Delator da Lava-Jato diz que dono da Brasif enviou à Suíça R$ 4 milhões para José Serra; conheça a teia de relações políticas e agropecuárias desse “rei do gado”
Por Alceu Luís Castilho
Quem é Jonas Barcellos, citado por Mirian Dutra – mãe do filho caçula de Fernando Henrique Cardoso – como o responsável por envio de mesadas à jornalista, enquanto ela morou em Paris? Dono da Brasif e da Dufry, pecuarista, ele tem um perfil quase tão rico quanto o de Jovelino Mineiro, bem mais amigo de FHC. Aqui segue um resumo, entre atividades empresariais, menções em investigações, amizade com políticos e a condição de quem já foi até chamado de “rei do gado”.
A família de Jovelino Mineiro é a dona do apartamento em Paris hoje frequentado por Tomás Dutra, o filho da jornalista assumido por FHC em 2009. A Jonas Barcellos cabia a incumbência de enviar uma mesada de US$ 3 mil, conforme relatos de Mirian Dutra e documento apresentado pela jornalista. As remessas ocorriam por meio da empresa Eurotrade Ltd, da Brasif, das Ilhas Cayman para Paris. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso nega ter usado a empresa para as mesadas.
A empresa – no momento inativa – também leva o nome de Eurotrade Cayman Islands Company. Ela fica no Safe Haven Corporate Center, em George Town. O contrato foi para “serviços de acompanhamento e análise do mercado de vendas a varejo para viajantes”, que Mirian diz nunca ter realizado.
CONEXÃO COM OS PICCIANI E PEDRO NOVIS
Jonas Barcellos Corrêa Filho é figura carimbada em leilões do gado, onde ele e os filhos costumavam aparecer ao lado de Pedro Novis, ex-presidente da Odebrecht, o delator da Lava-Jato que acusa o senador José Serra (PSDB-SP) de ter recebido propina, e de Jorge Picciani, o deputado do MDB fluminense preso por corrupção e que dominou, por décadas, a Assembleia Legislativa do Rio.
Jonas, Jovelino Mineiro e Novis são influentes na Associação dos Criadores de Nelore do Brasil, onde Jonas e Jovelino fazem parte do Conselho Deliberativo (e onde os filhos dos três pecuaristas são sócios). A organização já foi presidida por um dos filhos de Jorge, Felipe Picciani, até hoje – mesmo preso – um dos membros do Conselho Consultivo da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ). Felipe é acusado de corrupção e de lavar dinheiro com gado.
Jonas Barcellos tem bem mais empresas que Jovelino Mineiro, este mais focado na agropecuária. Com a Brasif à frente, o capital social de todas elas beira R$ 1 bilhão. Um dos destaques a Usina da Mata, em Valparaíso (SP). O governo do tucano José Serra pavimentou uma estrada vicinal para a sede da empresa. Confira aqui mais informações sobre os empreendimentos agropecuários de Jonas Barcellos: “FHC, o Fazendeiro – Jonas Barcellos tem império agropecuário e conexão com grandes empresas“.
JOSÉ SERRA E O DINHEIRO NA SUÍÇA
Em depoimento à Polícia Federal, Pedro Novis declarou em junho do ano passado que Serra recebeu da Odebrecht R$ 52,4 milhões – para ele ou para o partido – entre 2002 e 2012. Desse total, R$ 15 milhões para a campanha do político à Presidência da República, em 2002. Outro delator da Odebrecht, Luiz Eduardo Soares, aponta uma retirada de R$ 4 milhões da casa do operador tucano Paulo Preto para Serra, propina relativa a obras do Rodo Anel Sul. A remessa para a Suíça teria sido feita por Jonas Barcellos.
Outros três empresários foram mencionados pelos delatores como donos de contas utilizadas para Serra receber dinheiro da Odebrecht. Um deles se chama José Amaro Pinto Ramos, um antigo amigo de Sérgio Mota e de Fernando Henrique Cardoso. Quem delatou Amaro também foi Pedro Novis. Um laudo da Polícia Federal divulgado em abril aponta transações financeiras entre José Amaro e uma prima de Serra, Vicencia Talan.
