Ruralistas tentam manobra para aprovar fim do licenciamento ambiental

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Com “demora” na tramitação do PL 2.159/2021 no Senado, membros da bancada decidem priorizar PLS 168/2018, relatado pelo senador Zequinha Marinho (PL), pré-candidato ao governo paraense; parlamentar é conhecido por defender madeireiros e garimpeiros ilegais

Por Mariana Franco Ramos

A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), braço institucional da bancada ruralista no Congresso, se articula para aprovar, o mais rápido possível, o fim do licenciamento ambiental. Como o Projeto de Lei 2.159/2021, que já passou pela Câmara, “travou” no Senado, nas mãos da relatora, Kátia Abreu (PP-TO), membros da frente buscam o que acreditam ser uma alternativa mais célere.

Marinho é pré-candidato ao governo do Pará pelo PL de Bolsonaro. (Foto: Facebook)

Em reunião com diversos parlamentares na última quarta-feira (11), Zequinha Marinho (PL-PA) sugeriu priorizar o PLS 168/2018, de mesmo teor, mas que é relatado por ele na Casa. Os dois textos restringem, enfraquecem ou, em alguns casos, até extinguem parte importante dos instrumentos de avaliação, prevenção e controle de impactos socioambientais de obras e atividades econômicas no país.

A avaliação é de que Kátia, concorrente à reeleição, estaria segurando a matéria, diante da pressão de movimentos, organizações sociais e artistas, que publicamente vêm se manifestando contra o chamado “pacote da destruição” ou “combo da morte” (que inclui ainda os PLs do Veneno e da Grilagem).

Recentemente, a senadora confidenciou a interlocutores que contaria com o apoio do ex-presidente Lula no pleito de outubro. A notícia foi publicada pelo colunista Guilherme Amado, do Metrópoles. Com Professora Dorinha (União Brasil-TO), Vanderlei Luxemburgo (PSB-TO) e Marcelo Miranda (MDB-TO) também no páreo, a disputa pela única cadeira do Tocantins no Senado promete ser acirrada.

SENADOR SE REFERE A FISCAIS DO IBAMA COMO “BANDIDOS E MALANDROS”

Bolsonarista convicto e negacionista climático, Marinho é pré-candidato ao governo do Pará pelo partido do presidente e, assim como a senadora, um expoente da FPA. Mas, ao contrário do que ocorre com ela, encampar o fim do licenciamento ambiental — apelidado por ambientalistas de “mãe de todas as boiadas” — não atrapalharia em nada sua campanha. Pelo contrário.

A defesa de madeireiros e garimpeiros ilegais faz parte da plataforma eleitoral do político, que busca desbancar o atual governador, Helder Barbalho (MDB-PA), primeiro colocado nas pesquisas. Ele se tornou famoso pelos arroubos retóricos contra operações de órgãos ambientais, afirmando que as fiscalizações “estrangulam” o setor. De Olho nos Ruralistas já falou sobre o parlamentar em reportagem sobre o lobby da madeira.

Em janeiro de 2020, por exemplo, o senador publicou um vídeo em que classificava servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) de “bandidos e malandros” após uma ação que identificou o corte ilegal de madeira em 1.000 hectares da Terra Indígena Ituna-Itatá, a mais desmatada do país.

Um ano antes, durante evento realizado no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Marinho comentou que a ação do Ibama no oeste do Pará era “pior do que o Estado Islâmico na Síria”. “A gente não queria continuar sendo tratado como inimigo deste país”, afirmou. “É fundamental pacificar a questão ambiental. Produtor precisa ter mais liberdade pra produzir”.

Senador Zequinha Marinho durante reunião com a bancada ruralista. (Foto: Agência FPA)

PACHECO PROMETEU CAUTELA NA ANÁLISE DO “COMBO DA MORTE”

Depois do Ato pela Terra, mobilização convocada pelo cantor Caetano Veloso em março, na capital federal, para tentar frear a tramitação das propostas que atacam o ambiente e os povos do campo, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), prometeu cautela nas votações. “Nenhum desses projetos será diretamente pautado no plenário”, disse à Agência Senado, na época.

Kátia Abreu, relatora do PL 2.159, e Rodrigo Pacheco. (Foto: Waldemir Barreto/Senado)

A percepção é de que questões controversas poderiam gerar aumento de litígios, vulnerabilidade e desconfiança internacional. O Observatório do Clima (OC), formado por nove organizações, enviou uma carta a Pacheco afirmando que o fim do licenciamento ambiental representaria um retrocesso de quatro décadas. “Teremos uma lei da não-licença no lugar da Lei Geral do Licenciamento Ambiental”, escreveu o OC.

Ficou então acordado que o PL 3.729/2004, aprovado na Câmara em maio de 2021, na forma de um substitutivo de Neri Geller (PP-MT), e que tramita no Senado como PL 2.159/2021, passaria, obrigatoriamente, pela Comissão do Meio Ambiente (CMA) e pela de Agricultura e Reforma Agrária (CRA). O presidente da Casa reforçou que haveria audiências públicas e debates amplos.

O que acontece agora é que integrantes da FPA consideram ser possível aprovar o PLS 168/2018 na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, com pedido de urgência, levá-lo direto ao plenário. Movimentos sociais avaliam que, assim como o PL 2.159, ele fragiliza e elimina a necessidade de medidas importantes para a segurança e a saúde da população e para a proteção das riquezas naturais do país.

Durante reunião-almoço da FPA, Zequinha Marinho falou que faria uma reunião de “alinhamento” com Pacheco. “O compromisso dele com o agro brasileiro é notório e deixou isso de forma clara”, afirmou. “O que precisamos é cobrar, especialmente em relação ao licenciamento ambiental, pois modernizar e desburocratizar será essencial e é um desejo de todos.”

Ato convocado por Caetano Veloso ajudou a pressionar senadores. (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)

AUTOR DA PROPOSTA COLECIONA TERRAS EM RONDÔNIA E NO AMAZONAS

O autor do PLS 168 é Alcir Gurgacz (PDT/RO), presidente da CRA, integrante da FPA e também interessado direto na aprovação do texto. O político, que já cumpriu pena por crimes contra o sistema financeiro, é o segundo senador com maior extensão de terras, conforme dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) compilados pelo observatório no Mapa das Terras dos Parlamentares.

O pedetista declarou 31,6 mil hectares, em Rondônia e no município de Envira, no Amazonas, na fronteira com o Acre, uma região com muitas reservas e florestas estaduais e federais. Ele é dono de uma empresa do setor pecuário, o Frigoari – Frigorífico de Ariquemes. Sua família tem, ainda, negócios no Paraná, onde o senador nasceu.

| Mariana Franco Ramos é jornalista. |

Foto principal (Facebook): Zequinha Marinho (PL-PA) usa redes sociais para defender Bolsonaro e garimpo ilegal

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