Usina de ruralistas influentes, RS multiplica negacionismo político

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De Olho nos Ruralistas inicia, por UF, retrospectiva de seus cinco anos; símbolos da truculência no Congresso, deputado Alceu Moreira e senador Luis Carlos Heinze fazem parte direta dessa história, ao lado das terras de Eliseu Padilha em parque no Mato Grosso

Por Alceu Luís Castilho

O senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) tornou-se uma figura mais conhecida nacionalmente por sua atuação peculiar na CPI da Covid, em defesa incondicional do governo Bolsonaro e da farsa do “tratamento precoce”. Quem acompanha o De Olho nos Ruralistas conhece bem, desde o início do observatório, esse estilo negacionista. Em novembro de 2016, três meses após a estreia do portal, ele nos dava entrevista sobre mudanças climáticas. E dizia com todas as letras: “Eu não acredito”.

Foi uma das duas entrevistas feitas na mansão da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), em Brasília, antes da expulsão da reportagem pelo chefe dos lobistas, um executivo do Instituto Pensar Agro (IPA). A atuação da bancada ruralista é um dos temas principais do De Olho, que acaba de completar cinco anos e inicia com o Rio Grande do Sul uma retrospectiva de suas principais reportagens: “De Olho nos Ruralistas faz cinco anos e multiplica projetos“. Heinze já foi presidente da FPA e é uma de suas faces mais salientes.

Autor da célebre frase sobre “tudo que não presta”, na visão dele “índios, gays, lésbicas, quilombolas, tudo que não presta”, dita em 2014, o senador motivou em 2018 uma charge do ilustrador Baptistão, onde ele aparece ao lado do deputado Alceu Moreira (MDB-RS). Um parlamentar ainda mais ríspido. Foi Moreira o outro entrevistado no dia da expulsão, na mansão dos lobistas. Foi ele quem recomendou a fazendeiros, também em 2014, a seguinte linha de conduta para ocupantes de terras, como os indígenas: “Fardem-se de guerreiros e lutem do jeito que for necessário”.

Confira aqui a entrevista onde Heinze manifesta seu negacionismo climático:

OSMAR TERRA E ONYX LORENZONI TAMBÉM GANHARAM PERFIS NO OBSERVATÓRIO

Durante as eleições de 2018, Heinze e Moreira já ilustravam reportagem sobre os principais candidatos ruralistas no Rio Grande do Sul: “Influentes e virulentos, ruralistas gaúchos tentam manter poder no Congresso e no Executivo“. O texto mencionava um repasse de verbas da saúde para uma associação de caminhoneiros — o que ilustra a conexão direta entre a trajetória dos ruralistas e o cenário bolsonarista.

Outro texto publicado logo após as eleições falava da articulação de políticos anti-indígenas para liderar o Congresso e integrar o governo Bolsonaro. E os gaúchos apareciam em peso: não somente com Heinze e Moreira, que presidiu com extrema parcialidade a CPI da Funai, mas com Onyx Lorenzoni, hoje no Ministério do Trabalho, na época anunciado na Casa Civil.

Lorenzoni foi um dos perfilados na série De Olho no Genocídio, sobre a potencialização política das mortes por Covid-19, publicada em 2020 e depois transformada em série de vídeos. O título da série ilustra bem a atuação do político no Congresso e na Esplanada dos Ministérios: “Esplanada da Morte (VI) — Onyx Lorenzoni tem trajetória anti-indígena e pró-frigoríficos“.

O ministro é um aliado de outro negacionista de peso, um dos chefes da ofensiva do governo Bolsonaro contra a saúde pública: o ex-comunista Osmar Terra, do MDB. Você sabia que, dias após o golpe de 2016, ele recebeu, como ministro do Desenvolvimento Agrário do governo Temer, o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária? Era um agrado à bancada ruralista, que tinha sido determinante para derrubar Dilma e foi decisiva para manter Michel Temer no poder. Começava ali uma sequência de implosões do direito à terra, consolidadas no governo Bolsonaro.

Confira o vídeo sobre Terra, publicado em 2021, durante a série audiovisual sobre o genocídio:

QUEM BANCA A ATUAÇÃO DOS POLÍTICOS SÃO OS EMPRESÁRIOS

Uma das características do De Olho nos Ruralistas é mostrar não somente a face dos políticos, mas também quem os financia. Presidente da FPA no início do governo Bolsonaro, o deputado Alceu Moreira, por exemplo, teve apoio direto de sojeiros em sua eleição, como mostrou a repórter Priscilla Arroyo em 2019: “Empresários da soja subsidiaram campanha do líder da bancada ruralista“.

Moreira recebe Comenda da Soja. (Foto: Facebook)

O empresário gaúcho Winston Ling, mais um bolsonarista e negacionista, apareceu em março deste ano em reportagem de Mariana Franco Ramos: “Avalista de Bia Kicis na CCJ financiou Salles e foi multado por danificar florestas“.