José Amaro é uma figura recorrente em investigações sobre envio de dinheiro ao exterior. Um dos casos mais conhecidos é o da “conta Marília”, na Suíça, que teria abastecido diversas outras contas destinadas a financiar políticos no Brasil, em particular nos governos do PSDB em São Paulo, em prol das empresas Siemes e Alstom. Observemos este título do Intercept Brasil: “Serra e Alckmin são os maiores beneficiários da Odebrecht em 22 anos de hegemonia tucana em São Paulo”.
SÓCIO DE JONAS FOI DIRETOR DA ODEBRECHT TRANSPORTES
Jonas Barcellos tem ampla desenvoltura no exterior. O dono da Brasif é sócio da Dufry Latin American Holdings, empresa com sede nas Ilhas Cayman aberta em julho de 2017. Um dos sócios de Jonas Barcellos na Dufry do Brasil e na Dufry South America, Gustavo Magalhães Fagundes, é o procurador da Dufry Latin American no Brasil. Ele foi diretor da bilionária Odebrecht Transport S/A. A sede do grupo Dufry fica na Suíça.
Em fevereiro do ano passado ele comprou uma cobertura no luxuoso resort The Setai Miami Beach (na Collins Avenue, no município da Flórida, de frente para a praia) por US$ 8,5 milhões, das mãos do empresário Andrew Rosen, fundador da grife de roupas Theory. A compra foi feita pela empresa Capri 101 PH LLC, criada por Jonas alguns dias antes, em janeiro de 2017, em Miami.
A Odebrecht Transport tem como acionista principal a Odebrecht S/A (59,39%), seguida do Fundo de Investimentos do FGTS (30%), administrado pela Caixa Econômica Federal, com recursos dos trabalhadores, e do Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com 10,61%. A BNDESPar financia empresa onde Emílio Odebretch e Jovelino Mineiro são sócios: “FHC, o Fazendeiro – Empresa de Emílio Odebrecht e Jovelino Mineiro, Recepta Biopharma tem BNDESpar e Finep como sócias”.
Como outras empresas da Odebrecht, a Odebrecht Transport também está envolvida na Lava-Jato. Seu ex-presidente Paulo Cesena relatou em 2016, em delação premiada, que o atual ministro das Minas e Energia, Moreira Franco (MDB) recebeu em 2014 um repasse de R$ 4 milhões.
DO MDB AO PSDB, UMA LEGIÃO DE AMIGOS
Jonas Barcellos e Moreira Franco estiveram na festa da posse da presidente Dilma Rousseff, em janeiro de 2011. O ministro estava assumindo a Secretaria de Assuntos Estratégicos. Em abril de 2016, nos estertores do governo Dilma Rousseff, o MDB indicou para a diretoria de obtenção de terras do Instituto Nacional de Colonização Agrária o que o Estadão chamou de “advogado de ruralistas”. Era Luiz Antônio Possas de Carvalho, que defendera Barcellos em processos no Mato Grosso.
José Serra e Jonas Barcellos são amigos. Em 2012, candidato à prefeitura paulistana, o político foi visto no Rio saindo da loja de roupas íntimas de Paula Barcellos, a mulher do empresário, no prédio da Brasif no Leblon. A Loungerie S/A é uma sociedade entre Paula e Jonas Barcellos, Gustavo Magalhães Fagundes (novamente ele) e até o Banco de Nova York Mellon Serviços Financeiros.
O BNY Mellon foi sócio de Jonas Barcellos também na Usina da Mata, em Valparaíso (SP), pelo menos até 2014. O governo paulista de Serra asfaltou, em 2009, uma vicinal para a usina. Confira aqui: “FHC, o Fazendeiro – Em Teodoro Sampaio (SP), Jovelino Mineiro arrenda fazenda para Odebrecht”.
LEIA A SÉRIE COMPLETA:
“FHC, o Fazendeiro – tudo sobre as terras da família, os amigos pecuaristas e a Odebrecht”.