigou relação da pecuarista com Willian Agati, o “Concierge do PCC”

Por Alceu Luís Castilho, Bruno Stankevicius Bassi e Tonsk Fialho

“PF investiga doadora de campanha de Tarcísio por suspeita de lavagem de dinheiro do PCC”. Essa foi a manchete da Folha, em reportagem publicada no dia 29 de julho. Era a primeira vez que a imprensa relacionava a pecuarista Maribel Schmittz Golin a Tarcísio de Freitas (Republicanos). Ela foi a sexta maior doadora da campanha do ex-ministro de Bolsonaro ao Palácio do Bandeirantes: transferiu R$ 500 mil para o governador paulista, em 2022.

Maribel Schmittz Golin aparece em relatório da Operação Mafiusi. (Imagem: Reprodução/PF)

Os agentes da Polícia Federal identificaram o nome de Maribel em quatro transferências financeiras com Willian Barile Agati, denunciado em fevereiro na 23ª Vara Criminal Federal de Curitiba como operador logístico do Primeiro Comando da Capital. Segundo o Estadão, ele atendia pelo codinome “Concierge” e era o principal elo da facção com a ’Ndrangheta, uma das principais organizações mafiosas da Itália, originária da Calábria.

Segundo o relatório da PF, Maribel mantinha uma “relação próxima” com Agati e ajudou a lavar o dinheiro do tráfico. Uma das transações envolveu a venda de um imóvel em Santo André por R$ 3 milhões — 240% acima de seu valor venal. O “Concierge do PCC” realizou outras três operações financeiras com empresas onde a pecuarista é sócia. Elas somam, ao todo, R$ 3,5 milhões.

De Olho nos Ruralistas se debruçou sobre o tema para falar mais do PCC, de lavagem de dinheiro e de pecuária. De onde vem a fortuna de Maribel Schmittz Golin? Nossa equipe de reportagem constatou que o clã gaúcho Golin se estende por quatro regiões do país, em propriedades que somam pelo menos 250 mil hectares — em boa parte, oriundas do período em que a família geriu o espólio da Fazendas Reunidas Boi Gordo.

Os dados são apresentados em uma reportagem especial, disponível em nosso canal do YouTube. Confira abaixo:

Além de Maribel, o vídeo explora o histórico de outros financiadores de campanha de Tarcísio de Freitas. São dezenas de casos de desmatamento, trabalho escravo, participação em desvios de dinheiro e fraudes históricas, que serão tema de reportagens específicas em nosso site, ao longo dos próximos dias.

CLÃ GOLIN É ACUSADO DE DESVIAR R$ 612 MI DA BOI GORDO

Maribel Schmittz Golin é gaúcha de Ibirapuitã e casada com Joselito Golin, fundador do grupo Golin. Até os anos 1990, o conglomerado atuava no interior de São Paulo e em Mato Grosso do Sul. Em 2003, deu um salto, com a compra da massa falida da Fazendas Reunidas Boi Gordo.

A aquisição por Joselito Golin ocorreu sete anos após a Boi Gordo se tornar o epicentro de um dos maiores escândalos de pirâmide financeira da história brasileira. Na época, a empresa acumulava mais de R$ 2,5 bilhões em dívidas.

Joselito Golin (ou Paulo Golin) comprou massa falida da Boi Gordo em 2003. (Foto: Reprodução/X)

A Boi Gordo arregimentava investidores sob a promessa de lucro rápido através da engorda de gado para abate. O ator Antônio Fagundes divulgava as vendas no horário nobre da Globo, durante os intervalos da novela O Rei do Gado. Tratava-se de um golpe bilionário: mais de 30 mil pessoas foram lesadas, incluindo celebridades como Marisa Orth, Felipão, Vampeta e o próprio Antônio Fagundes.

O clã gaúcho não se contentou em recuperar o patrimônio da Boi Gordo. Um relatório encomendado pelo síndico da massa falida, sob supervisão do Ministério Público de São Paulo, constatou que os Golin desviaram R$ 612 milhões em bens que deveriam ser utilizados no abatimento das dívidas. O valor foi aplicado na compra de fazendas no Matopiba, em áreas onde o preço da terra era mais baixo, conforme revelado em reportagem da Agência Pública.

