O petista Oriel Moraes quer conquistar votos sem polarizar com concorrentes e eleitores que apoiam o presidente, criado na região; foi em um quilombo do município que Bolsonaro disse ter ido, em 2018, quando se referiu aos moradores em arrobas
Por Márcia Maria Cruz
Pela primeira vez um candidato quilombola disputa a prefeitura de Eldorado (SP), no Vale do Ribeira, município onde o presidente Jair Bolsonaro foi criado. O advogado Oriel Rodrigues de Moraes, de 48 anos, o Doutor Oriel, se candidata pelo PT, em coligação com o PV, e enfrenta três candidatos de partidos de direita: o atual prefeito, Dinoel Pedroso Rocha (PL), que tenta a reeleição, Tikinho Feliciano (Republicanos) e Donizete Antônio de Oliveira, o Zetinho (DEM).
Nesta reta final, De Olho nos Ruralistas conversou com Oriel, que adotou a estratégia de não entrar em confronto direto com as candidaturas alinhadas a Bolsonaro. Ao afirmar que tem optado por não dar entrevista, Oriel não quis nem mesmo falar das propostas e disse que todos os candidatos na disputa do município são bolsonaristas, optando por não se apresentar como a candidatura contrária ao presidente.
Os quilombolas de Eldorado foram levados ao centro de uma representação da Procuradoria-Geral da República (PGR) pedindo a abertura de investigação contra Bolsonaro, na época deputado federal pelo PSC-RJ, pelo crime de racismo em razão de comentários feitos durante palestra no Clube Hebraica do Rio de Janeiro. Em 2018, o Superior Tribunal Federal (STF) rejeitou o pedido.
CUNHADO DE BOLSONARO FOI CONDENADO POR INVADIR QUILOMBO NA REGIÃO
Na pré-campanha em 2017, Bolsonaro contou que tinha feito uma visita a um quilombo em Eldorado e “o quilombola mais leve pesava sete arrobas”. “Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada. Eu acho que nem para procriar serve mais”.
Arroba é uma unidade de medida, equivalente a 15 quilos, que costuma ser usada para pesar gado. Em reportagem de 2018 do De Olho nos Ruralistas, quilombolas de Eldorado disseram não ter registro da visita do então deputado à comunidade: “Quilombolas de Eldorado dizem que Bolsonaro nunca os visitou“.
Confira no vídeo abaixo:
Apesar de nas entrevistas Doutor Oriel evitar polemizar com bolsonaristas, no programa de governo registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o candidato petista critica o atual governo federal. “A imensa crise social, fiscal e econômica foi agravada pela pandemia da Covid-19 e pelo desgoverno de Bolsonaro”, declara.
Os quatro candidatos são da região, a mais pobre do estado de São Paulo. Oriel e Donizete Oliveira, o candidato do DEM, nasceram em Eldorado. O prefeito Dinoel Rocha (PL) e Tikinho Feliciano (Republicanos) nasceram, respectivamente, em Iguape e Registro.
Casado com a irmã caçula de Bolsonaro, Theodoro da Silva Konesuk foi condenado em setembro de 2018, a um mês da eleição presidencial, por invadir um quilombo em Iporanga, na divisa com Eldorado. A notícia foi revelada pelo observatório: “Cunhado de Bolsonaro é condenado por invasão de quilombo no Vale do Ribeira“.
PROGRAMA DE GOVERNO NÃO TRAZ POLÍTICAS ESPECÍFICAS PARA COMUNIDADES
O programa de governo de Oriel apresenta treze eixos: transição ecológica para a Sociedade do Século 21, desenvolvimento econômico sustentável e solidário, desenvolvimento rural social e ambientalmente sustentável, qualidade e humanização na atenção à saúde, educação inclusiva e de qualidade, segurança pública cidadã, desenvolvimento social, inclusão e equidade, igualdade e garantia de direitos, cultura para todos, esporte e lazer acessível a todos, participação cidadã e transparência e gestão ética e eficiente.
Não há políticas específicas para os territórios quilombolas, mas eles são relacionados em algumas políticas propostas. No eixo sobre desenvolvimento rural social, o candidato propõe pagamento por serviços ambientais a pequenos produtores rurais pela preservação de nascentes em territórios quilombolas. No eixo qualidade e humanização à saúde, o candidato defende o Sistema Único de Saúde e ampliação do programa Saúde daFamília.
Nesse contexto, defende política de acesso à saúde aos indígenas e quilombolas, principalmente no enfrentamento à pandemia da Covid-19. A proposta de educação inclusiva implica efetivar a política municipal da educação no campo e educação quilombola, construída com o protagonismo das comunidades e movimentos sociais.
| Márcia Maria Cruz é jornalista. |
Foto principal (Marília Garcia Senlle/ISA): sistema agrícola quilombola é reconhecido como Patrimônio Cultural do Brasil pelo Iphan
|| A cobertura do De Olho nos Ruralistas sobre o impacto da pandemia nas comunidades quilombolas tem o apoio da Fundo de Auxílio Emergencial ao Jornalismo da Google News Initiative ||