Agrogolpistas: empresários do agronegócio passam impunes em inquéritos sobre golpe

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Dos 142 fazendeiros listados no dossiê “Agrogolpistas”, apenas 18 foram responsabilizados em inquéritos do 8 de janeiro; fazendeiro paranaense preso por depredar prédios públicos foi defendido por Sérgio Moro

Por Bruno Stankevicius Bassi e Tonsk Fialho

Agrogolpistas: relatório inédito consolida 142 nomes de empresários do agronegócio que apoiaram tentativa de golpe

Nos dois anos que se seguiram ao 8 de janeiro, a Justiça brasileira responsabilizou criminalmente 898 réus. Desse total, 527 foram condenados após prisão em flagrante dentro de prédios públicos e na Praça dos Três Poderes ou nos acampamentos ilegais em frente dos quartéis do Exército.

À exceção dos oito militares presos no curso das operações Contragolpe e Tempus Veritatis, os golpistas do 8 de janeiro são, em sua maioria, “peixes pequenos”. No rol de condenados nota-se a ausência de empresários que ajudaram a financiar não somente os acampamentos e os bloqueios rodoviários, mas também a conspiração golpista dos generais.

A falta de responsabilização de fazendeiros e donos de empresas agropecuárias que forneceram apoio logístico e financeiro ao golpe é um dos pontos centrais do relatório “Agrogolpistas“, lançado ontem (25) pelo De Olho nos Ruralistas. O estudo identificou 142 nomes ligados ao agronegócio entre os indiciados em comissões parlamentares de inquérito ou na Operação Lesa Pátria, da Polícia Federal, e os investigados por órgãos estaduais, pelas polícias civil e militar e pelos Ministérios Públicos estaduais.

Uma evidência dessa impunidade vem do relatório da CPMI do 8 de Janeiro, do Senado, que destacou o papel central dos caminhões estacionados no Quartel General (QG) do Exército, em Brasília. Os veículos serviam de palanque, auxiliavam no trânsito de mantimentos e simbolizavam a força do movimento, que ameaçava “parar o Brasil”.

Esses empresários da logística são também fazendeiros, um dado crucial que passou ao largo de boa parte das análises publicadas à época. Eles respondem por 91 das 142 entradas na lista: 64% dos nomes consolidados neste relatório. Quantos deles foram responsabilizados criminalmente por esse motivo? A resposta devastadora é: nenhum.

DEFENDIDO POR MORO, FAZENDEIRO PRESO É EXCEÇÃO ENTRE AGROGOLPISTAS

Os únicos empresários condenados presentes na lista consolidada no relatório “Agrogolpistas” são aqueles flagrados durante os atos terroristas de 8 de janeiro de 2023, em Brasília. É o caso do fazendeiro paranaense Jorginho Cardoso de Azevedo, condenado a 17 anos de prisão por participar da invasão e depredação de prédios públicos na Praça dos Três Poderes.

Defendido por Moro, Jorginho Cardoso de Azevedo foi preso por invadir Palácio do Planalto. (Foto: Reprodução/STF)

Azevedo conta com o apoio de um político famoso: o senador Sérgio Moro (União-PR). Em setembro de 2024, o ex-juiz da Lava Jato usou sua conta no Instagram para criticar o tempo de pena concedido ao conterrâneo. Ele disse que intercederia junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) com o objetivo de transferi-lo ao regime semi-aberto para tratar “graves problemas de saúde”.

Na postagem, Moro comparou a situação ao caso da esquartejadora Elize Matsunaga: “O agricultor Jorginho de Azevedo deve ficar na cadeia por 17 anos, enquanto a assassina do ex-dono da Yoki cumpre em liberdade uma pena de 16 anos e três meses”. Em abril de 2025, Alexandre de Moraes autorizou a mudança para prisão domiciliar.

O que Sérgio Moro não diz é que Azevedo foi identificado pela CPI dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), como um dos contratantes de ônibus usados para levar manifestantes a Brasília. Não se trata, portanto, de um simples patriota, um “vândalo de passagem”.

Os indiciados nas comissões parlamentares — tanto do Senado quanto da CLDF — não integram a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) que definiu os seis núcleos golpistas no julgamento no STF. Também não foram processados os empresários listados na lista de donos dos caminhões flagrados no QG do Exército.

RELATÓRIO LISTA 18 FAZENDEIROS INDICIADOS POR 8 DE JANEIRO 

A lista de 142 empresários do agronegócio consolidada no estudo “Agrogolpistas” se baseia exclusivamente em nomes implicados legalmente nas fontes oficiais. Nomes mencionados apenas em relatórios de inteligência, como o da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), divulgado pelo portal Congresso em Foco, não foram incluídos. Salvo as exceções: aqueles que também foram indiciados em outros processos relativos ao golpismo no Brasil.

Antônio Galvan, de camisa branca, acompanha Braga Netto em visita a usina de etanol. (Divulgação/Inpasa)

É o caso de Antônio Galvan, que presidiu a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil) durante a era Bolsonaro. Responsável pela radicalização ideológica da organização, ele aparece junto a outros sete líderes do setor — entre presidentes de sindicatos rurais e dirigentes das Aprosojas regionais — que foram investigados na CPMI do 8 de Janeiro, no Senado.

Datado de 10 de janeiro de 2023, dois dias após a tentativa de golpe, o relatório da Abin aponta o Movimento Brasil Verde e Amarelo (MBVA) como articulador, pelo menos desde 2021, de manifestações golpistas. O papel do MBVA e sua relação com o general Walter Braga Netto é o tema central do terceiro capítulo do relatório. Candidato a vice-presidente em 2022, Braga Netto é o “pai” do plano Punhal Verde e Amarelo — que pretendia assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Além desses dirigentes, o núcleo do 8 de janeiro conta com cinco fazendeiros que foram alvos de busca e apreensão no inquérito na Operação Lesa Pátria. São eles: José Ruy Garcia, vereador de Inhumas (GO); Fernando Junqueira Ferraz Filho, primo do prefeito de Leopoldina (MG); Luciene Beatriz Ribeiro Cunha, pecuarista de Uberaba (MG); e Geraldo Cesar Killer, de Bauru (SP), com quem foram apreendidos US$ 142 mil em espécie.

Quem fecha o grupo é Christiano da Silva Bortolotto, ex-presidente da Aprosoja-MS e alvo da 26ª fase da Lesa Pátria. Ele é investigado por organizar comboios com ônibus e caminhões rumo a Brasília, além de estimular bloqueios de rodovias na região sul do estado. Um combo completo.

| Bruno Stankevicius Bassi é coordenador de pesquisa do De Olho nos Ruralistas. |

|| Tonsky Fialho é pesquisador e repórter. ||

Foto em destaque (Marcelo Camargo/Agência Brasil): golpistas do agronegócio passaram impunes em inquéritos do 8 de janeiro

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