Boa parte dos imóveis foi registrada por empresas em nome de Maribel Golin e de suas filhas, Judiliane Golin Loureiro e Ana Paula Schmittz Golin de Freitas. Outra parte foi registrada por um indivíduo chamado Paulo Roberto da Rosa que, segundo as investigações, seria uma identidade falsa do próprio Joselito Golin. O motivo da suspeita? O RG apresentado por Paulo da Rosa não está registrado na Justiça Eleitoral ou em nenhuma base de dados públicos. Em entrevistas e nas redes sociais, Joselito frequentemente se intitula como Paulo Golin.

De Olho nos Ruralistas se debruçou sobre o patrimônio dos Golin e identificou 69 propriedades registradas no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Ao todo, elas totalizam 229.223,95 hectares. Elas ficam no Tocantins, Piauí, Bahia, Mato Grosso e São Paulo.

Observatório compilou os dados de 69 propriedades ligadas ao clã Golin. (Elaboração: Felipe Fogaça/De Olho nos Ruralistas)

NO MATOPIBA, GRUPO ACUMULA MULTAS POR DESMATAMENTO

O número de imóveis ligados ao grupo Golin é ainda maior. Pelo menos dez fazendas identificadas pela equipe do De Olho nos Ruralistas continuam registradas em nome da Boi Gordo. Não foi possível atestar se o controle dessas áreas permanece com a família de Maribel ou se foram vendidas. Ou ainda, se continuam em mãos de Antonio Carlos de Andrade, um dos irmãos que organizavam a pirâmide da Boi Gordo.

Essas terras somam 18.013,41 hectares em Mato Grosso. A área total ligada aos Golin? 247.237,36 hectares, duas vezes maior que o município do Rio de Janeiro. O valor pode chegar a 312.456,20 hectares, se incluirmos os imóveis adquiridos por subsidiárias do fundo Vision Brazil Investments — parceiro do grupo Golin no Piauí, segundo a investigação do Ministério Público de São Paulo.

Algumas dessas fazendas possuem histórico de desmatamento. Vejamos a Fazenda Eldorado, por exemplo. Localizado em Mateiros (TO), o imóvel está sobreposto em 165,10 hectares da Área de Proteção Ambiental Serra da Tabatinga, um corredor de preservação do Cerrado no coração do Matopiba. A fazenda está em nome da Eldorado Agroindustrial, que tem como sócias Judiliane e Ana Paula Golin.

A empresa acumula R$ 7.042.000 em multas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), todas no Tocantins. A maior delas, de 2012, foi lavrada após fiscais detectarem o desmate sem autorização de 5.076 hectares de Cerrado. A Eldorado possui ainda 27 hectares embargados em Paranã (TO).

Procurado pela reportagem, o grupo Golin informou que a autuação recebida pela Eldorado Agroindustrial “foi suspensa pela Justiça e o auto de infração ambiental lavrado no Piauí foi julgado improcedente ainda na esfera administrativa”. Confira a nota na íntegra no final desta reportagem.

Outra empresa registrada pelas irmãs, a Bom Jardim Empreendimentos Rurais acumula R$ 223 mil em multas ambientais no Piauí, no município de Bom Jesus. O motivo? Descumprir um embargo de 7.731 hectares lavrado em 2008, na Fazenda Bom Jardim. O Ministério Público do Piauí chegou a abrir um inquérito civil contra os Golin, mas o caso foi arquivado em 2022.

As duas empresas, Eldorado e Bom Jardim, são mencionadas no inquérito da Boi Gordo.

REPASSES DE EMPRESAS ENVOLVERAM ATÉ GUSTTAVO LIMA

Bem longe dos baixões do Matopiba, a JBT Empreendimentos e Participações está localizada em um edifício corporativo no coração da Marginal Pinheiros, em São Paulo. A empresa em que Maribel Schmittz Golin é sócia, desde 2018, tornou-se uma peça central nas investigações da PF sobre a lavagem de dinheiro do tráfico conduzida por Willian Agati, o “Concierge do PCC”.

Gusttavo Lima diz que repasse à JBT se deu pela compra de um jatinho. (Foto: Divulgação)

Segundo reportagem do Estadão, a JBT chegou a receber, em 24 de junho de 2022, um repasse de R$ 57,5 milhões da Balada Eventos, do cantor e fazendeiro Gusttavo Lima. O “Embaixador do Agro”, como é conhecido, disse que a transação foi realizada em função da compra de uma aeronave.