E o que dizer de Marcelo Brum, autor do projeto de lei que ameaça o Código Florestal, suplente de Onyx Lorenzoni, que roda o país numa certa “carreta do agro“, e que também teve sua campanha bancada por sojeiros?

Este observatório constatou que, nas eleições de 2014, quatro gaúchos figuravam entre os 21 políticos mais beneficiados por verbas da JBS, que doou R$ 31 milhões para 99 deputados ruralistas.

E a ex-senadora Ana Amélia (PP-RS), que foi descrita em um livro sobre a indústria tabagista no Brasil, como uma articuladora importante do setor? A publicação foi escrita por João Peres e Moriti Neto, diretores de O Joio e o Trigo, um dos parceiros do De Olho nos Ruralistas em reportagens sobre o campo e a alimentação no Brasil.

ELISEU PADILHA INSTALOU-SE EM PARQUE ESTADUAL E VENDEU PARA JBS

A relação entre políticos e empresários acontece de várias formas, como mostra esta notícia de 2020: “Greenpeace mostra como Eliseu Padilha forneceu carne de áreas desmatadas para JBS, Marfrig e Minerva“. Mas essa história começou muito antes. Em 2017, quando Padilha era ministro do governo Temer (observem como os gaúchos têm chegado ao comando da Casa Civil), o repórter Cauê Seignemartin Ameni fez uma série de reportagens sobre as terras do gaúcho em pleno Parque Estadual da Serra de Ricardo Franco, no Mato Grosso. Confira algumas delas:

—> Documentos mostram que Eliseu Padilha vendeu gado ilegal à JBS
—> No Mato Grosso, 18 armas, trabalho escravo e desmatamento: MP x Eliseu Padilha
—> Padilha comprou fazenda de empreiteiro investigado em 2007, como ele, pela PF
—> Parque no MT já existia quando Padilha comprou fazendas no local
—> Policiais armados com metralhadora intimidam jornalistas em fazenda de Padilha

Fazendas ficam dentro do Parque Estadual Serra Ricardo Franco (Foto: Reprodução/TVCA)
Fazendas de Padilha ficam dentro do Parque Estadual Serra Ricardo Franco. (Foto: Reprodução/TVCA)

A propriedade de terras na Amazônia por políticos da região Sul é algo recorrente. E será descrita com mais detalhes nos textos desta retrospectiva sobre Santa Catarina e Paraná. No ano passado, mostramos que os três candidatos em Apuí, no Amazonas, eram um de cada estado da região: “Multados por desmatamento disputam prefeitura em Apuí (AM), fronteira da devastação na Transamazônica“.

ESTADO É UM DOS PRODUTORES NACIONAIS DE AGROTÓXICOS

Um dos temas mais populares entre os leitores, ao longo destes cinco anos, o uso de agrotóxicos acabou tendo o Rio Grande do Sul como uma das usinas de notícias. E por motivos bem diferentes.

Em abril de 2019, contestamos uma informação incorreta transmitida pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, relativa a um desastre ecológico no estado: “Ministra erra ao dizer que agrotóxico responsável por morte de abelhas no RS não tem registro no Brasil“.

A utilização de venenos está longe de ser um consenso entre os gaúchos: “Uso do agrotóxico 2,4-D, banido na Austrália e no Canadá, divide opiniões no Rio Grande do Sul“. Em Santa Maria, moradores chegaram a ganhar indenização pelo uso ilegal em uma fazenda de soja.

Por outro lado, há quem ganhe dinheiro com isso. Uma das fábricas da multinacional Adama fica no Rio Grande do Sul. E tem um grupo gaúcho que pediu ao Ministério da Agricultura a liberação de venenos “extremamente tóxicos”, a partir de importação da China. Nome do agrotóxico? Topatudo.

EM CINCO ANOS, OBSERVATÓRIO EXPÕE OS DONOS DO BRASIL

Além da retrospectiva, a comemoração dos cinco anos do De Olho nos Ruralistas terá várias peças de divulgação, visando a obtenção de 500 assinaturas, por um lado, e levar as informações a um público mais amplo, por outro. É urgente a necessidade de o país conhecer melhor o poder dos ruralistas e de formar no Congresso uma bancada socioambiental, um conjunto de parlamentares que defendam direitos elementares, previstos na Constituição e nos pactos civilizatórios internacionais dos quais o Brasil é signatário.

Assista ao vídeo do aniversário:

Ainda este mês será inaugurada a versão audiovisual da editoria De Olho na Resistência, que divulga informações sobre as iniciativas dos povos do campo e as alternativas propostas para o ambiente e a alimentação saudável. Também em setembro estreia uma campanha de internacionalização do observatório.

Você pode apoiar todos esses projetos aqui.

Alceu Luís Castilho é diretor de redação do De Olho nos Ruralistas. |

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De Olho nos Ruralistas faz cinco anos e multiplica projetos

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