Movimentos urbanos de agroecologia, contra agrotóxicos e contra a fome pedem comprometimento com segurança e justiça alimentar; entre as propostas está o incentivo à produção local
Por Inês Castilho
Não por acaso, celebrações em família e na comunidade envolvem o preparo e a partilha de alimentos. Alimentar-se, ato intrínseco à dignidade humana, nos conecta à identidade cultural e familiar, ao corpo, à mente. É grande, contudo, a falta de conexão com o alimento no cotidiano das áreas urbanas, sem falar na fome e nas políticas impostas pelo capital – megacorporações de semente transgênica e venenos agrícolas, agroindústrias, redes de supermercados.
Esse desafio está agora sendo enfrentado por movimentos urbanos em prol da Justiça e Segurança Alimentar e Nutricional, da Agroecologia e da Sustentabilidade, que propõem aos candidatos ao executivo e legislativo municipal “uma cidade mais humana, solidária, justa e com conquistas sociais e ambientais de verdade”.
Mais hortas urbanas, melhor estrutura para produtores orgânicos, combate aos agrotóxicos e ao desperdício de alimentos, erradicação da fome no município, educação alimentar e nutricional, investimento em hortas escolares e na alimentação escolar, incentivo à produção e consumo locais, às sementes crioulas e à agrobiodiversidade local, mais parques, melhor gestão de resíduos e mais participação da sociedade nas decisões, entre outras, são propostas apresentadas aos candidatos na Carta-Compromisso pelo Direito à Comida de Verdade em São Paulo e no Guia de Justiça Alimentar.
A Carta-Compromisso é assinada pelo Movimento Urbano de Agroecologia (Muda SP), pelo Fórum Paulista de Segurança Alimentar e Nutricional, pela Ação da Cidadania Contra Fome, a Miséria e pela Vida, pelo Instituto Polis, Instituto Kairós e Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida. O Guia foi publicado pelo Instituto Reaja, com dez propostas elaboradas pelos movimentos Muda SP, Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, Movimento Infância Livre do Consumismo (Milc), Movimento Põe no Rótulo, Comida Invisível e o próprio Instituto.
DIREITO À ALIMENTAÇÃO
O Direito à Alimentação no Brasil foi garantido pela Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan, lei nº 11.346), de setembro de 2006, e por ela instituiu-se o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisvan). A alimentação como direito social foi introduzida na Constituição pela Emenda Constitucional (EC) 64, de 2010. Implica o direito de acesso aos recursos para produzir ou adquirir alimentos seguros e saudáveis, assim como às informações sobre o conteúdo dos alimentos – produtos químicos e aditivos devem estar claramente identificados na embalagem.
“A inclusão do direito à alimentação na Carta Política brasileira constituiu um pioneirismo, após anos de luta contra a fome no país, que teve como expoentes pessoas como Josué de Castro (1908-1973) e Herbert de Souza (1937-1997), carinhosamente conhecido como Betinho”, afirma a professora Maria Célia Delduque, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz.
O Brasil já era signatário de tratados internacionais que afirmam o direito humano à alimentação, tais como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948; a Convenção Internacional dos Direitos da Criança e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Pidesc). Criado para monitorar o Pacto, o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU destaca duas dimensões do direito humano à alimentação: o de estar livre da fome e o direito à alimentação adequada. De acordo com o Pacto, os Estados têm obrigação de criar os meios para mitigar e aliviar a fome.
“Se por um lado há o direito à alimentação e o direito à saúde – elementos fundamentais a vida –, por outro há o dever do Estado em desenvolver políticas públicas econômicas, sociais, ecológicas, educacionais, culturais e uma permanente vigilância pela qualidade do que é produzido e distribuído em forma de alimentos, a fim de garantir uma justiça alimentar para todos, com oferta adequada de alimentos e nutrientes com garantia de sua qualidade e segurança”, diz a professora.
4 commentsOn Organizações cobram dos candidatos o Direito à Comida de Verdade
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Consta que certo governador teria afirmado que a justiça de seu estado dependia do seu talão de cheques. Do talão de cheques do agribiuzinesse dependerão os eleitos. Como ao agribiuzinesse interessa que cada brasileiro ingira cinco litros de veneno por ano …
Estranhei muito num texto falando sobre comida de verdade usarem como exemplo uma foto de horta feita em pneus. Tenho lido ambientalistas falando sobre a não indicação de seu uso devido a liberação de toxinas do material. Chega a doer a contradição. Estarão errados os que recriminam o uso dos pneus?
Trocamos a foto, Ana. Agradecemos o toque.