FHC, o Fazendeiro – Entenda como Sérgio Motta transformou Fernando Henrique em pecuarista

In De Olho na Política, De Olho no Agronegócio, Últimas
Motta e FHC durante a posse do ministro, em 1995. (Foto: Senado)

Odebrecht financiou Instituto Sérgio Motta entre 2009 e 2013; chamado de “trator”, ministro  tinha atividade agropecuária em SP antes se tornar sócio de FHC em fazenda em Buritis

Por Alceu Luís Castilho

Conhecido como “trator”, uma das figuras mais importantes do governo Fernando Henrique Cardoso tinha seu pé no campo. Mais notório por ter comandado a privatização das telecomunicações, como ministro das Comunicações de FHC, Sérgio Roberto Vieira da Motta tornou-se fazendeiro muito antes do amigo. E foram ambos que, em 1989, compraram a Fazenda Córrego da Ponte, em Buritis (MG).

Livro foi publicado em 1999. (Imagem: Reprodução)

Ocupada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) entre 1999 e 2002, após a morte de Sérgio Motta (1940-1998), ela se tornou uma das grandes polêmicas do governo do sociólogo. Saiba mais sobre esse momento político aqui: “FHC, o Fazendeiro – Em Buritis (MG), Fernando Henrique criou gado e despejou MST com Exército”. Aqui, a série completa de reportagens: “FHC, o Fazendeiro – tudo sobre as terras da família, os amigos pecuaristas e a Odebrecht“.

O engenheiro Sérgio Motta está representado na Fundação FHC, de certa forma, por um dos 12 integrantes não-vitalícios da organização: José Expedicto Prata. Ele foi chefe de gabinete de Motta no ministério. E diretor de Relações Corporativas da Telefônica. E um dos membros do Conselho Consultivo da IDBrasil Cultura, Educação e Esporte, Organização Social (OS) que administra o Museu da Língua Portuguesa e o Museu do Futebol.

Um dos conselheiros do Instituto Sérgio Motta, presidido pela viúva Wilma Motta, José Expedicto Prata – também conselheiro da Fundação Mário Covas – é um dos autores do livro “Sérgio Motta: o Trator em Ação” (Geração Editorial), lançado em 1999. Assim como as biografias de Fernando Henrique Cardoso, fundamental para entender melhor os anos 90.

Nos anos 70, Prata era da Hidrobrasileira, conhecida como Hidro, de Serjão. Ele foi vice-presidente da empresa. Nessa mesma época Motta comprou o Sítio Laranja Azeda – que daria nome a uma das empresas do engenheiro, a Laranja Azeda Empreendimentos, fundada em 1975. Seus sócios na Hidro eram Adroaldo Wolf, Antonio Guido e Luiz Carlos Mendonça de Barros, outro personagem notório da privatização das teles.

ODEBRECHT FINANCIOU INSTITUTO SÉRGIO MOTTA

Essa história ajuda a entender como Fernando Henrique Cardoso se tornou um fazendeiro. Mas antes façamos uns parênteses. Já vimos nesta série que FHC, Jovelino Mineiro (que sucedeu a Motta como sócio na Córrego da Ponte) e diversos outros personagens dessa trama revezam-se como conselheiros em entidades culturais e organizações filantrópicas. Em alguns casos, convivendo com empresários apoiadores da fundação, entre eles Emílio Odebrecht.

Isso também acontece com o Instituto Sérgio Motta. A Odebrecht apoiou o instituto em 2009, 2010, 2011, 2012 e 2013 (desde esse ano um tanto às moscas), conforme os relatórios anuais da própria empresa. A empreiteira também apoiou nesses anos a Fundação Luísa e Oscar Americano. Nesses e em outros relatórios da empresa não é mencionado o Instituto FHC – que se tornaria Fundação FHC.

Motta deu nome a usina entre SP e MS. (Foto: Divulgação)

Em 1997, como mostra a biografia editada pela Geração Editorial, Sérgio Motta estava doente, irrequieto no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. Recebeu muitas visitas e o telefone não parava. Um dos que “estavam na torcida”, nas palavras dos autores, era Emílio Odebrecht.

Em 2005, o 6º Prêmio Sérgio Motta de Artes e Tecnologia, promovido pelo Instituto Sérgio Motta, foi patrocinado pela Odebrecht e pela Telefônica, com apoio da Lei de Incentivo à Cultura. A viúva de Motta, Wilma Kiyoko Vieira da Motta, faz hoje parte do Conselho Curador da Fundação Telefônica.

