Comitiva de Lula à China inclui desmatadores e lobistas do agronegócio

In Bancada Ruralista, De Olho na Política, De Olho no Agronegócio, Desmatamento, Em destaque, Empresas brasileiras, Principal, Últimas

Imprensa nacional destaca os donos da JBS, mas não a participação de empresas envolvidas com desmatamento, como Marfrig e Paper Excellence; Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec) atacou “oportunistas do ambientalismo radical” após Dia do Fogo

Por Hugo Souza e Bruno Stankevicius Bassi

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva inicia, neste domingo, a primeira missão diplomática de seu governo, com destino à China. Com a proximidade do embarque, veículos como Folha, Estadão e O Globo vêm destacando a participação, entre os 102 empresários que integram a comitiva presidencial, de nomes como os dos irmãos Joesley e Wesley Batista, do frigorífico JBS, e de doadores de campanha do ex-presidente Jair Bolsonaro. Mas e a comitiva do agronegócio? A viagem a Pequim teve seu objetivo descrito pelo ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Carlos Fávaro, como o de “abrir portas, criar oportunidades de crescimento e aumentar o mercado”. Qual é a história desses empresários?

Marcos Molina, CEO da Marfrig, viu empresa perder aportes após descumprir metas ambientais. (Foto: Divulgação)

Mais da metade do séquito é formada por pecuaristas. Só do setor de carne bovina são 42 empresários e representantes de organizações de classe. Entre os donos do boi que integram a comitiva está, por exemplo, Alisson Navarro, diretor comercial da Marfrig, segunda maior produtora de carne do mundo, atrás apenas da JBS dos irmãos Batista.

Ele embarca para a China com Lula menos de um mês após a empresa ser o pivô de uma denúncia contra o banco francês BNP Paribas, em um tribunal de Paris, por contribuir com crimes ambientais e violações de direitos humanos ao financiar a Marfrig. Um dos denunciantes foi a Comissão Pastoral da Terra (CPT). Em nota, o BNP Paribas disse que o grupo deixará de fornecer produtos ou serviços financeiros a empresas que não estejam alinhadas com sua política de “rastreabilidade total das cadeias de fornecimento (diretas e indiretas) de carne bovina e soja na Amazônia e no Cerrado brasileiro”.

Um ano antes, em fevereiro de 2022, a Marfrig perdeu um aporte de US$ 200 milhões do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), após as partes não chegarem a um acordo sobre as metas de prevenção ao desmatamento na cadeia de fornecimento do frigorífico brasileiro.

Outro nome ignorado pela imprensa brasileira é o de Antônio Jorge Camardelli, presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec). Em 2019, durante o auge da crise diplomática causada pelo Dia do Fogo e pelas queimadas na Amazônia, a Abiec publicou em seu site um artigo atacando o que chamou de “oportunistas do ambientalismo radical”, por associarem os incêndios criminosos à pecuária. Meses depois, um relatório do Greenpeace comprovou que entre os líderes do Dia do Fogo estavam fornecedores diretos da JBS e Marfrig. O artigo é assinado por Maurício Palma Nogueira, dono da consultoria Athenagro e “Embaixador do Agro” do Estadão.

Ex-diretor de estratégia empresarial da JBS, Camardelli também compõe a diretoria do Instituto Pensar Agro (IPA), o braço logístico por trás da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), face institucional da bancada ruralista no Congresso. O papel da Abiec e dos frigoríficos no IPA foi um dos temas do relatório “Os operadores da boiada“, publicado por este observatório. Camardelli foi afastado da JBS após o escândalo de caixa 2 envolvendo o ex-deputado e ministro bolsonarista Onyx Lorenzoni (PL-RS).