Documentos da Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp) acessados pelo observatório mostram que, até 2022, o capital social da JBT era de R$ 72,4 mil. Em 04 de agosto, houve um salto repentino para R$ 27,4 milhões — um aumento de 37.833,48%. Duas semanas depois, em 26 de agosto, Maribel fazia seu primeiro Pix para a campanha de Tarcísio, de R$ 100 mil.

O primeiro turno da campanha ocorreu no dia 2 de outubro. Seis dias antes, em 26 de setembro de 2022, Maribel fundava a Agro Globo Cereais, com sede no km 173 da Rodovia Raposo Tavares, em Itapetininga (SP). Trata-se do mesmo endereço da antiga sede da Fazendas Reunidas Boi Gordo e da Eldorado Agroindustrial. Em 6 de outubro, caiu a segunda parcela de Maribel para Tarcísio: R$ 400 mil.

De Olho nos Ruralistas organizou essas datas em um infográfico:

JBT Empreendimentos teve aumento de 37.833,48% no capital. (Elaboração: Felipe Fogaça/De Olho nos Ruralistas)

O fluxo da relação entre Maribel Golin e Tarcísio de Freitas passa ainda pela Stall Energy, que atua na recuperação energética de resíduos urbanos. Ela foi fundada em 2021, mas Maribel e sua empresa Green Investimentos e Participações passaram a ser sócias em janeiro de 2023, primeiro ano do governo Tarcísio.

Em agosto do ano passado, a fábrica da Stall em Boituva recebeu a visita do secretário de Desenvolvimento Econômico do estado de São Paulo, Jorge Lima. Essa visita será tema de outra reportagem da série.

Questionado sobre a acusação de lavagem de dinheiro para o PCC, o grupo Golin informou que o processo relativo a Willian Agati está sob sigilo, mas que a Justiça Federal reconheceu que a negociação foi feita de boa-fé e que a JBT, na qual Maribel Golin é sócia, tinha capacidade econômica para a transação. Segundo o grupo, o aumento de capital social da JBT Empreendimentos e Participações tem motivos estratégicos de mercado, “em nada relacionados a governos ou política”.

ÍNTEGRA DA NOTA DE POSICIONAMENTO DO GRUPO GOLIN

O Grupo Golin tem 35 anos de atuação e relevância nacional, com fazendas em 8 estados, gerando milhares de empregos e fornecendo soja, milho, algodão e gado para as maiores empresas do país. Suas coligadas patrimoniais administram participações societárias e negociam áreas rurais, imóveis próprios e bens móveis. As movimentações financeiras do grupo, portanto, são proporcionais ao seu volume de negócios.   
As empresas do Grupo e seus representantes não têm qualquer relação com as pessoas que agora enfrentam acusações criminais no Inquérito Policial. O processo em questão está sob sigilo, mas a Justiça Federal já reconheceu que a negociação foi feita de boa-fé, de forma lícita e regular e que a empresa da qual Maribel Golin é sócia tinha capacidade econômica para a transação. Os autos dos Embargos de Terceiro Criminal n.º 5058194-36.2022.4.04.7000 tramitaram na Justiça Federal de Curitiba com segredo de Justiça e tiveram trânsito em julgado.   
O aumento de capital social da empresa JBT Empreendimentos e Participações — devidamente registrado nos órgãos oficiais —; a atuação da Stall Energy, voltada para o meio ambiente; e as parcerias rurais em empreendimentos na Bahia e em Mato Grosso têm todos motivos estratégicos de mercado, em nada relacionados a governos ou política. 
O Grupo Golin repudia a prática de grilagem de terras, à qual inclusive teve de resistir com o uso de segurança privada depois que propriedades no Piauí foram alvo de invasões por um grupo de grileiros.   
Do mesmo modo, as empresas do Grupo vêm cumprindo as exigências da legislação de preservação ambiental e dos órgãos reguladores. A autuação recebida pela Eldorado Agroindustrial, no Tocantins, foi suspensa pela Justiça e o auto de infração ambiental lavrado no Piauí foi julgado improcedente ainda na esfera administrativa. 
Assessoria de Imprensa do Grupo Golin

Imagem em destaque (De Olho nos Ruralistas): vídeo mostra histórico ambiental e corporativo dos financiadores de Tarcísio de Freitas

| Alceu Luís Castilho é diretor de redação do De Olho nos Ruralistas. |

|| Bruno Stankevicius Bassi é coordenador de pesquisa do observatório. ||

||| Tonsk Fialho é pesquisador e repórter. |||

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