Foi com o apoio do Instituto Sérgio Motta que o Instituto FHC organizou, em 2008, o Projeto Memória das Telecomunicações, com a digitalização dos documentos relativos à privatização do Sistema Telebrás. Saiba mais sobre o acervo do ex-presidente aqui: “FHC, o Fazendeiro – Fundação FHC promove agronegócio e enviou consultoras para Museu do Zebu“.

O Instituto Sérgio Motta é presidido por José Teixeira de Almeida Júnior, que trabalhou com Andrea Matarazzo na Secretaria de Governo da Presidência da República, em 1999. José Expedicto Prata é um dos conselheiros, ao lado do co-autor do livro “Trator em Ação”, Teiji Tomioka, e do diretor Marcello Borg – sobrinho de Sérgio e sócio da família Motta na Laranja Azeda Empreendimentos.

FHC REPETE TRAJETÓRIA DE SEU MINISTRO

O Sítio Laranja Azeda era um cafezal, como narram Prata e Tomioka (com a ajuda do jornalista Nirlando Beirão) no livro “Sérgio Motta – o Trator em Ação”. Depois Motta começou a criar gado e cavalos. Em seguida, passou a trabalhar com reflorestamento – eucaliptos. Wilma Motta cuidava da horta. “Sem agrotóxicos”, orgulhava-se ela.

Edições do jornal de resistência Movimento. (Imagens: Reprodução)

Ali Serjão recebia os colegas da Hidro e do jornal Movimento, da imprensa alternativa. O ex-ministro foi secretário-geral da Ação Popular, a mesma organização de resistência à ditadura da qual fizeram parte o atual senador José Serra (PSDB-SP); o sucessor de Motta no Ministério das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros; o atual ministro das Minas e Energia, Moreira Franco (MDB); e mais um ex-ministro do governo FHC, Clóvis Carvalho – outro membro não-vitalício da Fundação FHC.

Entre os colaboradores do Movimento, dirigido por Raimundo Rodrigues Pereira, estavam Fernando Henrique Cardoso, Perseu Abramo, Jacob Gorender e Chico de Oliveira. Foi Chico quem apresentou FHC a Sérgio Motta. “Nunca mais iriam se desgrudar”, escrevem os biógrafos.

Cerca de dez anos depois, em 1986, a dupla comprou a propriedade de 1.046 hectares em Buritis. “Sérgio Motta tinha uma inexplicável nostalgia do campo”, escrevem Prata e Tomioka. “Só assim se entende que tenha compartilhado uma longínqua fazenda com Fernando Henrique. Na verdade, Serjão tomou gosto pela coisa”.

Quem fez o levantamento topográfico foi o próprio Tomioka. Ele e Prata relatam no livro que Motta começou a plantar soja. Depois partiu para o gado. Um dos Nelore foi premiado na Feira Agropecuária de Uberaba. Mas o futuro ministro pretendia melhorar o rebanho com cruzamentos. “Aquele gado nelore era chinfrim”, definira seu amigo Jovelino Mineiro – muito amigo de FHC.

Os autores contam que Motta se encarregou de tudo. “Depois de eleito presidente, Fernando Henrique muitas vezes buscou refúgio naquela serena paisagem”. Sem tempo, Motta começou a preparar o sobrinho Marcello para administrar a fazenda. “Posteriormente eles passaram a criar gado Brangus, a conselho de Jovelino Mineiro”.

Mais tarde FHC venderia gado Brangus em leilão promovido por Jovelino em Rancharia (SP): “FHC, o Fazendeiro – Vinte anos atrás, Fernando Henrique vendia touros em Rancharia (SP), na fazenda de Jovelino Mineiro”.

NO MEIO DO CAMINHO, A DITADURA

Nesse intervalo entre 1975 e 1986 há um aspecto nebuloso da biografia de Sérgio Motta: a Coalbra. Essa empresa, a Coque e Álcool de Madeira S/A, foi inaugurada em novembro de 1983, com a presença do presidente João Baptista Figueiredo e do general Otávio Medeiros, chefe do Serviço Nacional de Informações. Presidente da Coalbra? Sérgio Motta.

O futuro ministro das Comunicações também foi funcionário, na Sociplan, de José Amaro Pinto Ramos, um dos acusados por delatores da Odebrecht, em 2017, de remeter dinheiro de propina para contas de José Serra no exterior.

Confira aqui a reportagem sobre outro dos acusados de enviar dinheiro a Serra, o pecuarista Jonas Barcellos, com mais detalhes sobre o caso : “FHC, o Fazendeiro – Jonas Barcellos, o pecuarista que Mirian Dutra diz ter pago sua mesada em Paris“.