EMPRESÁRIOS DO ALGODÃO, CELULOSE E SOJA COMPLETAM COMITIVA

Embarcam com Lula para a China cinco membros da cúpula da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), uma das principais defensoras da aprovação do PL 1459/2022, o chamado “PL do Veneno“, ora em tramitação no Senado. Se aprovado, o projeto irá flexibilizar o processo de aprovação de agrotóxicos no Brasil, beneficiando diretamente os grandes produtores de algodão.

De acordo com uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) em parceria com a Operação Amazônia Nativa (Opan), dos 28 tipos de agrotóxicos utilizados na cadeia produtiva do algodão, 17 são proibidos na União Europeia. Além disso, a commodity é uma das principais consumidoras de venenos agrícolas do país, com um índice de 28 litros por hectare, o dobro do que é usado no cultivo da soja.

Em disputa pela Eldorado Celulose, Paper Excellence e irmãos Batista se encontrarão em comitiva de Lula à China. (Foto: Divulgação)

No setor de papel e celulose, a canadense Paper Excellence emplacou na comitiva de Lula três executivos. Fundada em 2006, a companhia decidiu apostar no Brasil a partir de 2017, quando comprou a Eldorado Celulose da J&F Investimentos, holding responsável por gerir os negócios dos irmãos Batista. A disputa pelo controle da empresa, no entanto, arrasta-se até hoje na Justiça, após uma divergência entre a antiga controladora e o grupo dos Estados Unidos.

A Paper Excellence lançou em janeiro sua nova campanha de mídia no Brasil, sob o mote “excelência é nosso nome, confiança faz parte da nossa essência”. O investimento foi uma reação a um relatório publicado dois meses antes, em novembro, pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês), mostrando a participação de subsidiárias do grupo em incêndios florestais e conflitos com comunidades tradicionais na Indonésia. Segundo o ICIJ, a Paper Excellence usou empresas de fachada para ocultar sua relação com o caso.

Fazem parte ainda da comitiva de Lula e Carlos Fávaro organizações de classe de arrozeiros e de reciclagem animal. E Kleverson Scheffer, filho do “rei da soja” Eraí Maggi Scheffer, dono do Grupo Bom Futuro e primo bilionário do ex-ministro Blairo Maggi, padrinho político de Fávaro no Mato Grosso e fiador de sua indicação ao Ministério da Agricultura. O conglomerado da família Scheffer — líder da produção de soja no Brasil — coleciona embargos ambientais, infrações trabalhistas, multas do Ibama e uso de trabalho análogo à escravidão.

| Hugo Souza é jornalista e editor do portal Come Ananás. |

|| Bruno Stankevicius Bassi é editor e coordenador de projetos do De Olho nos Ruralistas. ||

Foto principal (Facebook): comitiva presidencial organizada por Carlos Fávaro inclui desmatadores e lobistas do agronegócio

LEIA MAIS:
JBS tem centralidade no lobby ruralista em Brasília
Principais financiadores da bancada ruralista faturam mais de R$ 1,47 trilhão
Câmara e Senado usam encontro sobre idioma em Portugal para promover agronegócio
Mato Grosso é potência do agronegócio, da política ruralista e dos clãs ocultos
Após pressão da bancada ruralista, Pacheco destrava pautas do “combo da morte” no Senado

You may also read!

Conheça o terreno em Parelheiros onde Nunes tentou construir condomínio empresarial

Imobiliária do prefeito, a Topsul Empreendimentos, iniciou processo em imóvel na Estrada Ecoturística de Parelheiros; mata e casa cotada

Read More...

Imobiliária de Ricardo Nunes mostra conexão empresarial com parceiros da zona sul

Dono da Topsul Empreendimentos, prefeito e amigos maçons montaram empresa em nome de parentes; todos tinham conexão com Associação

Read More...

Green Village: o condomínio em Interlagos onde Ricardo Nunes e amigos fazem seu “banco imobiliário”

Maçons e empresários do ramo de imóveis, grupo do prefeito tem apartamentos no local e tentáculos na prefeitura, em

Read More...

Leave a reply:

Your email address will not be published.

Mobile Sliding Menu