Motta disse que foi empregado de Ramos, contam os autores de sua biografia, mas saiu em litígio. Eles completam: “Nunca a sombra do duvidoso personagem se dissipou da vida de Sergio Motta”.

NOVAMENTE, A DANÇA DOS CONSELHEIROS

Indicado por Motta para ser chefe da Comunicação Social no Ministério da Saúde, durante a gestão Serra, em 1997, o publicitário João Roberto Vieira da Costa integra hoje o conselho administrativo da Associação Pró-Dança, em São Paulo, a Organização Social (OS) que controla a São Paulo Companhia de Dança.

Quem preside o conselho é José Fernando Perez, outro membro da Fundação FHC. A vice-presidente é Maria do Carmo Mineiro, casada com Jovelino Mineiro – um dos principais protagonistas desta série de reportagens: “FHC, o Fazendeiro – De Buritis (MG) a Botucatu (SP), saiba por que Jovelino Mineiro é o braço agrário da família Cardoso”. Um dos colegas de Bob Vieira da Costa no conselho é o advogado José de Oliveira Costa, diretor da Fundação FHC: “FHC, o Fazendeiro – Sócios em empresa, Emílio Odebrecht e Jovelino Mineiro já foram representados em assembleia pelo advogado de FHC“.

Após deixar o Ministério da Saúde, em 2001, Vieira da Costa foi chefiar a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), até o fim do governo Fernando Henrique Cardoso, em 2002. No ano seguinte ele criou a agência de publicidade nova/SB, que cresceu durante os governos petistas e ganhou licitações durante o governo Temer.

AMIGOS PARTICIPARAM DE CAIXA 2 DA REELEIÇÃO

Uma das pessoas que frequentavam o Sítio Laranja Azeda nos anos 70, Adroaldo Wolf foi um dos poucos – além do ex-ministro Bresser Pereira – a ter acesso à contabilidade de Fernando Henrique Cardoso na campanha da reeleição, em 1998. O outro era Egydio Bianchi, ex-presidente dos Correios.

Uma das manchetes da Folha em 1997. (Imagem: Reprodução)

O ministro Sérgio Motta foi um dos artífices da reeleição. O ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE) declarou, em delação na Lava-Jato, que foram comprados votos de mais de 50 deputados. O escândalo foi inicialmente revelado pelo jornalista Fernando Rodrigues, na Folha, em 1997.

Em seu “Diários da Presidência”, FHC conta que, em novembro de 1998, recebeu Bresser, Wolf e Bianchi para almoçar, junto com o secretário-geral Eduardo Jorge. “Vieram me fazer a prestação de contas da campanha”.

Bresser Pereira foi o autor de uma planilha sobre caixa 2. Wolf e Bianchi foram mencionados em reportagem da Veja sobre o caso. “Que teve uma contabilidade paralela, eu não tenho dúvida”, disse um deles à revista. “O que eu não sei é se desviaram o dinheiro ou se não declararam para proteger a identidade do doador”.

Demitido dos Correios, Bianchi tornou-se o suspeito de vazar a planilha. Ele se tornou criador de caprinos em Atibaia (SP). Em 2010, a grande campeã na 7ª edição da Feira Internacional de Caprinos e Ovinos, a Feinco 2010, foi a sua cabra Walesca de Canedos, entre os candidatos da raça Boer. Entre os machos quem levou foi U2 de Canedos – também exposto por Bianchi. Em 2006, o criador foi novamente campeão de um torneio em Bragança Paulista, com a jovem fêmea Divina Xodó.

LEIA A SÉRIE COMPLETA:
“FHC, o Fazendeiro – tudo sobre as terras da família, os amigos pecuaristas e a Odebrecht”.

You may also read!

Conheça o terreno em Parelheiros onde Nunes tentou construir condomínio empresarial

Imobiliária do prefeito, a Topsul Empreendimentos, iniciou processo em imóvel na Estrada Ecoturística de Parelheiros; mata e casa cotada

Read More...

Imobiliária de Ricardo Nunes mostra conexão empresarial com parceiros da zona sul

Dono da Topsul Empreendimentos, prefeito e amigos maçons montaram empresa em nome de parentes; todos tinham conexão com Associação

Read More...

Green Village: o condomínio em Interlagos onde Ricardo Nunes e amigos fazem seu “banco imobiliário”

Maçons e empresários do ramo de imóveis, grupo do prefeito tem apartamentos no local e tentáculos na prefeitura, em

Read More...

Leave a reply:

Your email address will not be published.

Mobile Sliding Menu